Relator vota para aposentar magistrado por quase causar perda bilionária ao BB
Hoje desembargador, Geraldo de Almeida Santiago é investigado a pedido do Banco do Brasil
Investigado no CNJ (Conselho Nacional de Justiça) a pedido do Banco do Brasil, o desembargador de Mato Grosso do Sul, Geraldo de Almeida Santiago, corre o risco de ter de deixar a magistratura cinco anos antes do limite de idade para atuar.
Em sessão ordinária nesta terça-feira (5), o subprocurador-geral da República, José Adonis Callou de Araújo Sá, defendeu que o magistrado seja aposentado compulsoriamente e o relator do processo administrativo disciplinar que apura a conduta de Santiago desde 2019, conselheiro Giovanni Olsson, adiantou que vota pela aplicação da pena máxima para a carreira.
A reclamação disciplinar remonta ao ano de 2014, quando Santiago era juiz da 5ª Vara Cível de Campo Grande e, conforme o Banco do Brasil, praticou “inúmeras arbitrariedades” que estavam prestes a causar prejuízo bilionário à estatal.
O procurador também fez breve resumo dando suas interpretações aos fatos descritos na denúncia do banco contra o magistrado. “Fiquei bastante impactado pela descrição e entendo que há aqui uma incompatibilidade absoluta com o exercício da função”, adiantou.
Araújo Sá explicou que o Banco do Brasil havia ajuizado ação de execução contra empresa sul-mato-grossense do ramo hoteleiro, que paralelamente, foi à Justiça contra a instituição pedir uma revisão do contrato de financiamento. “O juiz [Santiago] julgou procedente a ação revisional e o que era uma execução do Banco do Brasil de pouco mais de R$ 900 mil, se transformou numa dívida do mesmo banco de mais de R$ 300 bilhões a partir da sentença proferida pelo juiz, hoje desembargador que é o requerido neste PAD”.
Ainda na narração do procurador, o banco recorreu da condenação, perdeu na Justiça sul-mato-grossense e foi ao STJ (Superior Tribunal de Justiça). Mas, nesse meio tempo, os sócios da rede de hotéis começaram a fazer cessões dos créditos, ou seja, passaram a “vender”, “fazer compras” ou permutas com o dinheiro que ainda tinham para receber do Banco do Brasil. Os detentores dos créditos também foram à Justiça cobrar a instituição bancária.
“O banco, eu contei aqui, teve de obter duas medidas cautelares no STJ e liminares em 4 reclamações para que pudesse sustar as decisões do magistrado requerido, que passou a determinar seguidas vezes ao Banco do Brasil a transferência de valores elevadíssimos a outra instituição financeira em favor dos exequentes cessionários destes créditos decorrentes da sentença”, descreveu Araújo Sá na tarde de hoje.
Mais suspeitas – O responsável pela acusação levanta suspeita sobre outra atitude do então juiz. Enquanto determinava que o banco transferisse valores em favor dos credores, quando consultado por outros magistrados a respeito dos créditos, respondia negativamente. “Interessante também assinalar que em consultas feitas por outros magistrados sobre a existência de créditos nesta ação, o juiz respondeu que ‘não havia sido instaurada a fase de liquidação e cumprimento de sentença, o que impossibilitava quaisquer afirmativas acerca da existência de créditos’. Ou seja, ao mesmo tempo em que determinava penhora de quantias de milhares ou bilhões de reais, respondeu a outros magistrados que não havia créditos”.
O procurador também fez questão de lembrar que o advogado da rede de hotéis, que por decisões do magistrado, chegou a receber R$ 9 milhões em honorários na ação proposta para rever o contrato com o banco, já chegou a atuar como representante de Santiago em ação judicial.
Voto do relator – O relator do PAD explicou que o magistrado é acusado de “reiteradamente descumpriu ordens do STJ, desafiando autoridade superior” e para ele, restou comprovada a falta disciplinar por parte do agora desembargador.
Olsson também afirmou que o prejuízo ao banco estatal só não chegou à cifra de R$ 326 bilhões, valor calculado por quem cobrava a instituição, porque o STJ impediu.
Para o relator, a conduta do magistrado investigado foi “no mínimo altamente desidiosa [negligente], porque com essas cessões ao longo dos anos e as execuções iniciadas, nós identificamos potenciais crimes contra a economia popular, porque inúmeros terceiros de boa-fé adquiriram créditos de procedência duvidosa e acabaram sendo prejudicados”.
A votação não continuou porque outro conselheiro pediu vistas para analisar melhor os autos.
Outro lado – A AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros) saiu em defesa do desembargador, pedindo o arquivamento da reclamação. A advogada Ana Luiza Vogado de Oliveira lembrou que o juiz chegou a consultar o STJ sobre como proceder com as ações de execução dos créditos que estavam chegando em suas mãos.
“O que a gente tem aqui é somente eventual recalcitrância [recusa a cumprir determinação] do magistrado. Como a gente pode falar que o magistrado que fez uma consulta do STJ sobre o que ele poderia fazer está com intenção de desobedecer? De descumprir uma decisão de autoridade superior? Não temos justificativa para uma apenação”.
Ela argumentou ainda que a pena de aposentadoria compulsória é desproporcional. “Apenar um magistrado como esse tem repercussões para a uma carreira inteira. Qual é efetivamente a intenção de um PAD. É punir? Se vingar? Ou ter atitude pedagógica para corrigir aquela comportamento pontual? Extirpar esse magistrado dos quadros do Judiciário é na verdade uma perda para o próprio Judiciário”.
O advogado contratado pelo juiz, André Borges, também fez sustentação oral, alegando que a primeira suspeita levantada contra o magistrado já não é verdadeira. “Se abre o processo suspeitando de alguma conduta inapropriada e coloca na cena do possível ilícito disciplinar o advogado, que nunca foi advogado de Geraldo neste processo. Está fora deste PAD, portanto, qualquer suspeita em relação a uma conduta imoral do Dr. Geraldo Santiago”.
Borges também defende que o juiz não foi desobediente, mas apenas tocou o trabalho enquanto o STJ não mandou paralisar. “Processo não tem capa e ele simplesmente deu sequência às execuções provisórias”.
Por fim, pediu a absolvição “para um magistrado ficha limpa, de 70 anos de idade e quase 40 anos de magistratura, que é frequentador assíduos nem da Corregedoria, nem do CNJ”.
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