Há ciência em um churrasco ou no cafezinho
A ciência vem sendo maltratada. Negacionismo, achismo, falta de investimento: ela tem precisado lutar pelo que antes era óbvio pois vivemos em um momento em que fatos que eram inquestionáveis são questionados. Os prejuízos desse desapego pela ciência são sentidos duramente nos dias atuais e amplificados pelas redes sociais. Que remédio há para o negacionismo, essa doença do espírito humano? Quanto mais pessoas aprenderem a pensar criticamente, menos gente propagará a desinformação.
A ciência está presente no churrasco.
Foi apenas uma questão de tempo até que os "chefs de cozinha" pré-históricos notassem que algumas maneiras específicas de preparar os alimentos modificavam e melhoravam o sabor. As carnes grelhadas se impuseram. Por quê? Por um lado, a superfície da carne endurece porque o líquido evapora e as proteínas coagulam. Por outro, os constituintes da carne reagem quimicamente para formar moléculas aromáticas e coloridas, formando uma crosta crocante e saborosa. Já no interior da carne, as moléculas de colágeno, que tornam a carne rígida, se degradam. Assim, a carne amolece. Isso ocorre em torno de 70 a 80 graus Celsius. A energia térmica é suficiente para quebrar as ligações mais fracas entre os átomos de certas moléculas, desnaturando as proteínas. Ao trabalhar no forno ou no fogão, o cozinheiro sabe o cuidado que deve ter com a temperatura. Sabe que há ciência em seu churrasco.
Grãos de café torrados perdem CO2.
Os grãos de café torrados perdem CO2 e outras moléculas voláteis com o tempo e, consequentemente, também perdem sabor. Consumir café logo depois de torrado, no entanto, não garante a qualidade do cafezinho. Temperatura e acidez da água também entram na conta. Pura física e química. Ciência pura. Não há negacionismo em uma xícara de café, não há achismo. Errou, o café arruinou.
Resgatar o desejo pelo conhecimento.
Talvez não exista necessidade mais importante no país que o resgate do conhecimento científico. O problema é que fica difícil entender o pensamento cientifico sem tê-lo aprendido. No Brasil, a ciência como disciplina é ensinada apenas com caderno, lousa e giz. Muitos professores nem sequer tem formação na área. De acordo com o último Censo da Educação Básica, só uma em cada dez escolas públicas ou privadas tem laboratório de ciências. Não causa estranhamento a última pesquisa sobre a percepção nacional da ciência e tecnologia. Nada menos de 90% da população não sabe dizer o nome de um cientista ou de uma instituição voltada para as ciências. Ciência e sociedade estão perigosamente distantes. E assim, a população torna-se refém de qualquer negacionismo repetido inúmeras vezes. Isso, basta repetir uma charlatanice, como o uso da cloroquina, para que uma multidão saia, alucinadamente, correndo atrás do remédio milagroso.