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Capital

Irmã “enfrenta tudo” para provar inocência de preso por furto à casa de Reinaldo

Família alega que Antônio Matheus de Souza Silva, de 23 anos, tem álibis; polícia ainda o trata como suspeito

Por Anahi Zurutuza | 25/06/2024 13:24
Momento que trio foi abordado pela Polícia Civil de São Paulo, na região central da capital paulista (Foto: Inquérito/Reprodução)
Momento que trio foi abordado pela Polícia Civil de São Paulo, na região central da capital paulista (Foto: Inquérito/Reprodução)

Desde o dia 10 de junho, a vida da família de migrantes nordestinos em São Paulo (SP) está em modo de espera. A mãe, cozinheira em restaurante na capital paulista, só chora e a microempresária Kelly de Souza, de 30 anos, travou verdadeira investigação paralela para provar que o irmão Antônio Matheus de Souza Silva, de 23 anos, não tem envolvimento algum com o furto ao apartamento do ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB), em Campo Grande (MS), e só “estava no lugar errado, na hora errada” para acabar preso.

O rapaz foi pego junto com outros dois suspeitos, Davi Morais Saldana, de 24 anos, e Italo Alexandre Franca Silvestre, 22, menos de 48 horas após o crime na Capital sul-mato-grossense. Estava de carona, segundo a irmã, em carro usado pelos amigos de infância, não se sabe para onde. “Não sabemos. Não conseguimos falar com ele direito até agora”.

A família foi avisada por um parente de outro alvo da ação da Polícia Civil de São Paulo em apoio a Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubos a Bancos, Assaltos e Sequestros) de Mato Grosso do Sul. Depois disso, levou uma semana para descobrir que Matheus havia sido trazido para Campo Grande por ser investigado por crime cometido aqui.

Nesse meio tempo, contratou advogado, desfez contrato e procurou outro profissional para defender Matheus. A microempresária também vasculhou horas de imagens das câmeras de segurança do prédio onde mora com a família para mostrar que o irmão nunca tirou o pé da cidade. E conseguiu. “Eu tenho provas de que meu irmão não estava nisso”.

Davi Morais Saldana (no celular) e Ítalo Alexandre Silvestre (com a mala) deixando o condomínio onde mora o ex-governador, no dia 8 de junho (Foto: Inquérito policial/Reprodução)
Davi Morais Saldana (no celular) e Ítalo Alexandre Silvestre (com a mala) deixando o condomínio onde mora o ex-governador, no dia 8 de junho (Foto: Inquérito policial/Reprodução)

No dia 8 de junho, quando aconteceu o furto, conforme a investigação, mais ou menos no mesmo horário que dupla deixada o prédio de Reinaldo Azambuja, no Jardim dos Estados, por volta das 13h (no horário local), Matheus passava pela portaria do próprio condomínio, no Bairro Santa Efigênia, no centro da cidade de São Paulo.

Ainda conforme as imagens juntadas pela irmã, ele volta para casa às 19h50 (no horário de São Paulo). Ou seja, passa pouco mais de 5 horas fora de casa.

É matematicamente impossível”, afirma Kelly de Souza, completando que os vídeos provam que nem se tivesse feito viagem de avião, o irmão pode ter vindo à Capital, participado do furto e voltado para casa.

Na madrugada do dia 9, Matheus sai novamente do prédio. Ele estava acompanhado de garota com que foi para balada em São Paulo e só volta para casa no outro dia pela manhã. “A investigação não conseguiu colocar o rosto do meu irmão em momento algum e eu consigo colocar ele em várias imagens”. Veja:

Kelly ainda mostra foto do irmão no banheiro da festa e quer que, se necessário, por ordem judicial, a organização forneça as imagens do rapaz no local durante a madrugada daquele domingo – quando em tese, os ladrões percorriam os 1 mil km de distância na rota MS/SP. Ela aponta o copo que está na mão dele como evidência. “Já estive nessa balada”.

A irmã narra que Matheus passou a manhã do dia 9 dormindo. “A minha mãe saiu para ir para o culto. Ela vai ao culto da Igreja Internacional da Graça de Deus, lá pertinho de casa, todo domingo. Saiu às 8h e ele estava dormindo em casa”.

A microempresária esclarece ainda que mora no mesmo edifício, onde também vivem o irmão com os pais e a avó. O local não tem garagem e uma única entrada.

A família não é rica, mas financeiramente estável e Matheus, afirma Kelly, apesar de estar desempregado, “sempre teve de tudo”. “A gente é uma família bem unida. Ele tem de tudo mesmo. Não precisa tirar nada de ninguém. Todo a minha família trabalha, entendeu? Eu tenho uma sociedade numa clínica de estética, minha mãe é cozinheira no mesmo restaurante há 10 anos...”, elenca.

A prisão, segundo a irmã, aconteceu a poucos metros do local onde moram. Já no presídio em Campo Grande (MS), pela primeira vez, Antônio Matheus pôde fazer uma ligação para a família. Telefonou chorando para a mãe. “Ele diz que não tem nada a ver, que ele não sabia nem que tinha esse flagrante [objetos produtos do furto] no carro, para pelo amor de Deus para a gente ajudar”.

Kelly destaca ainda outro ponto a favor do irmão. Em interrogatório, Davi e Ítalo confessam o furto e negam a participação de uma terceira pessoa. O terceiro suspeito manteve o silêncio.

Kelly de Souza, 30 anos, em entrevista ao Campo Grande News (Foto: Henrique Kawaminami)
Kelly de Souza, 30 anos, em entrevista ao Campo Grande News (Foto: Henrique Kawaminami)

“Rua do Ouro” – A investigação também conseguiu imagens dos criminosos em local conhecido como “Rua do Ouro” em São Paulo. No dia 10 de junho, dois dias após o furto, Davi e Ítalo foram até casa de joias na Rua Barão de Paranapiacaba, na Sé, para vender o que levaram da casa de Reinaldo Azambuja.

Por volta das 14h, pouco antes da prisão, eles entram prédio, vão até joalheiro e saem com sacola verde na mão “provavelmente o dinheiro da venda da joias”, registra o inquérito.

Conforme relatório da Garras, ao qual o Campo Grande News teve acesso, o saco verde – com parte dos objetos furtados no apartamento do ex-governador, além de R$ 67 mil em espécie – foi encontrado no carro usado pela dupla, um Citroen Cáctus branco, o mesmo alugado por Ítalo para vir à Capital. Aliás, foi pelo rastreio do veículo que a polícia chegou aos ladrões.

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Davi e Ítalo, em dois momentos, na "Rua do Ouro" em São Paulo, pouco antes da prisão (Foto: Inquérito/Reprodução)
Davi e Ítalo, em dois momentos, na "Rua do Ouro" em São Paulo, pouco antes da prisão (Foto: Inquérito/Reprodução)

Saga – Advogado da família, Paulo Tarso Campos de Oliveira, soube no dia 17 da transferência “relâmpago” do trio para Campo Grande. No dia 19, Kelly já estava na Capital, após 15 horas de estrada, e batia no portão da Garras à procura do irmão. Não foi recebida.

Quando voltou à delegacia, na quinta-feira passada, dia 20, ele já havia sido transferido para o Petran (Presídio de Trânsito), no Complexo Penal do Jardim Noroeste, em Campo Grande.

Ela foi até lá, mas não pôde ver o irmão, que está em cela do período correncional – observação para novos presos –, segundo a Agepen (Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário). Conseguiu que advogado, correspondente indicado pela defesa em SP, entrasse no presídio para entregar artigos de higiene e conversar brevemente com o irmão. “Os três estão na mesma cela e no presídio, os outros dois disseram que vão reafirmar em juízo, se preciso, que meu irmão não está envolvido”, destaca a irmã.

Medo – Desde a prisão, o advogado contratado pela família já ingressou com dois pedidos de liberdade em favor do cliente e os dois habeas corpus foram negados. O temor da família é que algo pior aconteça dentro de presídio.

Mateus nunca esteve num presídio. Ele não sabe não sabe se manter lá. A gente sabe ele não pertence a nenhuma facção, ele não é nada disso e a gente sabe que os presídios hoje como funciona, entendeu?”, afirma Kelly.

Nesta terça-feira (25), a irmã conseguiu visita assistida, diante da particularidade da situação. A mãe do rapaz se emocionou ao saber que poderia transmitir mensagem para o filho. “Nós vamos conseguir, sim, com a ajuda de Deus, tirar meu filho daí”, afirmou a cozinheira em áudio enviado para a filha. Ouça:

HCs negados – Antônio Matheus é réu primário, afirma a defesa, além de ter residência fixa em São Paulo, condições favoráveis à soltura. A pressa da família é tirá-lo da prisão para que ele responda ao processo em liberdade. “Foram duas negativas. Eu tenho para mim que é devido a vítima ser figura com influência política”.

Kelly acredita que as evidências apresentadas pela defesa sequer foram analisadas. O desembargador Luiz Claudio Bonassini da Silva, do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul), que argumentou ao negar HC que “a presença das boas condições pessoais, por si só, não têm condão para induzir à revogação/substituição da prisão preventiva quando outros elementos dos autos demonstram a necessidade da segregação cautelar”.

O magistrado também destaca que “ao menos em análise perfunctória que permite o momento” há “indicativos veemente de que o paciente [Antônio Matheus] é contumaz na prática de delitos, inclusive com atuação em outros estados da federação que, em tese, demonstram a dedicação à atividade criminosa, circunstância atentatória à ordem pública, de modo que, de plano aparenta-se necessária à manutenção do acautelamento prisional do paciente”.

Dinheiro, relógio e joias apreendidos com ladrões (Foto: Inquérito policial/Reprodução)
Dinheiro, relógio e joias apreendidos com ladrões (Foto: Inquérito policial/Reprodução)

Suspeitas – Bonassini refere-se a supostas atuações do preso em outros furtos, mesmo argumento da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul. Ao Campo Grande News, o delegado Pedro Henrique Pillar Cunha, da Garras, afirmou que o rapaz “é investigado por outros furtos qualificados, em diversos outros inquéritos policiais no Estado de São Paulo”.

“As investigações indicaram a existência de associação criminosa, com sede em São Paulo (SP), voltada para a prática de furto qualificado de apartamentos de luxo em outros Estados da Federação. O acusado mencionado foi flagrado recebendo os valores da venda das joias furtadas no apartamento em Campo Grande, junto com os outros dois responsáveis, já identificados (inclusive confessos), pelo furto ora investigado. Sendo assim, o acusado é suspeito de pertencer a referida associação criminosa, caracterizada pela distribuição de tarefas e responsabilidades entre os integrantes, dentre elas, levantamento de dados das vítimas, subtração dos bens e sua posterior venda para receptadores”, completou o delegado.

Cunha diz que o conteúdo juntado pela defesa de Antônio Matheus como álibis, certamente, será analisado. “As imagens de câmera serão levadas em consideração, após verificar a sua real confiabilidade pelos exames periciais. Contudo, não isentam a participação do acusado na associação, seja no levantamento de dados, seja na venda dos bens subtraídos da vítima a receptadores”.

Outro lado - A família e a defesa negam o envolvimento do investigado em outros crimes. A irmã diz que a única vez que Matheus deixou São Paulo foi para visitar os avós no Ceará. Ou seja, nunca esteve em outros estados, por isso, não há como ser suspeito de furtar em outras localidade.

Ele não é investigado. Eles têm milhares de investigações não concluídas e de alguma forma colocar a culpa nele. Estão querendo condenar um inocente”, diz Kelly Souza.

O advogado Paulo Tarso também dá parecer “sobre as supostas investigações”. “Foi a maneira que encontraram pra sustentar o pedido de prisão preventiva”. “Como é necessário demonstrar os indícios de autoria, costumeiramente, as policiais civis (de todo o país) acabam criando um cenário para inserir aquele ou aquela que se busca a prisão e ao criar esse cenário, eles acabam dizendo coisas de modo subjetivo/genérico para convencimento”.

A defesa vai recorrer do habeas corpus negado e provar, na ação penal, a inocência de Matheus, completa o defensor contratado. “Por saberem que na fase de inquérito não há contraditório, eles fazem como preferem e depois deixam para que o MP se utilize do que julgar necessário para conduzir eventual denúncia. Aí cabe a defesa, durante a instrução processual, contradizer o que eventualmente o MP utilizar na acusação”.

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