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Comportamento

Luciano enfrentou Tribunal do Júri pedindo condenação do próprio pai

Estudante integrou equipe de advogados de Francisco Luciano, condenado por tentativa de feminicídio

Aletheya Alves | 02/11/2022 07:50
Luciano Albuquerque Silva atuou na defesa do pai, Francisco Luciano da Silva Neto. (Foto: Paulo Francis)
Luciano Albuquerque Silva atuou na defesa do pai, Francisco Luciano da Silva Neto. (Foto: Paulo Francis)

"Hoje, na última barreira, se colocou o filho de um acusado, pedindo a condenação do próprio pai”. Aos 22 anos, Luciano Albuquerque Silva realizou o que esperou por quatro anos, defender o pai no Tribunal do Júri pelo crime de tentativa de feminicídio.

No dia 21 de outubro, o acadêmico vestiu a beca e se dirigiu ao Fórum de Campo Grande para atuar na defesa do pai, que terminou na condenação por 11 anos. Estudante de Direito, Luciano é filho de Francisco Luciano da Silva Neto, condenado por ter atirado na ex-companheira e esfaqueado uma amiga da mulher.

Enquanto o Ministério Público pediu a condenação de Francisco por tentativa de feminicídio e homicídio, Luciano apresentou a tese de que o pai seria culpado por um crime diferente, a lesão corporal. Por isso, ao invés de pedir pela total absolvição, o filho atuou na defesa, mas ao mesmo tempo defendeu a condenação.

“Há quatro anos guardando o choro. Só consegui quando saiu a última palavra. A beca virou meu lenço. Lembro do dia que comprei ela. Quero acreditar que minha missão foi cumprida, já não sei quando piso lá de novo”, publicou Luciano em suas redes sociais depois do dia 21 ter terminado.

Em 2018, ele percebeu que o único caminho possível seria se especializar na área. (Foto: Paulo Francis)
Em 2018, ele percebeu que o único caminho possível seria se especializar na área. (Foto: Paulo Francis)

Retomando para o início de quando sua vida sofreu uma guinada, Luciano explica que o crime cometido pelo pai veio em seu primeiro ano na graduação. “A história começou quando eu estava no primeiro semestre. Eu sou de uma família humilde com poucas pessoas formadas e nenhum advogado. Quando isso aconteceu, enxerguei a situação de que meu pai precisava de um advogado e a realidade de preço para Júri era muito distante da nossa”, conta.

A partir desse momento, Luciano explica que decidiu se tornar o advogado que o pai precisaria quando se sentasse no banco dos réus. “Comecei a me especializar em júri, então fui me tornando estagiário na área e precisei lutar por algumas prerrogativas porque via de regra estagiário não poderia falar em júri. Mas encontrei na lei que poderia, sim, fazer a sustentação oral”.

Mesmo sem gostar de falar em público, o estudante percebeu que precisaria fazer mudanças para conseguir atuar no caso do pai. Então, passou a também se aprofundar na oratória, assistir diversos júris e estudar o campo.

Além de escolher o rumo que tomaria no campo do Direito, o estudante explica que também precisou pensar sobre como sua atuação era complexa, até considerando o crime cometido. “Eu sabia que era uma questão sensível. Algumas vezes me disseram que eu poderia me prejudicar por estar muito envolvido, mas nunca consegui me imaginar ocupando outro lugar naquele plenário que não fosse fazendo a defesa do meu pai”.

O caso e a defesa

“Não negociei meu tempo, não me escondi da verdade, não escolhi convencer com lágrima, segurei o embargo na voz. Só eu sei. Só eu. Vou procurar sentido depois de hoje, mas sei que fiz de tudo por ele”. Detalhando que se preparou psicologicamente para não chorar, Luciano narra que escolheu reunir tudo o que poderia para convencer os jurados sobre sua tese.

De acordo com o estudante, a defesa apontou que existiam elementos de que Francisco não queria matar as duas mulheres. “Ele tinha tudo para matar as mulheres envolvidas e em determinado momento ele começa a se esfaquear, dá um tiro na própria cabeça e a bala não sai. Eu poderia, como filho, pedir a absolvição, mas entendo que meu pai fez algo errado e merecia ser condenado por lesão corporal”.

A tese de Luciano não foi acatada, mas ele explica que contribuiu para a redução do tempo de pena. Além das questões técnicas, o jovem também investiu em relatar sobre o perfil do pai durante a defesa.

“Além do momento mais técnico mesmo, eu defendi que aquela pessoa que estava sentada possuía outras questões. Contei sobre os meses em que ele ficou preso e sobre como foi depois de solto. E as pessoas se emocionaram muito, me esforcei para continuar sem chorar”, detalha Luciano.

Agora, com a condenação determinada, os próximos passos de Luciano envolvem finalizar a graduação e seguir se responsabilizando pela defesa do caso do pai.

Crime em 2018

Ao fim do tribunal, Francisco Luciano da Silva Neto foi condenado a 11 anos e quatro meses de prisão em regime fechado. De acordo com o processo, ele atirou contra a ex-mulher e esfaqueou a amiga da vítima.

Além da pena, o réu foi condenado ao pagamento de danos materiais no valor de R$ 4 mil e R$ 3 mil em danos morais para cada vítima. Em depoimento, a ex-companheira de Francisco declarou que ele tinha sentimento de posse, por isso havia tentado a matar.

Ainda de acordo com a vítima, ela e Luciano foram casados por seis anos, mas nenhuma agressão havia ocorrido até o relacionamento acabar.

Sobre a dinâmica da tentativa de feminicídio, Francisco atingiu o armário da casa com disparos de arma de fogo e a vítima se escondeu embaixo da mesa. Ainda assim, foi atingida na barriga e teve uma bala alojada no quadril. O outro tiro passou de raspão em sua cabeça.

Sua amiga, que também estava na casa, foi esfaqueada pelo homem e ferida no ombro. Na época, as duas foram socorridas e levadas para Santa Casa. Francisco também foi socorrido após se automutilar com uma faca e ter um ferimento no tórax.

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