Doada ao nascer, Marcilene luta há 43 anos para conhecer suas origens
A mãe biológica, Enezita Lúcia dos Santos, entregou a filha logo após o nascimento e nunca mais apareceu
Por toda a infância, Marcilene Grance Arguelho nunca se sentiu diferente dentro de casa. Cresceu cercada de carinho, foi muito bem cuidada e sempre soube que fazia parte daquela família. Mas, ao mesmo tempo, algo dentro dela sempre questionava: de onde eu vim?
A resposta começou a tomar forma quando ela tinha apenas sete anos. "Eu era a única branca e loira no meio de um monte de paraguaios", lembra. A frase, dita de forma leve, esconde um sentimento profundo. Marcilene foi adotada logo após o nascimento e, desde então, tem tentado preencher lacunas da própria história.
O que ela sabe sobre sua origem vem de relatos de sua mãe adotiva, que faleceu há 11 anos. A história começou em novembro de 1981, na Santa Casa de Campo Grande, onde sua mãe biológica, Enezita Lúcia dos Santos, deu à luz e onde sua mãe de criação trabalhava na cozinha.
No hospital, uma coincidência do destino ligou duas mulheres que nunca mais se veriam. A filha da mãe de criação, Rosalina, estava internada devido a uma ameaça de aborto. No mesmo quarto, também estava a mãe biológica de Marcilene.
Durante a internação, Enezita confidenciou que não poderia ficar com o bebê que esperava. A jovem, de apenas 17 anos, era do Rio Grande do Sul e estava em Campo Grande para estudar na Faculdade Dom Bosco. Sem condições de criá-la, decidiu entregá-la para adoção.
Rosalina não pensou duas vezes: ligou para a mãe, que estava trabalhando na cozinha do hospital, e sugeriu que a família adotasse a bebê. A mulher subiu correndo e conversou com Enezita. Ali, no hospital, as duas acertaram a adoção indireta e definiram o destino de Marcilene.
Dias depois, Enezita e uma tia levaram o bebê recém-nascido até o bairro Santa Luzia, onde a família adotiva morava. A pequena estava enrolada em um pano da Santa Casa.
Antes de ir embora, a mãe biológica disse que voltaria em 15 dias para entregar um cheque e ajudar no enxoval da criança. Mas os dias passaram, viraram meses, anos… e ela nunca mais voltou.
O nome que daria à filha também se perdeu. "Minha mãe adotiva disse que ela pediu para colocar um nome em mim, mas era um nome complicado. Quando o carro virou a esquina, ela decidiu que colocaria o nome que quisesse, afinal, quem iria criar era ela", conta.
Junto com a bebê, a mulher deixou alguns documentos, e foi por meio desses papéis que, anos depois, Marcilene descobriu o nome de sua mãe biológica e do médico que fez seu parto, Dr. Salvador, da Santa Casa.
Aos 18 anos, movida pela curiosidade, ela procurou a Santa Casa em busca de mais informações. A resposta foi um balde de água fria: só com ordem judicial os documentos poderiam ser liberados.
Na época, sua mãe adotiva ainda ficou incomodada com a busca. "Pareceu se sentir enciumada, e eu parei de procurar", lembra Marcilene.
Mas antes de falecer, a mulher que a criou fez um pedido: "Quando eu morrer, quero que você procure sua mãe. Ela não ficou com você porque não pôde", recomendou.
Com o tempo, a vontade de encontrar a mãe biológica voltou a crescer. Não por mágoa, nem para cobrar explicações. Marcilene não sente raiva. O que ela busca é entender sua origem, saber quem é seu pai, se tem irmãos, conhecer sua história.
Recentemente, encontrou uma mulher no interior de Santa Catarina com o mesmo nome e idade de sua mãe biológica. A única diferença era um sobrenome a mais, que poderia ser de casamento.
O coração acelerou, a esperança aumentou. Mas a resposta foi dura: "Ela disse que não era minha mãe, que nunca veio a Campo Grande e pediu para que eu parasse de procurá-la", conta. O bloqueio veio logo depois, quando o marido de Marcilene tentou contato pelas redes sociais.
Hoje, aos 43 anos, ela segue com o mesmo desejo de sempre: encontrar suas raízes. "Se minha mãe não quiser ter contato comigo, faz parte. Ninguém é obrigado a nada. Mas gostaria de saber de onde eu sou, com quem me pareço", finaliza.
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