Uma história gelada. A criação do Império do Gelo
Se alguma vez houve um ano para brindar à saúde no último dia de 2020. As pessoas em todo mundo ergueram seus copos e taças gelados saudando tempos melhores que virão. Suspiros de alívio acompanhados do tilintar sutil do gelo nos copos.
A história das bebidas geladas remonta à Antiguidade. Romanos e indianos, na era de seus impérios, utilizavam o gelo nas bebidas. Mas foi o inovador comércio de "água congelada", saindo da Nova Inglaterra, nos Estados Unidos, para a Índia, em meados do século XIX que popularizou o gelo.
Um luxo gelado.
O vinho gelado era a moda na Roma do primeiro século. Pedaços de gelo eram retirados dos montes Vesúvio e Etna para esfriar comidas e bebidas dos ricos. Plínio o Jovem, um dos principais intelectuais desse tempo, atribui ao famigerado imperador Nero a invenção do balde de gelo e o resfriamento da água. Na Índia, o imperador Mughal Humayun, refrigerou sucos de frutas no verão, originando os sorvetes, no final do século XVI. O gelo saiu das montanhas da Caxemira e foi até a capital Delhi, tratado com nitrato de potássio (salitre). Aparentemente era uma gororoba, mas foram os indianos que criaram as "casas de gelo", locais para armazenar água congelada. O sorvete moderno saiu de Florença. No século XVII, a família Médici realizava banquetes com montanhas de gelo esculpidos. Foi essa rica família que patrocinou Bernardo Buontalenti, o criador dos atuais sorvetes.
Uma piada virou fortuna.
Era 1783. Frederic Tudor brincava com seu irmão Wiliam à beira de um lago próximo a Boston. William disse ao irmão que deveriam coletar gelo e vendê-lo nos trópicos. Frederic levou a piada à sério. Nascia a primeira fortuna do gelo. Era criado o Império do Gelo. Frederic enviou um navio contendo gelo para a ilha caribenha da Martinica em 1806. O gelo derreteu no cais. Frederic foi parar na cadeia pois não conseguiu pagar a dívida de US 5.000 para seus financiadores. Não desistiu da "loucura". Ao sair da cadeia, contratou o mais famoso inventor dos EUA, Nathaniel J. Wyeth, para criar novos tipos de serras, polias, grades de ferro e guinchos necessários para uma coleta de gelo mais eficiente. Cortou enormes blocos muito rapidamente e os enviou, por trem, para Boston e Salem. A partir daí, o mundo tropical esperava o gelo de Frederic Tudor, o Rei do Gelo.
O gelo chegou ao Brasil no século XIX.
Não se sabe como o gelo chegou ao Brasil, mas no século XIX já existiam, no Rio de Janeiro e em São Paulo, lojas especializadas na venda de sorvete feito com gelo saído dos Estados Unidos. O sorvete tornou-se símbolo da Belle Époque. Em 1.835, o Café do Círculo do Comércio, na rua Direita, no centro do Rio de Janeiro, vendia a iguaria para os ricos. O sucesso fez surgir a concorrência do Hotel do Norte. Em São Paulo, a Casa de Banhos Sereia Paulista, exclusiva para homens ricos, foi o primeiro comércio a vender sorvetes. As mulheres demorariam alguns anos para reivindicar seus espaços gelados nos cafés e confeitarias, quando também passaram a deliciar-se com o doce gelado.