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Comportamento

Com filhos no grupo de risco, mães estão sofrendo mais do que nunca

"Preocupadas", "enlouquecidas", "angustiadas", são só alguns dos adjetivos que as mães usam para descrever a situção em que estão

Lucas Mamédio | 14/05/2020 06:40
Janaina e Jamile saem de Bonito toda segunda rumo à Campo Grande (Foto: Arquivo Pessoal)
Janaina e Jamile saem de Bonito toda segunda rumo à Campo Grande (Foto: Arquivo Pessoal)

Toda segunda-feira é a mesma rotina, Janaina Benites Lopes e sua filha, Jamile Vitoria Lopes Ferreira, de 4 anos, saem de Bonito e percorrem uma distância de quase 300 quilômetros até Campo Grande. A finalidade da viagem é o tratamento pelo qual Jamile passa, de quimioterapia. Ela tem câncer no fígado e não bastasse à angústia inerente a sua situação, agora trava mais uma batalha contra um inimigo invisível: o coronavírus.

Jamile está no considerado grupo de risco, o de pessoas com doenças crônicas, que passam por tratamentos fortes, tomam medicamentos imunossupressores, entre outras características.

O fato das duas morarem em uma fazenda com a família em Bonito ajuda quando o assunto é isolamento, mas a necessidade de vir toda semana para Capital, às vezes em vans públicas com mais gente, apavora Janaina. “Está sendo muito difícil lidar com essa rotina, eu coloco máscara nela, levo álcool comigo, a vontade é colocar ela dentro de mim de novo e só tirar quando chegamos aqui”.

A presidente da Sociedade de Pediatria de Mato Grosso do Sul, Carmen Lucia de Almeida Santos, explica que em casos como o de Jamile, de criança no grupo de risco, a medida primordial é prevenção. “É preciso reforçar as medidas preventivas, como isolamento e proteção. Tem que evitar levar o vírus para dentro de casa, evitar visitas, higienizar bem a superfície da casa, e não podemos esquecer a alimentação e hidratação dessas crianças”.

Diante do contexto atual, Carmem atenta para um problema que tem surgido muito entre as mães de crianças no grupo de risco. Na ânsia de proteger o filho, muitas mães estão mudando o tratamento por conta, a fim de “reforçar” a proteção dessas crianças. “Tem que primeiro checar com os médicos deles pra ver se existe a necessidade de se alterar o tratamento, e isso deve ser feito de forma individualizada, principalmente se houve contágio ou não”.

Quem cometeu esse “erro” - por excesso de zelo, é claro - foi a Clarice Mesquita, mãe do pequeno Arthur Mesquita, de 3 aninhos. Arthur tem asma, assim como a mãe, e isso é bem perigoso, pois já está pacífico entre os estudiosos do coronavírus que ele ataca o sistema respiratório.

Clarice está lutando consigo mesma para não "errar" com Arthur (Foto: Arquivo Pessoal)
Clarice está lutando consigo mesma para não "errar" com Arthur (Foto: Arquivo Pessoal)

Clarice conta que logo no começo da pandemia estabeleceu para o filho que ele seguisse o plano de crise para quem tem os primeiros sintomas de crise asmática, no caso a tosse. O problema é que ele não estava com tosse, mas ela imaginou que antecipar uma possível situação era uma forma a mais de protegê-lo. Essa medida durou pouco, pois Clarice fez o certo, ouviu especialistas.

“Logo depois eu assisti a uma live da pediatra dele, depois consultei a pneumologista dele também e vi que era um total absurdo. Mas confesso que minha vontade era deixar o tempo todo ele medicado com remédios do plano de crise, era aumentar a dose do medicamento que ele tomava”.

Sobre como lidar com o isolamento, com o medo de contaminá-lo, Clarice ainda busca saídas, testa alternativas. “Está sendo muito angustiante, já sou traumatizada por conta da asma, quase perdi meu filho antes disso tudo, nesse período de pandemia fomos duas vezes a uma praça aqui perto, ao meio dia, quando não tinha ninguém mesmo, o sol rachando, e mesmo assim sinto que as pessoas meio que me julgam, como se estivesse fazendo algo errado”.

Porém, o passeio mais comum está sendo dentro do carro. “Saio pra dar uma volta de carro com ele de vidro aberto, mas quando vejo ciclista fecho enlouquecidamente, pois vi que transmissão pode ser feita numa distância de até 20 metros no caso de quem anda de bicicleta”, releva.

A saúde mental também tem que ser uma preocupação não só das crianças no grupo de risco, mas das crianças em geral, segundo Carmem. “Muitas crianças estão desenvolvendo crise de ansiedade, distúrbio de sono, é um efeito tóxico do isolamento. Então é preciso conversar muito, dar muitas atividades lúdicas dentro de casa, dar atenção mesmo”.

Segurar o pequeno André dentro de casa não está sendo tarefa fácil Letícia (Foto: Arquivo Pessoal)
Segurar o pequeno André dentro de casa não está sendo tarefa fácil Letícia (Foto: Arquivo Pessoal)

É justamente a questão psicológica que está afetando bastante a vida de Letícia Dias, mãe do André Lucas, de 4 anos. Ele tem síndrome de Down e também faz parte do grupo. Isso porque, em geral, pessoas com síndrome de Down são mais propensas a contrair infecções. Além disso, muitas pessoas com síndrome de Down têm outros problemas médicos que podem trazer maior risco de agravamento do quadro da Covid-19.

“Aqui em casa nós radicalizamos, foi isolamento total desde o início. No começo ele estava lidando melhor com o fato de ficar em casa, mas agora está bem agitado, inquieto, por isso tentamos ao máximo distraí-lo, brincar com ele, mas não é fácil”.

Morando em Vicentina, a 255 quilômetros de Campo Grande, Luana Benites Yasunaka, mãe de Manuela Thiemy Yasunaka, vive o drama de ver a filha percorrer quatro vezes por semana essa longa distância de ida e volta para fazer hemodiálise.

Manuela é renal crônica e viaja com o pai para a Capital. “Esse deslocamento, usar banheiro, alimentação, causa muita insegurança, mas não temos outra opção, infelizmente”, lamenta a mãe.

Luana vive com a esperança do tranplante de Manu e de que tudo isso vai acabar bem (Foto: Arquivo Pessoal)
Luana vive com a esperança do tranplante de Manu e de que tudo isso vai acabar bem (Foto: Arquivo Pessoal)

Além do exposição na viagem, Luana tem uma preocupação adicional, pois trabalha na linha de frente, no atendimento ao público da Secretaria de Assistência Social de Vicentina.

“Estamos seguindo firme, pedindo a Deus que nos proteja, e que tudo isso retome o curso natural, pois estamos aguardando o rim novo para Manu, já que ela está em hemodiálise há dois anos e nove meses, mas está em fila de transplante aguardando, para que ela venha ter uma vida mais próxima ao normal possível”.

Vida normal para Manu, vida normal para Jamile, Arthur e André. Vida normal para todos nós!

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