Em comunidade, privada é só um buraco sem descarga, que depende de balde d'água
Ainda hoje, tem gente que recorre às sacolas de supermercado para defecar e depois jogar longe
Ter uma casa com banheiro sem vaso, descarga, chuveiro e fossa séptica pode parecer uma realidade distante para muitos em 2024, algo básico. Mas não para moradores de comunidades consideradas favelas, como a Esperança, em Campo Grande. Nos barracos de madeira, o sanitário é colocado sobre um buraco no chão e baldes de água são a descarga. A estrutura da pia de lavar louças e do chuveiro, feitos na base da gambiarra, têm canos, que despejam a água usada no quintal.
RESUMO
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A situação dos moradores da Comunidade Esperança, em Campo Grande, revela desafios significativos em relação ao saneamento básico. Muitos residem em barracos de madeira, onde a falta de infraestrutura adequada força o uso de soluções improvisadas, como banheiros com fossas rudimentares ou até a utilização de sacolas plásticas para as necessidades. Apesar de algumas melhorias, como a instalação de vasos sanitários, muitos ainda enfrentam dificuldades, como a escassez de água e a necessidade de utilizar baldes para descarga. A mudança para um banheiro adequado é considerada uma transformação significativa na qualidade de vida, mas a falta de um sistema de esgoto eficiente continua a ser um problema crítico na comunidade.
Conforme o censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgado em 2022, a comunidade do Bairro Jardim Noroeste tinham 115 fossa séptica ou fossa de filtro não ligada à rede regular, enquanto 11 casas possuíam fossa rudimentar ou buraco.
Onde Keyla Leya, de 24 anos, mora com seu marido e filhos, de 6 e 2 anos, o banheiro ganhou um vaso há pouco mais de três meses. Recentemente o casal fez uma nova fossa no local, dessa utilizando pneus, pois a antiga desbarrancou. “Antes fazíamos o cocô em sacolas e depois jogávamos no mato. Ficamos três meses assim, depois o meu marido conseguiu o vaso na rua”, conta.
A dona de casa relata que após o Natal pretende arrumar o barraco onde mora, mas por enquanto a prioridade é aprimorar as paredes de madeira. “[iremos arrumar] tudo lá dentro, porque já está caindo tudo lá dentro”.
Suely Reis, de 67 anos, também relata que quando chegou na comunidade precisava defecar em sacola plástica. Morando no local desde 2004, a aposentada conta que muita coisa mudou em seu barraco. Hoje, o local possui vaso, fossa e chão com contrapiso e azulejos.
Em contrapartida, a idosa conta que muitos vizinhos ainda utilizam sacolas. “Tem gente que nem buraco tem, que pega o saquinho e joga lá para o outro lado. Tem horas que é um fedor que ninguém aguenta. O meu, por eu ser aposentada, fiz um banheirinho que não é aquelas coisas, mas serve ”, diz.
Outra moradora da comunidade, Jéssica Martins, de 26 anos, descreve a falta de banheiro adequado como “uma situação difícil”. Uma das melhorias que a jovem realizou foi a instalação de contrapiso. “Como a gente mora aqui, a gente não tem muitas condições de ir melhorando. Não é fácil não, a gente mora aqui mesmo porque precisa”
Jéssica conta que quando chegou no barraco onde mora já havia uma fossa, mas que precisou cavar outra. Com o passar do tempo conseguiu instalar um vaso sanitário no banheiro. “Antes não tinha vaso, não sei como quem morava aqui antes fazia… defecava no mato, não sei. Eu coloquei o vaso, mas não mudou muita coisa”.
Apesar de ter o vaso instalado, o sanitário não possui descarga. Para que os dejetos sejam lançados na fossa é preciso utilizar um balde d’água. “Tem dias que não tem água, porque a água é bem pouco, e tem que armazenar para cozinhar, lavar louça, jogar no vaso para tudo. Até o banho é no balde por aqui”.
Quem viveu por muito tempo com banheiro improvisado afirma que a mudança é como "outra vida". Luciene Alexandre da Silva, 58 anos, viveu durante oito anos no improviso e diz que vivia com medo de encontrar escorpiões e lacraias.
"Minha casa era de tábua e lona quando eu vim pra ca. anos depois vieram entregar os papéis pra gente [...] Hoje eu tenho o meu banheiro, tomo banho morninho posso ir a hora que eu quiser é outra vida", conta.
O engenheiro sanitário ambiental, Alexandre Braga de Souza explica que conforme a norma NBR 7229 da ABNT, a construção de tanques sépticos, conhecidos como fossa, é permitida quando não há rede de esgoto instalada.
“O que consta no sistema? Ele tem o tanque séptico que é um sistema como se fosse uma caixa de concreto,onde o esgoto naturalmente cai ali e ele não infiltra no solo. Vai ocorrer um tratamento biológico, que vai criar uma camada de sólidos e uma camada de água contaminada por microrganismos”, explica.
Conforme Alexandre, os microrganismos presentes na água criam bactérias que são responsáveis por consumir a matéria orgânica dos resíduos depositados na fossa. “Passando por esse processo, ele sai do tanque séptico e vai para o sumidouro que não é impermeabilizado, apenas um buraco no chão mesmo. O objetivo do sumidouro é infiltrar líquido”.
O engenheiro ambiental ainda explica que a construção do tanque e sumidouro deve observar algumas questões, como a profundidade do lençol freático para que não ocorra nenhum tipo de contaminação. “O problema dessas fossas rusticas é a contaminação do solo e do lençol freático, porque é feito um buraco, não tem nenhum tipo de análise do solo ou da profundidade do lençol freático”, detalha.
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