Caso que parou Sidrolândia em 2011, morte após aborto tem desfecho em júri
Cunhado e enfermeiro serão julgados por provocar aborto e ocultação de cádaver de Marielly Barbosa Rodrigues
Onze anos depois da morte de Marielly Barbosa Rodrigues, serão julgados a partir das 9h desta quinta-feira (15), o cunhado Hugleice da Silva, 38 anos, e o enfermeiro Jodimar Ximenes Gomes, 51 anos. Eles vão a júri popular por provocar aborto e ocultar o cadáver da jovem à época com 19 anos, em crime ocorrido em 2011, em Sidrolândia, e de grande repercussão no Estado.
Estão previstas 17 testemunhas, 3 de defesa e 14 de acusação. A primeira a ser ouvida é a investigadora Maria Campos, que acompanhou as buscas pela estudante. Uma das convocadas pela acusação é a irmã da vítima, Mayara Bianca, que era casada com o acusado do crime. A defesa sustenta que o caso já prescreveu, por isso pede a extinção do processo.
Por enquanto, no Fórum da cidade, onde vai ocorrer o julgamento, não há movimentação de familiares, nem curiosos. No município, com pouco mais de 60 mil habitantes, o júri não quebrou a rotina. A maioria dos moradores indagados se lembram do caso, afirmou que sim, mas não demonstrou curiosidade com o julgamento.
“É um caso bastante triste e lamentável. Principalmente para a família. No começo, a gente comentava muito, era muito buchicho na cidade. É um caso muito triste”, disse a professora Raquel Acosta Alves, de 49 anos. Ela relembrou que na época, os moradores ajudaram a procurar o corpo de Marielly em vários locais, inclusive, em roça e plantações de milho. Como mora em área rural, foi por causa disso que ficou sabendo sobre o crime.
A recepcionista Priscila Pedroso, de 32 anos, disse que conhecia o enfermeiro Jodimar e na época dos fatos, o fato gerou muito comentário. “Ele [Jodimar] era conhecido em Sidrolândia. Ficou todo mundo chocado, porque a gente nunca imaginava, um enfermeiro que trabalhava aqui, ajudar a fazer esse tipo de procedimento. Mesmo diante das circunstâncias, os moradores custaram a acreditar. Quando descobrimos a verdade, foi muito chocante”, lamentou.
O taxista José Maria dos Santos, de 73 anos, contou que na época do crime não morava na cidade, mas lembra de toda a repercussão. “Na época foi muito grande a repercussão, foi um crime muito grave, aqui todo mundo comentava. O que eu ouço muito é que a Justiça vai saber o que fazer". Outra moradora, que pediu para não se identificar, disse que Jodimar era muito conhecido na cidade. “Ele nasceu e cresceu em Sidrolândia, de uma família muito tradicional, uma pessoa muito boa”.
11 anos depois, o julgamento
O caso começou a ser investigado em maio de 2011, como desaparecimento. A mãe de Marielly registrou boletim de ocorrência no dia seguinte ao sumiço. O cunhado também tomou frente nas buscas, mesmo sabendo o que de fato havia ocorrido com Marielly.
O corpo foi encontrado no dia 11 de junho, em estrada vicinal que corta a BR-060, entre Campo Grande e Sidrolândia. A identificação foi imediata, por conta do aparelho que a jovem usava. Uma das pistas iniciais foi pano encontrado, que levou á clínica clandestina de aborto.
O caso ganhou ainda maior repercussão, quando foi descoberto que o próprio cunhado era o pai do bebê de Marielly. Diante dessa informação, a polícia relacionou Hugleice à ocultação de cadáver.
Com a quebra de sigilo telefônico, a polícia encontrou ligações entre os dois e mapeou o caminho seguido por Marielly até chegar em Sidrolândia. Em depoimento, o cunhado confessou que mantinha relacionamento com a jovem, até que ela engravidou. Em acordo, foram até Sidrolândia para que ela fosse submetida a aborto. Hugleice contratou o enfermeiro Jodimar Ximene Gomes, segundo a denúncia, por R$ 500 para o procedimento.
O procedimento foi feito na casa do Bairro São Bento, em Sidrolândia. Marielly passou mal, sofreu intensa hemorragia e morreu. Em trecho do depoimento prestado à polícia, Hugleice confessou que recebeu a notícia da fatalidade, dada pelo enfermeiro. “A menina morreu, não há mais nada que possa ser feito, a gente tem que dar jeito no corpo dela.”
O corpo de Marielly foi colocado na caminhonete de Hugleice e levado para o canavial, onde foi encontrado cerca de 20 dias depois. A prisão dos dois chegou a ser decretada, depois que a Polícia Civil entendeu que Hugleice prejudicava as investigações, porque exercia forte influência sobre a esposa e a sogra, sendo responsável pelas finanças.
Ele acabou liberado para responder ao processo e, mesmo com o escândalo, ele continuou casado com a irmã de Marielly e, junto à sogra, o casal se mudou para o Mato Grosso. Porém, a violência continuou.
Atualmente preso na Penitenciária Major Eldo de Sá Corrêa, em Rondonópolis, Mato Grosso, Hugleice veio escoltado a Mato Grosso do Sul para julgamento, no Tribunal do Júri em Sidrolândia.
No Estado vizinho, ele cumpre pena por homicídio tentado qualificado ocorrido em 2018 contra a esposa, Mayara Barbosa, irmã mais velha de Marielly. Ele foi condenado no dia 11 de novembro de 2020 a 12 anos e 3 meses de reclusão em regime inicial fechado.