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Capital

Tios lutam para ficar com caçula de 3 sobrinhos que hoje vivem em abrigo

Já o ECA dá preferência por manter os três irmãos retirados dos pais que são dependentes químicos

Cassia Modena | 21/08/2023 15:18

Há quase cinco meses, os tios-avós de um menino de 2 anos acolhido em abrigo de Campo Grande esperam decisão da Justiça sobre adotação da criança. Ele e os irmãos foram retirados da guarda dos pais biológicos, ambos dependentes químicos, após o mais velho ser agredido a pauladas pela mãe.

"Dar o amor, a família e o lar que ele nunca teve. É isso que queremos", diz a tia. Ela e o marido moram em São Paulo.

No casamento anterior, teve três filhos que são maiores de idade e não vivem com ele. Já ela tem um adolescente de 13 anos também de outra relação, que mora com o casal.

Querem que o sobrinho-neto seja o membro mais novo da família em São Paulo. "É muito triste não podermos tirar do abrigo e fazer alguma coisa por ele. Compramos todas as coisinhas já. Está tudo pronto para recebê-lo", conta a tia

Cadeirinha para o carro, roupas e sapatos foram comprados e são mostrados no vídeo acima. Tudo está guardado e nunca foi usado pelo menino. Os tios-avós planejam até se mudar para uma casa maior, só para o sobrinho-neto ter mais espaço para brincar. "Ele é um príncipe. Merece uma vida melhor".

Ele é irmão do avô do menino. Trabalha na manutenção de residências e de um hospital, além de receber aluguéis de imóveis dos quais é proprietário. Ela é dona de casa e diz estar à disposição para cuidar bem da criança. "Conseguiremos dar tudo o que ele precisa aqui", ela garante.

Separar os irmãos - Os tios-avós procuraram as Defensorias Públicas de São Paulo e Mato Grosso do Sul para pedir formalmente a adoção do mais novo. No meio do processo, se depararam com uma dificuldade, que é a preferência pela não separação dos irmãos prevista na Lei da Adoção e no ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). "Conselheira e defensora nos disseram que é muito difícil o juiz permitir que sejam adotados separadamente", afirma a tia.

Ele e dois irmãos chegaram a fazer um acordo informal, para que cada um fique com uma das três crianças. As outras têm quatro e seis anos. Os outros familiares recuaram. Só o de São Paulo permaneceu com a intenção de ficar com o mais novo.

Nesse meio-tempo, a guarda das três crianças juntas foi delegada a uma tia de Campo Grande. Segundo a tia, ela desistiu por não ter condições de ficar com os meninos. "Isso nos deu uma 'canseira' ainda maior, porque ela e outros tios assinaram a desistência da guarda, os meninos foram retirados de lá e a Defensoria precisou 'refazer' todo o processo", relata.

Por mais que quisessem, os tios-avós de São Paulo alegam não ter condições de arcar e se responsabilizar pela criação de três crianças em vez de uma. Acabaram se apegando ao mais novo e querem adotá-lo. "Já que todos os outros tios desistiram, que seja então dada a oportunidade para outras pessoas que não têm filhos e desejem adotar", fala.

Ela revela, ainda, que a situação é mais triste do que aparenta. Os três sobrinhos têm outros irmãos de pais diferentes, que estão sob a guarda do avô materno.

Maus-tratos - Agredido com um pedaço de pau em abril deste ano, o de 6 anos foi internado na Santa Casa de Campo Grande. Seu estado era grave porque havia pregos na ponta, que perfuraram sua cabeça, rosto e orelhas.

Segundo a tia-avó, o menino teve alta e está bem, mas só fisicamente. "Está bem, mas na medida do possível, né?! Passa por psicóloga. Está traumatizado e voltou a fazer xixi na cama", conta.

O menino que se disponibilizam a adotar vai completar três anos no final de setembro. "Que não tirem esse momento da família. Queremos fazer uma festa bem linda de aniversário", pede a tia.

Revitimização - Presidente da Comissão de Direito da Família da OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Mato Grosso do Sul), Paula Guitti Leite, confirma que o ideal é os irmãos permanecerem juntos para o vínculo deles ser mantido e se evitar a revitimização das crianças, que já sofrem pelo "fracasso parental" por parte dos pais e por parte da tia que desistiu da guarda.

"As crianças já estão sofrendo a separação dos pais e a quebra da unidade familiar. Então, deveria se primar ao menos pelo vínculo como irmãos", afirma. Leite também explica ser do melhor interesse jurídico deles, princípio constitucional a partir da interpretação do ECA, ficarem unidos e serem entregues aos cuidados da família biológica ou de pessoas com quem já tenham afinidade e ligação afetiva, mesmo que não sejam parentes.

A advogada reconhece, entretanto, que a maioria das famílias brasileiras não têm condições financeiras de adotar e criar três crianças. Por isso, se não encontrados interessados aptos no Brasil, uma família estrangeira poderá fazer a adoção.

"Após haver destituição do poder familiar e haver trânsito em julgado, procura-se adoção pela família extensa, o que inclui pessoas próximas com quem tenham afinidade e afetividade. Não encontrando, é que se procura adotantes no cadastro nacional de adoção. E, não havendo também, opção é famílias estrangeiras cujo país de residência seja inscrito na Convenção de Haia", conclui a presidente da comissão da OAB/MS.

Pedido de adoção - O Campo Grande News questionou a assessoria de imprensa da Defensoria Pública de Mato Grosso do Sul sobre o andamento do pedido de adoção do menino de 2 anos, e se o caso abre exceção à regra de não separar os irmãos, mas não houve resposta até a publicação desta matéria. O espaço segue aberto.

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(*) Matéria editada às 17h33 para ajustar trecho que explica o processo de adoção. 

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