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Em Pauta

Como Caxias conseguiu vencer Osório

Mário Sérgio Lorenzetto | 07/09/2019 09:07
Como Caxias conseguiu vencer Osório

Era o 25 de agosto de 1949. Os restos mortais do Duque de Caxias foram transladados para o centro do Rio de Janeiro. A cerimônia mobilizou a então capital federal durante uma semana. Procurava tornar nacional e cívico um "culto" criado pelo Exército em 1923 - "o culto a Caxias". Luis Alves de Lima e Silva, o duque de Caxias, foi o que se pode chamar de um vulto do Brasil Império. Alcançara o mais alto posto da hierarquia militar, o de marechal do Exército e se tornara uma importante liderança do Partido Conservador.

Como Caxias conseguiu vencer Osório

O sucesso militar estava acoplado ao político.

Os sucessos militares do "pacificador" Luis Alves tiveram início reprimindo as manifestações de rua contra a corte. Em seguida, fora reprimir as revoltas que pululavam em vários cantos do país. Nas primeiras eleições após a Balaiada, em 1841, já com o título de barão, Caxias foi eleito deputado pelo Maranhão. Assim como ocuparia a presidência (como eram chamados os governadores atuais) do Rio Grande do Sul e de São Paulo. Cargos que conquistara derrotando revoltas nessas províncias. Quando da Guerra contra Oribe e Rosas, voltaria à presidência da província gaúcha, que antes o elegera senador. Além de todos esses cargos, Caxias foi ministro da Guerra por três vezes. Ao final da Guerra do Paraguai, foi agraciado com o título de duque, sendo o único nesse grau da história nacional.

Como Caxias conseguiu vencer Osório

O homem simples que não queria saber de honrarias.

É interessante conhecer que Caxias não admitia receber honrarias nos pós morte. Em testamento, abdicou de todas elas, sendo sepultado com simplicidade, ao lado de sua esposa, no cemitério do Catumbi, no Rio de Janeiro. A monarquia respeitou sua vontade. Quem investiria de forma consciente e programada na elaboração do "culto a Caxias" seria a nascente República. O novo regime, criado pelos militares, necessitava incorporar as massas e passou a identificar, nas palavras de Raul Pompeia, um jovem escritor republicano, aquilo que denominou "tradição de virilidade de um povo".

Como Caxias conseguiu vencer Osório

O perfil de Osório era mais adequado.

Não foi fácil para os militares ganharem as graças da população nos primeiros anos da República. O povo mantinha-se distante. O dilema estava posto, e o primeiro general celebrado pela República, ainda em 1894, não foi o duque de Caxias. Se o objetivo era promover uma aproximação entre Exército e povo, o perfil do general Osório era mais adequado. Osório foi o mais carismático de todos os líderes militares de nossa história.

Como Caxias conseguiu vencer Osório

Uma cirurgia na memória.

É claro que essa substituição de Osório por Caxias foi realizada com destreza e planejamento típicos de militares. Enquanto Osório continua sendo identificado apenas pela sua patente e nome - General Osório -, Caxias teve seu nome mudado e só é lembrado por seu título nobiliárquico de duque. Hoje, talvez, poucos saibam que ele também pertenceu à nobiliarquia brasileira, com o título de marquês de Herval. Gradativamente foram deletando ou esmaecendo a adorada figura de Osório. Mas o que aconteceu para essa brusca mudança?

Como Caxias conseguiu vencer Osório

Novos conflitos pedem novo herói.

A partir de 1894, com a posse de Prudente de Morais, primeiro presidente civil, as tensões e conflitos envolvendo setores do Exército se tornaram crescentes. De 1889 a 1922, nada menos de 11 movimentos de contestação dos militares agitaram forças do Exército e da Marinha e, nos anos seguintes, a situação não foi diferente. Somando a isso, o ciclo de greves da década de 1910, que convulsionou o Rio de Janeiro e São Paulo, pediam por um novo ídolo. Logo apareceram na imprensa vozes conservadoras, saudosas da obra de "pacificação" do Império, levada a cabo pelo duque de Caxias.

Como Caxias conseguiu vencer Osório

Caxias, o ressurgimento.

Assim, se o general Osório era o ímpeto, o arrojo do soldado-cidadão, Caxias aparecia como o símbolo de um novo perfil de militar, estruturado a partir dos valores de disciplina e de obediência hierárquica.
Foi nesse momento que a memória do duque de Caxias, até então esquecida, começou a despertar o interesse de autoridades e de sua instituição. Em 1923, um sócio do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro propôs a instituição de uma cerimônia oficial em homenagem a Caxias. A proposta contou com rápida adesão do então ministro do Exército, general Setembrino de Carvalho, que, por meio de um aviso ministerial, instituiu a "Festa de Caxias", a ser realizada no dia do aniversário do general - 25 de agosto. Em 1925, apenas dois anos depois, a "Festa de Caxias" foi convertida em "Dia do Soldado". Osório fora esquecido. Caxias virava o modelo ideal do soldado brasileiro.

Como Caxias conseguiu vencer Osório

Um herói que revira em seu túmulo.

Caxias não admitia que fossem realizadas quaisquer solenidades ou me lhe dessem outras honrarias após sua morte. Se é verdade que cadáver vira na cova, deve estar há dezenas de anos tentando arrebentar seu túmulo.
Mas há um título que nunca recebeu e o merece mais que ninguém.
Poucos sabem que Caxias foi o verdadeiro abolicionista. Foi ele que afirmou (e cumpriu) após o término da Guerra do Paraguai que “os negros são meus irmãos de arma” e garantiu que o Exército não os perseguiria. Sem perseguição para os escravos que fugiam, não existia escravidão. Caxias foi o grande libertador dos escravos. Isabel e Zumbi foram figuras secundárias no longo processo de libertação.

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