“Não vamos recuar”, afirmam indígenas em ato por demarcação
Comunidade de Aldeia Panambi Lagoa Rica rechaça proposta de acordo e promete permanecer em terras ocupadas
Indígenas guarani-kaiowá que ocupam áreas agricultáveis no município de Douradina prometem resistir à iminente tentativa de despejo e dizem que não vão sair das cinco áreas ocupadas há duas semanas.
Vigiada por produtores rurais, que também acamparam perto do local para barrar novas ocupações, a comunidade luta pela demarcação de 12,1 mil hectares em volta da Aldeia Panambi Lagoa Bonita, a 8 km do centro de Douradina e a 47 km de Dourados.
“Quando nosso povo coloca o xiru yvyrai, nosso marco sagrado na terra, nós não recuamos mais. Plantamos aqui a marca, o registro do nosso povo. Colocamos aqui e vamos manter, porque nossos direitos não são negociáveis. Não negociamos nossa terra”, afirmou o cacique Gilmar Veron, uma das lideranças dos guarani-kaiowá na região.
Nesta segunda-feira (29), a comunidade recebeu representantes de dezenas de entidades e movimentos sociais, que foram até o local de conflito para declarar apoio à luta pela retomada da terra. O Campo Grande News acompanhou a visita (veja os vídeos acima).
Os visitantes foram recebidos com rezas tradicionais e ouviram relatos de lideranças sobre o risco de confronto com produtores rurais. O grupo deixou claro que não pensa em aceitar acordo com os produtores, como está previsto para reunião marcada para a tarde de hoje no MPF (Ministério Público Federal) em Dourados.
A antropóloga Valdelice Veron, outra importante voz dos guarani-kaiowá em Mato Grosso do Sul, disse aos representantes de movimentos sociais que dois indígenas do acampamento foram feridos a tiros e outros se machucaram ao fugir de ameaças dos produtores.
Os sitiantes rebatem as denúncias e afirmam que ninguém do lado deles atirou contra os indígenas e afirmam que suas famílias são donas das terras há pelo menos meio século. Equipes da Força Nacional de Segurança Pública passam o tempo todo no local, para evitar novos confrontos.
“Fazem tortura psicológica colocando farol com luz forte sobre nosso acampamento toda noite, dão tiros, soltam rojões. Estamos muito preocupados. Vocês aqui, hoje, nos emocionam”, disse Valdelice, filha do cacique Marcos Verón, espancado até a morte por jagunços de fazendeiros em 2003, no município de Caarapó.
Valdelice também serviu de tradutora para a anciã da aldeia, que não fala português. Em guarani, a pequena senhora de quase 100 anos contou que seus pais e avós viveram nessas terras, mas, aos poucos, foram perdendo seu “tekoha” para os agricultores.
Em carta divulgada nesta segunda-feira, a Aty Guasu (Grande Assembleia) pediu socorro e alertou para risco de massacre após a reunião no MPF.
Aty Guasu – Segundo a entidade, que luta pela demarcação de terras e pelos diretos dos povos guarani-kaiowá, a proposta em negociação é a compra de terras fora da área já delimitada e reconhecida em 2011 como a Terra Indígena Panambi Lagoa Rica.
“Os membros da grande Assembleia Guarani Kaiowá e indígenas da TI Panambi Lagoa Rica se recusam a aceitar qualquer negociação fora de suas terras. Para eles, considerada originária, ancestral e inegociável”,afirma a Aty Guasu.
“Caminhonetes estão postas para matar nossas comunidades no território Panambi Lagoa Rica. O Estado assiste, não faz nada, não prende as milícias, não prende os políticos que as financiam, incentivam e punem nosso povo, nossas retomadas”, afirma a Aty Guasu.
Despejo – Na semana passada, o juiz federal Rubens Petrucci Junior deu prazo de cinco dias para os indígenas deixarem uma das propriedades ocupadas no dia 14. Na decisão, assinada no dia 23, o magistrado federal mandou requisitar do governador Eduardo Riedel a mobilização de efetivo da Polícia Militar para, com auxílio da Polícia Federal, garantir o despejo em caso de descumprimento da ordem por parte da comunidade indígena.
A reintegração de posse foi solicitada pelas proprietárias do Sítio “José Dias Lima”, de 147,7 hectares, localizado a poucos metros da MS-470, que liga Douradina ao município de Itaporã.
A propriedade está incluída na área identificada pela Funai em 2011 como parte da Aldeia Panambi Lagoa Rica, mas o processo de demarcação está parado na Justiça, fato, que segundo o juiz federal, não justifica o esbulho possessório. Segundo lideranças indígenas, a comunidade ainda não recebeu a intimação da Justiça.
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