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Capital

Laranja milionário, riqueza demais e pulverização de bens geram suspeitas

Para investigadores da força-tarefa, André Cance foi um dos integrantes da organização que mais enriqueceu e Mirched Jafar iniciou processo de dilapidação de patrimônio

Anahi Zurutuza | 12/05/2017 17:45
Viatura da PF em frente ao residencial Monet, onde foi cumprido um dos mandado de busca e apreensão (Foto: André Bittar)
Viatura da PF em frente ao residencial Monet, onde foi cumprido um dos mandado de busca e apreensão (Foto: André Bittar)

O aumento exagerado do patrimônio e também a redução na lista de bens, além do enriquecimento rápido de suposto “laranja”, colocaram alguns dos principais alvos da quarta fase da Operação Lama Asfáltica na mira dos investigadores. As movimentações bancárias de altos valores e compras com dinheiro em espécie também levantaram suspeita.

As apurações especificamente sobre o patrimônio dos investigados foram feitas por equipe da Receita Federal, que se debruçou sobre as declarações do IR (Imposto de Renda) e RIFs (Relatório de Inteligência Financeira) elaborados pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).

Para pedir a prisão de André Cance, ex-secretário-adjunto de Estado de Fazenda, o MPF (Ministério Público Federal) argumentou que ele é “possivelmente uma das pessoas que mais enriqueceu com as práticas criminosas contra o erário sob investigação”.

Em cinco anos, Ana Cristina Pereira da Silva, mulher de Cance, teve acréscimo patrimonial de 1.281%. A Receita Federal apurou que em 2010, ela tinha R$ 1.178.669,15 em bens e no fim de 2014, o patrimônio havia saltando para R$ 16.285.094,98 – 16 vezes.

Neste período, o aumento do patrimônio de Ana Cristina foi de mais de R$ 2 milhões por ano, o que foi considerado incompatível com os rendimentos dela.

O MPF explica que, embora Ana Cristina tenha se divorciado de Cance em 2012, os dois reataram o relacionamento logo depois e viviam juntos.

Desde a manhã desta quinta-feira (11), Cance está preso na carceragem da Polícia Federal em Campo Grande. Ele é apontado como o gerenciador do esquema de cobrança e pagamento de propina que têm como origem dinheiro público empregado em obras e outros contratos firmados entre 2011 e 2014, durante a gestão de André Puccinelli (PMDB).

Na manhã desta sexta-feira (12), o advogado dele, José Wanderley, disse apenas vai à Justiça Federal pedir a liberdade para o cliente e que não tem mais nada a adiantar em relação à defesa de Cance.

Sede da Gráfica e Editora Alvorada, na Capital (Foto: Arquivo)
Sede da Gráfica e Editora Alvorada, na Capital (Foto: Arquivo)

Alvorecer – Já uma das suspeitas levantada sobre Mirched Jafar Junior, dono da Gráfica e Editora Alvorada, também preso nesta quinta-feira, foi pelo motivo oposto ao de Cance. Os investigadores defendem que ele está dilapidando seu patrimônio, “para evitar o ressarcimento ao erário e manter uma vida de luxo, com possibilidade de prosseguir nas atividades criminosas”.

O MPF ressaltou que evidência da pulverização são as declarações de Imposto de Renda dele, que mostram a diminuição do patrimônio em R$ 7,7 milhões de um ano para outro. Ele declarou à Receita Federal ter R$ 19,5 milhões em bens em 2014 e no ano seguinte, passou a ter R$ 11,8 milhões – redução de 39%.

As movimentações bancárias da gráfica também colocaram Mirched em suspeição. A Procuradoria da República ressaltou, por exemplo, que entre janeiro de 2010 e dezembro de 2012, foram movimentados R$ 144,6 milhões em uma das contas da empresa, sendo que R$ 19,9 milhões foram sacados com 646 cheques.

Segundo a investigação, a gráfica era usada para “lavar” o dinheiro sujo proveniente dos desvios de recursos.

No dia 22 de dezembro de 2014, a PF (Polícia Federal) interceptou ligação entre André Cance e o então governador André Puccinelli. No diálogo, ele menciona que precisa falar com Cance para “que amanhã tenha uma boa alvorada, um bom alvorecer”.

Paulo Kalif, advogado de Mirched, não fez comentários sobre as suspeitas. Pela manhã ele disse apenas que o Ministério Público alegou que os pedidos de prisão eram necessários para a garantia da ordem pública e que para ele, este é um conceito muito vago. É justamente este argumento que será combatido no pedido de liberdade que o defensor fará em favor do cliente.

André Puccinelli saindo do Patronato Penitenciário após colocar a tornozeleira, na manhã desta quinta-feira (Foto: André Bittar)
André Puccinelli saindo do Patronato Penitenciário após colocar a tornozeleira, na manhã desta quinta-feira (Foto: André Bittar)

Laranja – O patrimônio de Puccinelli não mereceu destaque no pedido de prisão que o MPF fez contra ele. Mas, consta que a investigação descobriram vários indícios de que ele tem patrimônio em nome de laranjas e que um deles é o pecuarista e ex-coordenador de licitações da Semad (Secretaria Municipal de Administração), Mauro Cavalli.

O patrimônio e as movimentações bancárias feitas por Mauro, que foi conduzido coercitivamente nesta quinta-feira para prestar esclarecimentos à Polícia Federal, foram esmiuçados pelos investigadores.

Cavalli comprou vários imóveis, inclusive fazendas, entre 2012 e 2014. Neste período, o acréscimo patrimonial dele foi de R$ 4.336.774,39. Ele declarou à Receita ainda ter montantes de até R$ 5 milhões em espécie, mas para o MPF “seus totais não foram suficientes para suportar os pagamentos realizados em dinheiro para adquirir os diversos imóveis”.

A Receita chegou a intimá-lo a explicar com documentos o enriquecimento.

Durante busca e apreensão no ano passado, a PF encontrou na casa de Puccinelli uma nota promissória cujo devedor é Cavalli.

O ex-governador foi alvo de mandado de condução coercitiva e está sendo monitorado, por ordem da Justiça Federal, por uma tornozeleira eletrônica. A juíza Monique Marchioli Leite, da 3ª Vara Federal de Campo Grande, arbitrou ainda fiança de R$ 1 milhão para que Puccinelli como medida alternativa à prisão.

O advogado Renê Siufi negou na manhã desta sexta-feira que Puccinelli tenha bens em nome de terceiros. Ele alega ainda que o ex-governador sequer tem dinheiro para pagar a fiança fixada pela Justiça, porque seus bens estão bloqueados.

Policiais federais após a coleta de documentos (Foto: Marina Pacheco)
Policiais federais após a coleta de documentos (Foto: Marina Pacheco)

Operação – Antes das 6h desta quinta-feira, a Polícia Federal saiu às ruas de Campo Grande e mais cinco cidades para prender três pessoas, levar outras nove para depor e vasculhar 32 endereços em busca de provas contra organização criminosa investigada por desvio de dinheiro público.

No Estado, equipes comandadas pela força-tarefa cumpriram dois dos três mandados de prisão e um dos alvos, Jodascil da Silva Lopes, é considerado foragido, conforme a assessoria de imprensa da Polícia Federal.

A Lama Asfáltica, deflagrada em 2015 com base em investigações que começaram em 2013 e sobre o período de 2011 a 2014, apurou que a organização criminosa causou prejuízo de aproximadamente R$ 150 milhões aos cofres públicos, por meio de fraudes de licitações, desvio e lavagem de dinheiro.

Os investigadores – da PF, CGU (Controladoria-Geral da União) e da Receita Federal – estão em busca, justamente, do rastro do montante milionário que teriam sido desviados.

Nesta quinta, foi realizada a quarta etapa da operação, batizada de Máquinas de Lama, porque investigadores apuraram que parte dos pagamentos de propina era pagos por meio do aluguel de maquinário. Outras foram nomeadas Fazendas de Lama e Aviões da Lama.

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