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Coronavírus transformou a vida em Batayporã, que agora é sinônimo de medo

Campo Grande News esteve na cidade de 11.300 habitantes, onde duas pessoas morreram e outras quatro estão infectadas com Covid-19

Helio de Freitas, enviado especial a Batayporã | 09/04/2020 06:20
Principal acesso a Batayporã; cidade tenta sobreviver à pandemia que já matou dois de seus moradores (Foto: Helio de Freitas)
Principal acesso a Batayporã; cidade tenta sobreviver à pandemia que já matou dois de seus moradores (Foto: Helio de Freitas)

Batayporã, a 311 km de Campo Grande, foi uma das 19 cidades sul-mato-grossenses que passaram os 365 dias de 2019 sem registrar um único homicídio. Com 11.329 moradores, segundo estimativa feita ano passado pelo IBGE, o povoado encravado entre o município de Nova Andradina e a Usina Hidrelétrica Sérgio Motta, no Rio Paraná, é um lugar tranquilo, onde todo mundo se conhece.

Mas a palavra “Batayporã” agora mete medo nas pessoas. E o motivo é um só: o novo coronavírus que aterroriza o mundo e até esta quarta-feira (8) já tinha afetado quase 1,5 milhão de pessoas e provocado a morte de 87 mil no planeta.

“Você está indo para Batayporã? Não está com medo?”, se assustou o frentista de um posto de combustíveis na MS-276, rodovia que dá acesso de Dourados à região de Nova Andradina e depois a Batayporã.

Foi nessa pequena cidade emancipada em 12 de novembro de 1963 que ocorreram as duas primeiras mortes por Covid-19 em Mato Grosso do Sul: Eleuzi Silva Nascimento, 64, no dia 31 de março, e Sônia Regina dos Anjos, 66, na madrugada de segunda-feira (6).

Da esquerda para direita: Anderson Tolotti, Marcela Leite Macedo, Sidney Olegário Marques e o prefeito Jorge Takahashi (Foto: Helio de Freitas)
Da esquerda para direita: Anderson Tolotti, Marcela Leite Macedo, Sidney Olegário Marques e o prefeito Jorge Takahashi (Foto: Helio de Freitas)

Outros quatro moradores de Batayporã estão com o coronavírus. Todos infectados por contato com a primeira vítima, eles estão isolados em casa e são acompanhados diariamente por uma médica da saúde pública.

Nesta quarta-feira, o Campo Grande News se tornou o primeiro veículo de comunicação a parar em Batayporã depois das mortes pelo coronavírus. Até a manhã desta quarta, Batayporã era a única cidade sul-mato-grossense a registrar mortes pelo novo vírus.

“Agradeço ao Campo Grande News por vir aqui ouvir nossa história, mostrar nossas dificuldades. Agradeço também pela coragem, porque até agora todos só nos procuram por telefone”, afirmou o prefeito Jorge Luiz Takahashi (MDB).

Aos 63 anos de idade, Jorge Takahashi faz parte dos grupos de risco apontados pela OMS (Organização Mundial da Saúde). Por isso tem passado boa parte do tempo isolado no sítio. Nesta quarta, ele aproveitou que precisava assinar documentos na prefeitura e reuniu parte da equipe para falar com a reportagem.

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Além do prefeito, estavam presentes os secretários de Administração e Finanças Sidney Olegário Marques e de Saúde Marcela Leite Macedo e o coordenador da Vigilância Sanitária Anderson Tolotti.

Usando máscara, assim como todos os assessores presentes na roda de conversa, Jorge Takahashi não esconde a preocupação com os efeitos que o coronavírus ainda pode causar na cidade e admite: tem muita gente com medo de ir até o local. “Já tem estabelecimento com falta de alguns produtos porque o pessoal não quer vir aqui para fazer a entrega, por medo”, afirmou ele.

Nesta semana, o comércio da cidade voltou a funcionar após o prefeito flexibilizar algumas medidas adotadas logo após a primeira morte. Mesmo assim, praças e parques do núcleo urbano continuam fechados. Foi preciso até interditar bancos nas calçadas para evitar aglomeração nesses locais, antes muito frequentados para rodas de conversa e tereré.

Nas ruas, moradores tentam levar vida tranquilamente, mas ninguém esconde o medo de contágio (Foto: Helio de Freitas)
Nas ruas, moradores tentam levar vida tranquilamente, mas ninguém esconde o medo de contágio (Foto: Helio de Freitas)

Nas ruas, é possível perceber que os moradores tentam levar a rotina de cidade pequena. Alguns conversavam nas calçadas do centro e em frente às casas nos bairros. Poucos usavam máscara, que passou a ser recomendada pelo Ministério da Saúde.

A reportagem constatou algumas filas, principalmente em frente às duas agências bancárias e à casa lotérica. O prefeito afirma que determinou à equipe rigor na fiscalização para evitar aglomerações e mandou recado: “vamos acompanhar, fiscalizar, orientar, mas se for preciso endurecer as medidas, vamos fazer porque em primeiro lugar vamos pensar na saúde de nossos moradores”.

Reunião do prefeito com a equipe está prevista para a semana que vem, para avaliar os primeiros dias do comércio aberto. Como parte das ações contra a pandemia, a prefeitura decretou ponto facultativo na Semana Santa e apenas serviços essenciais estão funcionando.

Jorge Luiz Takahashi prevê dias difíceis, mesmo após o período de maior contágio, apontado pelas autoridades sanitárias. “Nossa principal fonte de receita é o FPM [Fundo de Participação dos Municípios], que já vem zerado por causa de dívidas antigas parceladas. O ICMS deve cair bastante por causa da crise. Se o governo federal não agir para ajudar os pequenos municípios, não sei o que ainda vamos enfrentar”, disse o prefeito.

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Dengue x coronavírus – A pandemia do novo coronavírus, que já atinge um a cada 1.886 moradores de Batayporã, afetou toda a estrutura de saúde pública da pequena cidade, onde nascem em média 120 crianças por ano e as mortes não passaram de 67 no ano passado.

O biólogo Anderson Tolotti, 32, coordenador da Vigilância Sanitária do município, tinha até recentemente como maior preocupação cuidar do combate à dengue e agora precisa correr atrás até para cumprir as regras sobre velório e enterro.

Ao Campo Grande News, ele afirmou que não foi pego de surpresa porque já vinha se informando sobre as orientações do Ministério da Saúde, mas não esconde a dificuldade enfrentada no caso das duas mortes. Formado na Uems em Nova Andradina, Anderson faz mestrado na mesma universidade, em Dourados.

No dia 31 de março, a Vigilância Sanitária acompanhou de Dourados até o cemitério municipal o carro da funerária com o corpo da primeira vítima, Eleuzi Silva Nascimento, 64. O caso dela já tinha sido confirmado como Covid-19, por isso não poderia ter velório e o caixão foi direto para o cemitério para ser enterrado. Um genro e uma neta vindos de Cuiabá (MT), além um representante da família, acompanharam à distância. Os demais familiares que moram na cidade estavam de quarentena.

Na segunda-feira (6), situação semelhante ocorreu após a morte de Sônia Regina dos Anjos, 66, no Hospital Regional de Nova Andradina. O corpo seguiu direto para o cemitério de Batayporã e enterrado, na presença do marido e de dois sobrinhos.

Anderson afirma que a preocupação com os demais assuntos de interesse de sua área não acabou, principalmente com a dengue, mas diz que já pediu reforço na equipe. Além de ajudar a cumprir as medidas sanitárias nos estabelecimentos comerciais que voltaram a funcionar nesta semana, ele também precisa coordenar a higienização dos espaços públicos. Nesta quarta, a limpeza foi feita nos arredores da cadeia local.

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