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Comportamento

Quando pet morre, tutor sofre com luto e ainda enfrenta julgamento

Zorro não resistiu após ser atropelado e, enlutada, Roseli se viu com vergonha de compartilhar a tristeza

Por Aletheya Alves | 29/06/2024 07:10
Roseli com sua família em seu último aniversário com a presença de Zorro. (Foto: Arquivo pessoal)
Roseli com sua família em seu último aniversário com a presença de Zorro. (Foto: Arquivo pessoal)

“Chorei o dia todinho que Deus deu, pensava no vazio que iria sentir porque ele era meu fiel companheiro. Onde eu estava, ele estava e quando íamos para algum lugar que dava para levá-lo, levávamos. Sinto falta até do barulho das patinhas dele andando pela casa”, conta Roseli dos Santos sobre os sentimentos que passaram a fazer parte do seu cotidiano após Zorro, seu cachorro de 13 anos, não sobreviver a um atropelamento. Além de lidar com a dor de perder o companheiro, ainda precisou enfrentar a vergonha e sentimento de que não poderia compartilhar a tristeza por julgamentos.

Todos esses sentimentos vieram à tona no início deste ano, em fevereiro, quando Roseli estava levando o cachorro para passear. “Ele era muito obediente, mas nessa manhã não obedeceu e atravessou a rua correndo. Uma moto bateu no peito dele e ele já caiu sem vida”. Foi a partir desse momento que a tutora começou a enfrentar o que muita gente também sente: a multiplicação da dor ao pensar que não teria com quem compartilhar o momento.

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Confesso que tive um pouco de vergonha de demonstrar meu sofrimento porque as pessoas não entendem esse amor, mas não é exagero. Os pets são companheiros, amorosos e eles só sabem nos amar sem nos julgar. São gratos, leais e amáveis, eles não falam, mas nos entendem melhor do que os seres humanos, explica a tutora.

Contando sobre sua história com Zorro, Roseli detalha que o então filhote foi adotado com cerca de 40 dias e foi seu primeiro cachorro. Preocupada desde o início, todas as vacinas, vermífugos e carrapaticidas sempre estavam em dia e até o banho era dado por ela semanalmente.

Em seus treze anos, não faltaram “sustos”, como a tutora diz. Zorro já havia se recuperado de um ataque por outro cachorro, da quebra do fêmur e precisou retirar um tumor no baço. “Por último, descobrimos sopro no coração, mas entramos com medicação contínua e ele tinha uma boa qualidade de vida, era muito bem cuidado e o passeio era diário”.

Quando o companheiro e filho, como ela o chamava, morreu, o caminho foi de procurar caminhos para poder lidar com a dor. E foi nesse trajeto que Roseli encontrou o grupo de apoio ao luto da UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul).

“Quando sinto saudades que apertam meu peito, me permito chorar a perda e a falta dele, mas o que me consola é que estou aprendendo a substituir a saudade dolorosa por lembranças boas da nossa vida juntos. Ter um grupo ajuda consideravelmente porque podemos falar da nossa dor sem o medo de sermos julgados e sabendo que vamos ser compreendidos”, diz Roseli.

Amizade entre Zorro e Roseli começou há treze anos. (Foto: Arquivo pessoal)
Amizade entre Zorro e Roseli começou há treze anos. (Foto: Arquivo pessoal)

Dor verdadeira

Psicólogo e coordenador do grupo de apoio ao luto da UFMS, Edilson dos Reis explica que, apesar de ainda existir um forte estigma sobre a relação entre humanos e pets, é necessário reforçar que os sentimentos são verdadeiros. E é óbvio que isso se estende ao momento de luto.

“Hoje, os pets têm uma participação muito grande na vida cotidiana das pessoas, principalmente depois da covid. Com o isolamento social, as pessoas perceberam que a presença desses animais trazia consolo e também o sentimento de pertencimento, principalmente para idosos”, relata Reis.

Na prática, esse vínculo é algo forte e os animais realmente se tornam parte da família de seus tutores. “Eles são tratados no sentido de cuidado e de zelo, mas parte das pessoas ainda não entendem essa relação porque vivemos em uma sociedade de muitos conflitos. Temos que entender que, para parte das pessoas, o vínculo social é justamente o pequeno animal”.

Falando sobre luto, o psicólogo destaca que esse processo pode ocorrer já nos momentos finais do animal, quando há o diagnóstico de uma doença, por exemplo. E ações como a eutanazia envolvem um sofrimento enorme.

“As clínicas e profissionais estão preparadas para humanizar esse processo, mas para o tutor e algumas pessoas que se intitulam pais de seus pets é muito sofrimento, é uma angústia diante da tomada de decisão. Isso porque seu pequeno animal foi um grande amigo, um parceiro em momentos agradáveis e difíceis, existiu uma convivência diária”.

E é nesse momento da perda que o sofrimento é multiplicado quando grande parte dos tutores sente que não podem compartilhar os sentimentos. “É ainda pior porque muitos sofrem sozinhos nessa angústia”.

Aqui entra o grupo de apoio ao luto coordenado por Reis, um espaço que acolhe as mais variadas situações. “Nosso grupo é diversificado porque o luto é relacionado à perda de algo significativo para nós como um amigo, um pai, um irmão, assim como um objeto, a amputação de um membro, uma mudança, o luto pelo divórcio, pela separação dos pais e também pela perda do seu pet”, completa.

Aberto ao público, o grupo tem encontros aos sábados, das 14h às 16h30min na unidade 6, ao lado da Biblioteca Central a UFMS. Não é necessário se inscrever.

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