De prostituição a empreendedorismo: pesquisadores estudam rota do MS à China
Mais de 100 professores e estudantes desenvolvem projetos para nortear políticas públicas na Rota Bioceânica
Mais que reduzir preços e a distância entre o Brasil e a Ásia, a rota bioceânica pode mudar as vidas das pessoas que moram nas cidades de Mato Grosso do Sul. Orçada em US$ 82 milhões, a obra da ponte entre o Paraguai e Porto Murtinho, a 439 quilômetros da Capital, foi lançada no dia 13, mas um grupo de 138 professores e universitários já se debruçam sobre todos os impactos que a nova rota pode trazer aos municípios.
A ideia é preparar os moradores para as “portas” que vão se abrir quando a ponte ficar pronta e por aqui passarem veículos com produtos vindos de São Paulo e outros Estados, rumo ao Paraguai para seguirem pela Argentina e chegarem ao Chile. A expectativa só cresce com o tempo, pois a previsão era terminar a obra neste ano, mas agora ela vai começar e espera-se concluir em quatro anos.
A ponte, que será feita com recursos da Itaipu Binacional, ou seja, dinheiro do Brasil e do Paraguai, e as estradas que o país vizinho está abrindo vão trazer um “um mundo de oportunidades”, mas podem trazer efeitos negativos também, se os municípios não estiverem preparados, na avaliação do coordenador do Coordenador do Cefront (Centro de Estudos de Fronteira General Padilha), professor doutor Mateus Abrita.
“Estamos trabalhando para mapear os possíveis impactos econômicos e assim buscar minimizar impactos negativos e potencializar impactos positivos. Se não tiver esse trabalho, podemos ter problemas com falta de infraestrutura, crescimento desordenado, entre outros”, explica o professor Mateus Abrita.
Mais que produtos - Os ganhos para as grandes exportações de grãos e outros produtos já é mais que certo.
A distância entre São Paulo e a China, que hoje é feita por uma rota marítima de 24,1 mil quilômetros, vai ser encurtada para 18,6 mil km, porque as transportadoras não terão mais que dar a volta por cima da América Latina para deixar o oceano Atlântico e chegar ao Pacífico. Com isso, a economia será gigantesca.
O que os pesquisadores querem saber são os ganhos que virão para os pequenos produtores, empresários, autônomos, caminhoneiros e moradores das cidades de MS que entram na rota.
Os pesquisadores querem nortear políticas públicas para apoiar os moradores locais inclusive a fazer renda agregando valores aos produtos que chegam pela rota. "Eles podem utilizar os grãos in natura para fazer produtos e vender. Há diversas possibilidades", destaca o pesquisador, que também coordena o Lab-Geims (Laboratório de Eficiência e Inovação na Gestão de Mato Grosso do Sul).
O projeto “Uems na Rota” é financiado por bolsas de estímulo à ciência e parcerias com as prefeituras. Estudantes e professores ganham bolsas para levantar todas as informações necessárias e levar orientações e serviços gratuitos às populações.
“A gente já sabe que os ganhos comerciais dos grandes setores, como a commodities, será grande. O frete vai custar menos, mas o foco dos nossos estudos é ir além disso. Queremos saber que empregos serão gerados, qual será o desenvolvimento local, o que terá de novo para os pequenos negócios”, detalha Mateus.
Projetos - Os grupos de estudos vão a campo conhecer as populações. Já são 52 projetos em fase de implementação e conclusão, conforme o professor doutor Ruberval Franco Maciel, que é coordenador do projeto Uems na Rota Biocêanica e o Observatório da Rota Rota de Intergração Latino Americana/Rota Bioceânica.
“Temos projetos voltados para a saúde do caminhoneiro, saúde da mulher, acuidade visual, ações de extensão com motoristas hipertensos e diabéticos, voltadas para a prevenção de IST (Infecções Sexualmente Transmissíveis), perfil epidemiológico e também com profissionais do sexo”, conta Ruberval.
Até curso de graduação deve surgir só para acompanhar o movimento logístico e econômico que atingirá as cidades.
“A Uems ofertará o primeiro curso em logística na cidade de Jardim, já preparando os futuros profissionais locais para a rota”, comenta o professor, que também é coordenador da Unirila (Rede Universitária da Rota de Integração Latino América).
Rodando as estradas do Brasil, com parada em Campo Grande na semana que antecede o lançamento da obra da ponte, o caminhoneiro Cláudio Reginaldo Fagundes acredita que os moradores das cidades de Mato Grosso do Sul não demonstram muito conhecimento sobre a nova rota.
“Isso é muito pouco conversado entre motoristas, não se aprofundam no assunto, mas é um projeto muito importante que vai mudar muita coisa para os caminhoneiros e população toda”, comenta.
Os projetos para ajudar a população dos municípios são nas áreas de direito, inovação e integração; linguagem, educação, memória e transculturalidade; turismo, gestão e sustentabilidade; saúde e fronteira; território, negócios e transportes; agronegócio, inovação e biosseguridade.
Rota - Os caminhões com soja, celulose, carnes, minério de ferro, fertilizantes, lítio, sal e outros produtos daqui de MS, de São Paulo e outras regiões terão acesso a ponte depois de passar por Campo Grande, Sidrolândia, Nioaque, Guia Lopes da Laguna, Jardim e Porto Murtinho.
Dali, seguirão sobre o Rio Paraguai para o município paraguaio Carmelo Peralta. As próximas paradas são em Mariscal José Félix Estigarribia no mesmo país; Pozo Hondo e San Salvador de Jujuy, na Argentina. No Chile, as rodovias seguem para San Pedro de Atacama e daí surgem duas opções de destino para os portos de Iquique e Antofgasta.
A partir daí, pode-se dizer que “o céu é o limite”, porque além da China há outros mercados que poderão ser explorados com mais facilidade. São os países da Costa Oeste das Américas e Oceania.
O escoamento da produção brasileira pode ainda ser impulsionado com ferrovias que estão nos plano do Cosiplan (Conselho de Infraestrutura e Planejamento) do governo brasileiro. O corredor ferroviário pode ser integrado a MS por meio das construção do trecho ferroviário de Cascavel, no Paraná, a Maracaju, passando por Dourados.
Pesquisadores do Departamento de Engenharia de Produção da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos) também fazem estudos sobre a rota. Eles querem determinar quais investimentos a cadeia de armazenamento de frios precisa para aproveitar o desenvolvimento que vem com a rota biocêanica, conforme a Semagro (Secretaria de Meio Ambiente, Desenvolvimento Econômico, Produção e Agricultura Familiar), que acompanha os estudos.