Andar de ônibus no calor extremo: "mais cansativo que o próprio trabalho"
A reportagem acompanhou o trajeto da linha 313 para ouvir os passageiros que sofrem com lotação e calor
Semblante cansado e passos apressados para pegar conduções lotadas são retratos da vida cotidiana de milhares de trabalhadores campo-grandenses que acordam antes de o sol nascer e vão para o ponto de ônibus esperar pelo transporte público. A jornada de trabalho formal passa a contar ao bater o ponto, mas para quem depende do transporte público, a rotina começa bem antes, por volta das 5h da madrugada.
Em Campo Grande, circulam 473 veículos, com idade média de 5 anos. Destes, apenas 14 possuem ar-condicionado e 17 são climatizados. A reportagem acompanhou na manhã desta quinta-feira (5) o trajeto da linha 313, que passa pelos bairros Coophavilla, São Jorge da Lagoa, Tijuca, Batistão e vários outros até o destino final, o Terminal Bandeirantes. Ao desembarcarem, os passageiros seguem viagem para as setes regiões da Capital, em novas conduções, igualmente lotadas e abafadas.
O trajeto é desconfortável, exaustivo e sufocante. Imagine passar mais de uma hora em pé, espremido por outras pessoas, em um veículo com pouca circulação de ar. Essa é a realidade da recepcionista Hellen de Almeida da Silva, 56 anos, que pega a linha 313 às 5h55 - quando não atrasa - na Rua Fátima do Sul, todos os dias para ir trabalhar. Ela percorre uma hora (14 quilômetros) até a empresa, localizada na região da Avenida Mato Grosso.
Para o trabalhador, sair de casa para chegar até a empresa está cada vez mais difícil. Nossa trajetória diária de ida e volta fica mais cansativa do que o nosso próprio trabalho. Ao entrar no ônibus, ficamos desanimados e cansados. O ônibus é cheio e o calor, forte", retrata Hellen de Almeida da Silva.
Hellen percorre o trajeto inteiro na parte da escada, apesar do aviso na porta indicando que é perigoso permanecer no local. A recepcionista explica que é uma questão de estratégia para conseguir descer no terminal sem ser empurrada. "Conforme demora o ônibus, mais cheio fica, e a maioria está atrasada para o trabalho, aí quando chega no terminal é aquele alvoroço, porque ainda tem outro ônibus para pegar. Todo mundo quer descer, então eu fico perto da escada para sair primeiro e evitar cair ou ser empurrada".
A recepcionista relata que quando o ônibus atrasa, juntam as pessoas que já deveriam ter embarcado e as pessoas que deveriam embarcar no próximo, então a condução lota ainda mais. "Uma vez eu cheguei bem atrasada no trabalho e me chamaram atenção. Eu falei 'olha, o ônibus não passou, quando passou estava muito cheio e eu não consegui entrar, aí eu tive que esperar outro'. Quando está muito cheio mesmo eles nem param no ponto, porque não tem como entrar mais gente".
Antes de embarcar, a reportagem se deparou com um grupo de pessoas esperando o ônibus chegar. Quando questionados, a resposta foi unânime: "está um caos". A diarista Roseli Araújo Lobato, 44 anos, tomou a frente do grupo e declarou que falta ônibus da linha e que nunca viu circular nem um ônibus da frota nova anunciada pela Prefeitura de Campo Grande em julho deste ano.
Os ônibus estão um caos. Ônibus superlotado, ou vem adiantado demais, ou atrasado demais. Pegar ônibus é um horror, principalmente de manhã até sete e pouco da manhã. É um empurra-empurra, ficamos que nem sardinha", retrata Roseli Araújo Lobato.
Roseli acorda 4h40 para conseguir embarcar no ônibus da linha 313 que parte para o Terminal Bandeirantes por volta das 5h20 da manhã. Ela percorre 12 quilômetros até o trabalho, na região da Avenida Bom Pastor, no Bairro Vilas Boas.
A monitora escolar Maria Inês Aparecida, 54 anos, precisa percorrer 12 quilômetros até o local de trabalho. Ela pega a linha 313 até o Terminal Bandeirantes e de lá pega outro ônibus até o Centro. Maria Inês enfatiza que o trajeto é desagradável, pois a condução é lotada e abafada.
A monitora escolar aponta que quando o ônibus passa atrasado no ponto do bairro, atrasa o resto do trajeto. "A gente tem que chegar lá no terminal e pegar um outro ônibus, e às vezes a gente perdendo ou pegando atrasado aqui, quando chega no terminal já perde o que está lá".
Quando a gente tá voltando do trabalho, já volta cansada, e aquele ônibus lotado, às vezes não acha um lugar para sentar. Fora que é muito calor, o calor é imenso dentro do ônibus", retrata Maria Inês Aparecida.
A reportagem do Campo Grande News procurou a Prefeitura de Campo Grande e o Consórcio Guaicurus para levar as reclamações feitas pelos usuários do transporte público ouvidos pela reportagem. A prefeitura informou que os 71 novos ônibus recebidos este ano estão em circulação e as linhas são determinadas de acordo com a demanda e a necessidade dos passageiros. O Consórcio Guaicurus reforçou que no sistema constam 14 ônibus com ar-condicionado em circulação na Capital. Lembrando que o total da frota é de 437 veículos.
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