Cubano diz não se sentir escravizado e prega medicina “com amor”
Ao Campo Grande News, médico cubano que trabalha em Dourados disse que Bolsonaro faltou com respeito
Nas próximas semanas, pelo menos 8.500 médicos cubanos começam a deixar o Brasil após o governo de Havana romper o acordo com o Mais Médicos em decorrência dos planos do presidente eleito Jair Bolsonaro para o programa iniciado em 2013.
Em Mato Grosso do Sul, são 115 profissionais médicos vindos de Cuba que vão voltar para seu país de origem. Nove deles trabalham em Dourados, cidade a 233 km de Campo Grande, onde atendem nas unidades básicas de saúde.
Nesta semana, o Campo Grande News conversou com um desses médicos que estão em Dourados. Temendo represálias e perseguição, o profissional pediu para não ser fotografado e não ter o nome divulgado.
Em rápida conversa – “estou cheio de pacientes para atender” – o profissional deixou claro que nunca pensou em pedir asilo para ficar no país e diz que não se sente escravizado, como afirmou o presidente eleito quando defendeu o fim do convênio por Cuba ficar com 70% do salário dos médicos cubanos que trabalham no Brasil.
“Eu posso falar só por mim e não quero ficar no Brasil porque tenho minha família, tenho meu filho”, afirmou o médico, que também não esconde a mágoa pelas palavras ditas por Bolsonaro.
“O presidente faltou muito o repeito a nós. Não acredito que sou escravizado porque ninguém colocou uma faca em meu pescoço. Eu assinei um contrato e por isso estou aqui”, disse o cubano.
Os médicos da ilha caribenha têm outra visão sobre o fato de o governo de seu país ficar com 70% do salário que ganham no Brasil. Para eles, trata-se de uma contribuição justa, já que tiveram estudos gratuitos e seus familiares contam com saúde de graça, assim como toda a população cubana.
Família – O cubano que está em Dourados rebate afirmações do presidente eleito de que os médicos não puderam trazer seus familiares – contradizendo o que o próprio Bolsonaro dizia em 2013, quando criticava a vinda dos parentes dos médicos, a quem chamou de “agentes do comunismo”.
“Eu não trouxe minha família porque gastaria muito dinheiro, mas poderia ter trazido”. A Opas (Organização Pan-Americana de Saúde), entidade que intermediou o contrato de Cuba com o Mais Médicos, já informou que nunca houve veto à vinda dos familiares dos profissionais cubanos.
O médico afirma que faz seu trabalho com amor e sugere mudança no comportamento dos colegas de profissão para melhorar a saúde no Brasil.
“Acredito que nosso trabalho foi com amor ao povo. Fizemos tudo que tínhamos para fazer. Os brasileiros podem contar com os cubanos, porque o povo não tem culpa. Para o Brasil ter uma saúde pública melhor, os médicos precisam se conscientizar que são pessoas iguais às outras”, afirmou o cubano.
Cubanos em Dourados – A cidade de Dourados começou a receber os médicos cubanos em novembro de 2013. A primeira cubana a trabalhar nas unidades de saúde do município foi Karélia Guadalupe Sabovit Valdes, na época com 31 anos de idade. Outros sete chegaram quatro meses depois. Atualmente são nove contratados pela prefeitura.