Índios apostam na educação e aldeia de MS tem primeira faculdade do país
A comunidade indígena da aldeia Porto Lindo fez festa no início da tarde dessa sexta-feira (15), na escola da comunidade, que fica no município de Japorã, a 480 km da Capital, na região Sul do Estado. Foi durante a inauguração da primeira faculdade do país instalada dentro de uma aldeia. Também é a primeira escola superior de Japorã, que vai atender 40 alunos no curso de Pedagogia.
A primeira turma de graduação em Pedagogia na forma de EAD (Educação à Distância), por meio do sistema da UAB (Universidade Aberta do Brasil), teve a aula inaugural na noite dessa sexta-feira, ministrada pela professora Elizabeth Matos Rocha da UFGD (Universidade Federal da Grande Dourados). São 20 calouros índios e 20 não índios neste ano. Os da cidade vão precisar se deslocar 22 km, da cidade até a extensão Joaquim Martins, na aldeia Porto Lindo.
Já há um compromisso de a UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul) e da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) abrir novos cursos em 2016 e atender, pelos menos, 300 novos alunos na Escola Indígena, onde fica o polo da UAB Japorã, que foi inaugurada em fevereiro passado e atende cerca de 100 alunos no 5º ano do ensino fundamental durante o dia.
O caminho - A reportagem do Campo Grande News foi acompanhar de perto o evento, único no país, a convite do ex-deputado Antonio Carlos Biffi, convidado de honra da Prefeitura Municipal, por sua contribuição, em Brasília, para tornar o sonho da comunidade indígena realidade.
Depois de rodar cerca de 470 quilômetros na BR-163, no sentido ao estado Paraná, a cerca de 10 km de Mundo Novo, foi necessário pegar o acesso à direita e rodar mais uns 10 km para chegar em Japorã. Na segunda rotatória antes de chegar à cidade, foi preciso deixar o asfalto e seguir por mais 22 km de estrada de chão no sentido ao Distrito de Jacareí.
Nesta estrada, que liga Japorã a Iguatemi, depois de passar por umas cinco pontes de madeira e muito sobe e desce em estrada boa, a reportagem chegou à escola. Porém, a menos de 3 km da aldeia, foi possível avistar de longe o maior acompamento do Movimento Sem Terra no Estado, com 1.600 barracos de lona e restos de madeiras.
Ao parar no acampamento para pedir informação, o motorista estranhou o fato de um homem falando “portunhol”, com sotaque paraguaio, conhecer bem a região e o indicou estar no caminho certo e bem perto do destino, a Escola Indígena da Aldeia Porto Lindo, onde moram 4.900 índios da etnia Guarani, que representa 63% da população de Japorã.
Japorã é um município pequeno com pouco mais de 7.750 habitantes, conforme dados do censo de 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estastísticas), localizado na região do Cone Sul de Mato Grosso do Sul, na fronteira com o Paraguai e divisa com o Paraná, no extremo sul do Estado.
A festa - ao chegar à escola onde vai funcionar o polo da UAB, as autoridades e visitantes foram convidados a participarem da dança de boas vindas com um grupo de índios paramentados e com pinturas no rosto para a ocasião especialíssima. Eles sabem que ali é uma casa de futuro. “Estamos muito felizes hoje. Nosso povo vai poder ter futuro melhor. Aprender para ser professor é um sonho”, comentou o capitão da aldeia, Miguel Cáceres.
Antes de iniciar a solenidade de abertura, as autoridade assistiram a apresentação da fanfarra da comunidade, composta somente por jovens índigenas. O evento foi bastante concorrido, com representantes da Polícia Militar, Receita Federal, Governo do Estado, vereadores municipais e de municípios vizinhos, professora Vanessa Pedrancini, da UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul), o reitor Damião Duque de Farias, da UFGD (Universida Federal da Grande Dourados), o ex-deputado federal Antonio Carlos Biffi, o prefeito Vanderlei Bispo (PT) e seu vice, Gabriel Klasmann (PSDB) e da parte dos índios.
Com nome de cantor famoso, o líder indígena Roberto Carlos, abriu a solenidade agradecendo a todos que contribuíram para a realização do grande sonho para o povo Guarani. “Hoje nasce o futuro dos povos guarani de Porto Lindo. Sinto orgulho de fazer parte dessa história. É a primeira faculdade dentro de aldeia no Brasil”, destacou.
Ao se dirigir aos calouros indígenas, Roberto Carlos lembrou que o índio tem que se adequar à realidade para sobreviver. “Nossa raíz era a natureza e ela sumiu, agora temos que seguir a trilha da educação para conquistar novos caminhos. Ser um professor, advogado”, afirmou. Aos alunos não índios, ele deu as boas vindas e disse que eles estariam seguros na escola na aldeia.
O ex-deputado Biffi parabenizou a comunidade de Porto Lindo pela conquista e disse não ter sido fácil convencer as pessoas em Brasília que o sonho de um curso superior dentro da aldeia poderia acontecer. “Temos que quebrar muitos tabus, mas é preciso persistência e a compreensão das autoridades que tomam as decisões. Meu sonho é conseguir ver a creche e a pré-escola para as crianças da aldeia. E cursos técnicos e profissional para os jovens”, admitiu.
O prefeito Vanderlei Bispo agradeceu a cada uma das autoridade presentes no evento, uma vez que cada um teve seu papel na realização do sonho que se tornou realidade. Ele lembrou que o Brasil havia comemorado 515 anos, no último dia 22 de abril e “pela primeira vez na história instalamos uma faculdade na aldeia indígena. Hoje são 40 alunos, mas já tenho o compromisso de atender pelos menos mais 300 vagas para 2016”, anunciou.
Para o reitor da UFGD, Damião Farias, o curso de Pedagogia só se tornou realidade graças ao envolvimento e compromisso do prefeito municipal e seus secretários. “A Universidade tem interesse em se expandir cada vez mais, mas é necessário o apoio e comprometimento das autoridade locais e da comunidade. Quando temos boa parceria, como aqui, é possível trazermos mais cursos”, afirmou. O reitor informou que o curso na aldeia tem a mesma qualidade dos cursos presenciais na Universidade.
O professor indígena Lenilson Oliveira, de 26 anos, que ministra aulas para alunos do 2º ano, do ensino fundamental, em outra escola da Porto Lindo, disse que estava muito orgulhoso de poder fazer parte da primeira turma de Pedagogia na aldeia em que mora. “Jamais pensei que a faculdade poderia vir até nós. Agora não vou precisar ir a Dourados, como muitos colegas aqui fazem”, relatou.
Seu colega de turma, Edélio Lopes, de 28 anos, também se mostrava encantado e feliz com a possibilidade de não necessitar deixar a sua comunidade para estudar. Edélio, que já lecionou no programa Brasil Alfabetizo, disse ter mais três irmãs e quatro irmãos, e ele seria o primeiro integrante da família a realizar o sonho de fazer o curso superior.
Na escola indígena, que tem seis salas de aula, duas foram destinadas à turma de Pedagogia. Uma delas, com computadores com acesso à Internet para as aulas à distância e a outra para as aulas presenciais.
Para 2016, a professora Vanessa Pedrancini, disse que a UEMS vai instalar dois cursos de gradução (Ciências Sociais e Administração Pública) e um de pós-gradução (Especialização em Gestão Pública). Serão pelo menos menos 160 vagas. A UFGD vai abrir nova turma de Pedagogia para mais 40 novos alunos. E o prefeito Bispo disse que já havia o compromisso da UFMS oferecer mais dois novos cursos de graduação.