Após 56 anos juntos, João e Francisca deram adeus à família, levados pela covid
João faleceu em 8 de agosto e a esposa, Francisca partiu dois dias depois
No dia 13 de junho deste ano, João Ribeiro Novaes, 77 anos e Francisca Araújo Novaes, 74 anos, comemoraram 56 anos de casados. Menos de dois meses depois, praticamente juntos, se despediram de seus familiares, levados pela covid-19. Ele, em 8 de agosto e ela, em 10 do mesmo mês, em Campo Grande.
Amados e animados, a alegria do casal era juntar a família aos domingos com muita dança e churrasco. “A vida deles era a família. Não tinha lazer que não fosse com a gente. Todo fim de semana a família se reunia. O prazer deles eram os churrascos no fim de semana”, conta a neta Greice Kelly Novaes Alves Meza, 37 anos.
Mãe de gêmeos, Greice acompanhou os últimos momentos de ambos e lembra que havia muito medo de que algum deles contraísse a doença, principalmente a avó, que além de obesa, tinhas outras comorbidades, como a diabetes e teve embolia pulmonar em 2016.
Quando João foi internado, em 22 de julho, Francisca se assustou e temeu tanto pela vida do marido quanto por sua própria. Na ocasião, segundo a neta, chegou a lamentar que “meu velhinho se cuidou tanto, e mesmo assim pegou” a covid-19. João também reclamou, dizendo que “agora, quatro meses dessa pandemia que eu peguei essa desgrama?”.
Os sintomas começaram em João, e primeiro, os médicos acreditavam se tratar de uma dengue, porque o nível de plaquetas estava baixo. Mas mesmo com repouso e muita água, o quadro foi se agravando, até culminar na internação, depois de ser constatado que seu pulmão estava 75% tomado pela infecção.
Francisca começou a passar mal uma semana depois dos primeiros sintomas do marido e foi internada em 4 de agosto, duas semanas depois de João. Depois de apresentar sinais da doença, passou a ser monitorada de longe, já que até a data em que foi internada, seu pulmão não apresentava nem 25% de infecção. “Ela ficou em casa, em isolamento”, disse Greice.
No entanto, a doença avançou e depois de internada, no sábado, 8, Francisca foi entubada. Mesmo dia em que o esposo morreu. “Meu vô morreu de manhã e no fim da tarde ela foi entubada”. Dois dias depois, Francisca morreu.
Segundo a neta, não houve nem tempo de viver o luto do avô e já veio a notícia da morte da avó. “Tive que amparar minha tia e minha mãe que têm pressão alta, meu esposo também, que os considerava como avós, meus primos. Consolei todos e confesso que ontem (terça-feira) foi bem difícil, me deu aquele baque. Não consegui fazer nada”, contou.
A suspeita da família é que o casal tenha se infectado durante consulta de Francisca no IMPCG (Instituto Municipal de Previdência de Campo Grande) ou no supermercado, onde apenas João ia. “Eles quase não saiam de casa e quando íamos lá, mantínhamos o distanciamento social”, disse a neta.
Mesmo diante dessas incógnitas, a doença foi implacável com ambos, que até o fim, queriam cuidar um do outro. “Quando levei meu vô pra ser internado, ele ficou preocupado em deixar minha avó sozinha e eu prometi cuidar dela”, recorda. Da parte de Francisca, havia o mesmo cuidado, e Greice lembra que ela temia muito pela vida do marido.
Legado – Conhecida e querida na região do Coronel Antonino, Francisca trabalhou por 34 anos como enfermeira no posto de saúde do bairro. As homenagens nas redes sociais foram muitas e de acordo com Greice, só mostram como os avós eram amorosos.
“Amor, é o legado que eles deixam. Fiquei revoltada, porque em momentos como esse nem todos da família ajudam, mas aí lembrei que não foi isso que meu avô me ensinou. Ele ensinou o amor, a união da família, ensinou a acolher as pessoas”, destaca, lembrando que “a vovó era mais turrona, mas não menos amorosa”. O casal deixa duas filhas, três netos e seis bisnetos.