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Capital

Quatro mil km de vias: Cidade nasceu planejada, mas cresceu mais do que deveria

“É absurdamente grande, são 4.300 quilômetros de ruas”, diz urbanista

Aline dos Santos | 03/03/2023 10:45
Quatro mil km de vias: Cidade nasceu planejada, mas cresceu mais do que deveria
Campo Grande vista do alto: cidade planejada, mas grande demais. (Foto: Fly Drones)

Campo Grande sofre efeitos colaterais de ter crescido além do necessário para abrigar seus 916 mil habitantes. “A cidade é absurdamente grande, são 4.300 quilômetros de ruas. É absurdo, maior que a área urbana de Porto Alegre. Tem que fazer mais construção, drenagem, rede de água”, afirma o arquiteto e urbanista Fayez José Rizk.

Outro comparativo é que Campo Grande tem área urbana de Fortaleza, mas a capital do Ceará tem o triplo da população: 2.703.391 pessoas.

“Você mora num terreno de 12 por 30. Chegam e avisam que agora o terreno da sua casa vai ser a quadra inteira. Mas você vai ter dinheiro para cuidar dessa quadra toda? Cresce demais e quem financia isso?”, questiona o especialista.

A cidade real, que cresceu sem controle, é muito diferente da Campo Grande que teve planejamento no começo de 1914, plano diretor e na década de 70 passou pela mente de Jaime Lerner, arquiteto criador do Taveirópolis e da passarela da Barão do Rio Branco. Lerner também foi governador do Paraná e prefeito de Curitiba.

De acordo com Fayez, a reestruturação urbana planejada por Lerner, em 1977, era lastreada em meio ambiente e mobilidade urbana, como os terminais de ônibus e ciclovia nas periferias.

No caso dos principais córregos – o Prosa e o Segredo –, a indicação era preservar os fundos de vale, com grandes parques urbanos. “Mas nunca saiu do papel e a cidade foi crescendo em direção ao vale”.

O Córrego Prosa nasce no parque estadual de mesmo nome, com acesso pela Avenida Mato Grosso, ao lado do Parque dos Poderes. Fruto do encontro do Joaquim Português e do Desbarrancado, o Prosa passa pelo lago do Parque das Nações, segue pela Praça das Águas, em frente ao Shopping Campo Grande, se espalha pela cachoeirinha perto da Ceará e segue cercado por urbanização até encontrar o Segredo no cruzamento da Fernando Corrêa da Costa com a Ernesto Geisel.

Sem os grandes parques, Lerner também foi certeiro sobre o futuro da cidade. “Tudo isso me faz lembrar uma frase do Jaime Lerner em uma reunião que participei em 1978, ainda como estudante de Arquitetura e Urbanismo: se vocês não cuidarem dos fundos de vale, vão ter que acabar construindo túneis para a condução de águas da chuva. Profético e certeiro”, afirma Fayez José Rizk, em artigo publicado após a chuva torrencial de 4 de janeiro. A publicação original data de 2010, mostrando a pouca evolução da cidade no quesito combate a enchentes.

Quatro mil km de vias: Cidade nasceu planejada, mas cresceu mais do que deveria
Pavimentação da Rua 14 de Julho em 1958. (Foto: Fayez Hanna Rizk/Reprodução)

Aliás, a situação não é só questão de obras, mas passa por condutas. Como não cortar uma árvore de grande porte simplesmente porque ela suja fachada do comércio.

Ao longo das décadas, a cidade foi trocando as frondosas mangueiras por árvores de menor porte. A arborização também “segura” a água da chuva. Tanto que, horas depois do tempo chuvoso, as folhas ainda gotejam, reduzindo o volume de água despejado no solo.

Outro vilão é o lixo jogado pelas ruas, que entope os bueiros. O risco de enchente se agrava com as mudanças climáticas. Cada vez mais, a cidade registra grande volume de chuva em curto espaço de tempo.

“O clima está mudando, está na cara. Qualquer pessoa percebe. Lembro de primeiro de abril de 1964, tinha 10 anos, e fez 5ºC, com a margem do córrego com gelo. Os soldados na 14 de Julho usavam capote por causa do frio. Isso marcou minha memória”.

Na madrugada de 31 de março para 1º de abril de 1964, o presidente João Goulart foi derrubado. No ano passado, na mesma data de 1º de abril, a mínima em Campo Grande foi de 17,5ºC. De 2018 a 2021, a temperatura mínima a cada 1º de abril variou de 19,7ºC a 22,4ºC.

Na última quarta-feira, a prefeitura de Campo Grande anunciou diferentes medidas para conter os impactos das chuvas, que nos últimos dias causaram inúmeros transtornos aos moradores. Entre elas, está convênio com a UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) para que pontos de alagamento sejam identificados e mapeados.

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