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Capivara Criminal

Delegado preso pelo furto de cocaína pega 21 anos por estupro

Éder Oliveira Moraes mostrava pornografia a adolescentes e abusou deles na delegacia de Rio Verde

Marta Ferreira (*) | 27/09/2020 14:23

Se os processos na Justiça de Mato Grosso do Sul ainda fossem físicos, o delegado de Polícia Civil Eder Oliveira de Moraes, de 51 anos, teria nicho só para ele. Não como responsável por apurações, como se espera de quem é contratado para investigar bandidos, mas como acusado de crimes que deveria combater. Desde 2015, acumula uma dezena de ações nas quais é a parte fora da lei, incluindo participação de furto de cocaína  da delegacia de Aquidauana.

Eder Oliveira Moraes chega para depor no Fórum de Campo Grande. (Foto: Arquivo Campo Grande News)
Eder Oliveira Moraes chega para depor no Fórum de Campo Grande. (Foto: Arquivo Campo Grande News)

O rol de acusações inclui corrupção, peculato, tráfico de drogas, organização criminosa, posse ilegal de arma e até estupro de adolescentes em plena delegacia.

Por esse último crime citado, segundo a investigação jornalística da coluna "Capivara Criminal", a sentença demorou, mas veio pesada.

A condenação impõe pena de 21 anos e 8 meses de reclusão e perda da função pública. Saiu quase seis anos depois de dois adolescentes relatarem ao MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul)
abusos sexuais dentro da delegacia de Rio Verde de Mato Grosso, da qual Eder era titular à época.

Fixo a pena privativa de liberdade definitiva do réu em 21 anos, 8 meses e oito dias de reclusão”, escreve o juiz.

“Decreto a perda do cargo público ocupado pelo réu”, acrescenta o magistrado.

Esse tipo de processo corre em sigilo máximo, por envolver menores de 18 anos.  Um deles tinha 14 à época dos fatos, em 2015.

O conteúdo grave da acusação, levantado pela "Capivara Criminal", explica a sentença  por crimes previstos no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).  Conforme a denúncia, o delegado usava o computador da unidade policial para mostrar material pornográfico aos adolescentes. Além disso ter sido contado pelos meninos, foi encontrado esse tipo de arquivo na perícia.

De acordo com o relato das vítimas, Eder Oliveira de Moraes cometeu atos libidinosos com eles. Isso inclui de sexo oral a convites para encontros fora da delegacia.

Em um dos casos, o rapaz estava com a avó, que foi orientada a deixá-los sozinhos com o policial na sala, fechada.

Razões distintas 

Um episódio ocorreu em setembro e outro em novembro de 2015. Cada adolescente estava na delegacia por motivos diferentes. Um porque a mãe foi presa e ele foi levado como vítima. O outro por ter sido apreendido após ato infracional.

A sentença condenatória do juiz Rafael Gustavo Mateucci Cassia, de 21 de julho deste ano, está ainda na fase de apelação. Tanto o promotor do caso quanto a defesa do delegado questionam a pena definida.

Matheus Carim Bucker, o promotor responsável pela acusação, quer mudança na forma de cálculo para o concurso de crimes, nomenclatura legal dada à prática de mais de um ilícito pelo agente processado. Em resumo, pede o aumento da pena.

A defesa, obviamente ao contrário disso, opina pela absolvição.

“Essa decisão de convicção de autoria é absolutamente absurda. Os dois menores, supostas vítimas, foram induzidos pelo MPMS [Ministério Público de Mato Grosso do Sul”, alega o advogado Irajá Pereira Messias, representante legal do delegado.

Éder nega, por exemplo, ter ficado sozinho com os dois adolescentes.

Quem é Eder Oliveira de Moraes ?

Para clarear a memória do leitor, o delegado sentenciado por estupro de vulnerável é o mesmo que ficou bastante conhecido em junho de 2019, quando foi preso por colegas da Corregedoria da Polícia Civil como participante do furto de cem quilos de cocaína estocadas na delegacia de Aquidauana, a 135 quilômetros de Campo Grande. Mais 11 pessoas foram presas. A ação criminal está em andamento.

Ele foi alvo de outra operação, a “Balcão de Negócios”, também contra esquema de proteção de agentes de segurança a quadrilhas do crime organizado voltado ao tráfico de entorpecentes.

Nascido no interior de São Paulo, servidor público da segurança de Mato Grosso do Sul há duas décadas, Éder Oliveira de Moraes está afastado da Polícia Civil. Responde a dois processos na Corregedoria da instituição. O salário, por ora, está mantido, na casa dos R$ 29 mil brutos, em torno de R$ 22 mil líquidos.

O delegado há duas décadas está afastado e preso por outro crime: tráfico de cocaína, que sumiu de delegacia de Aquidauana. (Foto: Arquivo/Campo Grande News)
O delegado há duas décadas está afastado e preso por outro crime: tráfico de cocaína, que sumiu de delegacia de Aquidauana. (Foto: Arquivo/Campo Grande News)


Saiu, mas voltou - No fim de maio, o personagem de hoje da coluna “Capivara Criminal” chegou a conseguir prisão domiciliar, com uso de tornozeleira, tendo a pandemia de covid-19 como justificativa, em decisão do magistrado de Aquidauana Ronaldo Onofri.

O MPMS recorreu e a liberdade durou pouco. Eder voltou para a carceragem da 3ª Delegacia de Polícia Civil, no Bairro Carandá, em Campo Grande, onde permanece cumprindo a prisão preventiva pelo furto da cocaína.

Em relação à condenação por estupro, só vai começar a cumprir pena efetivamente quando não houver mais recursos possíveis, seguindo entendimento do STF (Supremo Tribunal Federal).

*Marta Ferreira, que assina a coluna “ Capivara Criminal”, é jornalista formada pela UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), chefe de reportagem no Campo Grande News. Esse espaço semanal vai divulgar informações sobre investigações criminais e seu andamento na Justiça. 

Entenda o nome:  Esta seção se chama assim em alusão à expressão "puxar a capivara", que usa o nome do animal  visto frequentemente em Mato Grosso do Sul para designar o acesso à ficha corrida de alguém envolvido com o crime.

Participe: Se você tem alguma sugestão de história a ser contada, mande para o e-mail marta.ferreira@news.com.br. Você também pode entrar em contato pelo WhatsApp, no número  67 99669-9563. Clique aqui para mandar sua mensagem.

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