Adeus ao professor Roberto, um guardião das artes e da democracia
Um homem de muitos palcos, professor Roberto Figueiredo tem trajetória de paixão e respeito pela arte
A arte sul-mato-grossense perdeu, nesta sexta-feira (13), um de seus maiores representantes. Roberto Figueiredo, professor, diretor teatral e ativista cultural, faleceu em circunstâncias tristes que abalaram amigos em Campo Grande. Mais do que um professor ou diretor, Beto, como era carinhosamente chamado, foi um homem que viveu para democratizar a arte, transformar vidas e traduzir a humanidade em poesia no palco, conforme relata a comunidade artística.
Na manhã de hoje, amigos, colegas e admiradores dedicaram-se a homenagear sua história, relembrando o lado humano e cultural do artista. “Roberto nunca teve pressa, vivia a vida com a calma necessária para perceber os silêncios e encontrar histórias nos pequenos detalhes”, relembrou o escritor André Luiz Alves, que conversou com Beto na tarde de ontem sobre a pré-estreia do documentário “Onde Você Estava?”, prevista para o próximo dia 18 de dezembro, no Museu da Imagem e do Som de Mato Grosso do Sul.
Nascido com uma paixão natural pelas artes, Roberto fez do teatro, da música, da literatura e da cultura popular sua razão de viver. Amigos destacam que ele era muito mais do que um diretor teatral: era um curador de experiências humanas. Amava o samba, o carnaval e, acima de tudo, as pessoas — aquelas com histórias para contar, que ele sabia interpretar e transformar em momentos mágicos sob as luzes do palco.
Entre as memórias que compartilhou nas redes sociais, uma postagem recente revelou seu amor pela literatura e pelas lembranças que carregava consigo desde a infância. “Cafelândia. Lá ganhei meu primeiro livro como recompensa por ter passado de ano direto. Era meu primeiro ano de escola e a professora me fez essa surpresa que carrego até hoje. Faz 60 anos”, escreveu, mostrando um livro com capa marcada pelo tempo.
O professor também surpreendia com facetas inesperadas de sua vida. Poucos sabiam, por exemplo, que ele era formado em Química e chegou a atuar na área antes de se render completamente à história e ao teatro. “Ah, o teatro sempre junto”, brincou em uma postagem.
Durante 39 anos na Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), Roberto esteve à frente do grupo teatral “Senta que o Leão é Manso”, promovendo o talento de milhares de alunos. Ali, também coordenou projetos de música e dança, como o “Ararazul” e o “Coral UCDB”, sempre com o objetivo de tornar a arte acessível e impactante.
Beto liderou grandes movimentos culturais em Mato Grosso do Sul, como o fortalecimento do teatro amador nos anos 1980 e 1990, marcando o cenário com festivais que davam espaço para grupos de diferentes contextos sociais. Para ele, a arte era um instrumento democrático e essencialmente humano. “Roberto era capaz de organizar festivais que respeitavam tanto o grupo de duas pessoas quanto as grandes produções. Ele via valor em tudo”, destacou o jornalista Sérgio Carvalho, amigo de longa data.
Despedida e memórias
No teatro da vida, Beto nunca deixou de brilhar. Seus amigos relembram histórias que mostram sua essência leve e reflexiva. Durante uma viagem a Corumbá, ele disse: “Eu não corro, parei de sentir pressa, prefiro ouvir os silêncios”, contou o escritor Luiz Alves. Essa postura o acompanhava em tudo o que fazia, inclusive nos seus últimos projetos, como o documentário que estava prestes a lançar.
Idemar Luiz Sprandel, outro admirador de Beto, reforçou nas redes sociais o impacto que ele deixou: “Roberto dedicou sua vida à educação e à cultura, deixando uma marca inapagável no teatro sul-mato-grossense. Hoje, prestamos nossa solidariedade a todos que tiveram a sorte de conviver com ele”.
As informações sobre velório e sepultamento ainda não foram divulgadas. Campo Grande se despede de Roberto Figueiredo, mas seu legado permanece vivo nos palcos, nos livros, nas memórias de amigos e nos corações de todos que acreditam no poder transformador da arte.
O jornalista e músico Rodrigo Teixeira também compartilhou uma lembrança marcante de sua última conversa com Roberto Figueiredo. "Ontem (12) fui à UCDB com Moacir Lacerda entregar o livro do Acaba para o Padre Marinoni. Encontramos o Beto no corredor, e ele foi conosco. Estava muito feliz porque ia ao show do Caetano! Também frisou que estava contente com o vídeo que iria lançar na semana que vem, com depoimentos sobre a divisão do Estado. Mais uma vez, relembrou que minha mãe, Malu, tinha liberado o salão de festa da escolinha Acalanto, na 15, para os primeiros ensaios do grupo Senta Que o Leão é Manso, ainda nos anos 90. Na conversa, ele ainda ressaltou a importância da história do Colégio Estadual e contou que participou do processo para que a escola se tornasse patrimônio", relatou Rodrigo.
Rodrigo também mencionou uma das últimas ideias que Beto compartilhava com entusiasmo. "Ele ressaltou que deveríamos fazer um movimento para que o Centro de Belas Artes ganhe o nome da Professora Glorinha Sá Rosa", completou Rodrigo, citando uma figura tão importante para a literatura e a Educação de Mato Grosso do Sul, que nos deixou em 2016.
Malu Teixeira, mãe de Rodrigo e amiga de longa data de Roberto, também deixou suas palavras de carinho. "Roberto era um querido comigo, aparecia para tomar um café na escola, e sempre conversávamos sobre a minha vontade de fazer teatro. Ele fez inúmeros convites para que eu realizasse esse desejo. Devia ter ido", lamentou Malu, destacando a generosidade e o incentivo que eram marcas do professor.
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