Conquista da filha com paralisia provou à mãe que distância nem sempre é ruim
A campo-grandense Flávia Lima tem paralisia cerebral, é campeã de petra e já conquistou 19 medalhas em um ano
Flávia é só sorrisos desde que voltou de São Paulo, há quase duas semanas. Com mais uma medalha no quarto, o olhar brilhoso não esconde a satisfação de ver que sua história sendo contada. Nascida com paralisia cerebral e subestimada na infância por causa da deficiência, a menina provou praticando uma modalidade ainda pouco divulgada que pode voar longe.
E mais do que conquistar prêmios, ela também ensina todos os dias a mãe que distância nem sempre é ruim quando se tem sonhos e precisa lutar por eles.
Flávia de Lima tem 21 anos e foi campeã na Petra, uma modalidade praticada sobre uma “espécie” de triciclo em que os adeptos apoiam o peito em um suporte anexado às três rodas e se locomovem por meio dos movimentos das pernas, pois não há pedal. “Não é difícil”, explica a menina.
Na última competição viajou sem a mãe, ao lado apenas da treinadora e voltou com título que deixou Elisângela Melhado cheia de orgulho. As lágrimas não escondem a emoção de ver a filha alcançar o pódio, principalmente, após ter sido subestimada e rejeitada ainda na infância. “Algumas pessoas não acreditaram na minha filha, desde o começo a rejeitaram e isso acabou virando combustível pra gente lutar”, descreve a mãe.
Flávia é aluna da Apae - rede de atendimento à pessoa com deficiência e onde tem todo apoio para praticar esportes. Também faz aulas de dança, teatro e sonha em ser professora de Educação Física. Mas a melhor parte é a amizade que transmite a menina o sentido de amor. “Aqui tenho muitos amigos”.
O diagnóstico de paralisia cerebral veio nos primeiros meses de vida, lembra a mãe. “E foi um choque, porque é uma realidade que a gente nunca espera”, descreve. Quando os médicos confirmaram a paralisia, iniciou a jornada de Elisângela por tratamento e assistência a filha, para que tivesse uma vida normal.
A menina demorou a andar, falar e se desenvolver, mas Elisângela nunca desistiu e foi além. “Larguei mão de tudo só para lutar pelos sonhos dela. E minha maior recompensa é ver no dia a dia a determinação dela para voar longe”.
A deficiência provou, inclusive, a mãe como é possível suportar a distância. Pois com os avanços de Flávia no esporte, a competições vão surgindo e nem sempre é possível ter Elisângela por perto. “O coração explode de felicidade e ao mesmo tempo precisa controlar o medo porque nas últimas competições ela viajou sozinha e talvez as próximas ela viaje também”.
Foi assim na última competição. Flávia foi convocada apenas 15 dias antes do evento Open Internacional Loterias Caixa de Atletismo e Natação 2019 que aconteceu de 25 a 27 de abril, no Centro de Treinamento Paralímpico, em São Paulo. A competição reuniu mais de 600 atletas de 20 países.
Foi pouco tempo para viabilizar os documentos e as passagens que foram doadas pela Fundesporte (Fundação de Desporto e Lazer de Mato Grosso do Sul). E como Elisângela não teve condições de ir, o jeito foi aguentar a emoção de ver a filha viajando sozinha. E quando questiono com quem Flávia quer ir na próxima competição, não há dúvidas. “Vou com a professora”, explica.
A mãe não se importa com a escolha, pelo contrário, diz que chora de alegria por ver que Flávia pode fazer as próprias escolhas. “A gente sempre vai ficar preocupada, mas eu confio muito na equipe atende e vê-la lutando assim como eu luto por ela é muito gratificante”.
Em um ano na Petra, Flávia já conquistou 19 medalhas e é dona do recorde brasileiro nos 100M feminino. A mãe diz que a filha chegou ao pódio em todas as competições que participou, ficando sempre entre o 1º e 2º lugar. “Meu sonho é que vários outros alunos tenham a mesma chance e qualidade de vida que a minha filha tem”.
Flávia competirá novamente em junho, e, se baixar mais seu tempo, disputará a modalidade no final do ano, em Dubai.