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Conversa de Arquiteto

Arquiteturas paulista e carioca formaram identidade urbana de Campo Grande

Ângelo Arruda | 19/10/2016 13:00
Vista aérea do Parque dos Poderes.
Vista aérea do Parque dos Poderes.

Nos anos 1970, a cidade de Campo Grande, já com mais de 130 mil habitantes, continuava apresentando altas taxas de crescimento demográfico. A riqueza econômica do sul do Estado de Mato Grosso, com a modernização da agricultura e da pecuária em curso, contribui para a continuidade da verticalização da cidade.

Dessa vez são as incorporações dos edifícios da empresa Construmat Engenharia Ltda, cujos projetos, em sua grande maioria, foram elaborados pelos Arquitetos Celso Costa e Eudes Costa tais como os edifícios Gemini, Concorde, Polaris, Vanguard e Apolo, todos com 12 ou mais pavimentos.

O escritório Celso e Eudes Arquitetos Associados projeta, ainda nessa década, outros edifícios importantes, sendo um deles o Hospital da Santa Casa de Misericórdia, com 600 leitos, o maior da região Centro-Oeste, além do Hospital Pró-Matre e as sedes das instituições de ensino da Moderna Associação Campo-grandense de Ensino – Mace e o Centro de Ensino Superior Prof. Plínio Mendes dos Santos – Cesup, atual Uniderp, estes últimos, edifícios de planta circular.

A arquitetura local ainda tem obras projetadas por arquitetos residentes em outros Estados do país, destacando-se o Edifício Sede do INSS, projetado em 1970 por Carlos Henrique de Oliveira Porto; o Colégio Joaquim Murtinho de Nilson Azevedo e Gustavo Arruda, de 1971; o Edifício das Repartições Públicas Estaduais – Erpe , atual Fórum da Comarca de Campo Grande , de Luís Paulo Conde e Flávio Marinho Rego, de 1972; a residência de Roberto Nachif, de Siegbert Zanetinni; a residência de Antônio Barbosa de Souza de João Batista Vilanova Artigas; o edifício de escritório das Centrais Elétricas de Mato Grosso onde funciona hoje o Museu de Arte Contemporânea, de Eurico Prado Lopes; os Edifícios Antares e Cosmos, de João Carlos Bross e Ricardo Leitner, todos de 1974, e a sede do Unibanco , projetada por Sidônio Porto, em 1978.
São ainda dessa década os projetos do Paço Municipal de Campo Grande , com a sede da Prefeitura e da Câmara de Vereadores , projetados por Ciríaco Maymone Filho em 1971; a Capela do Hospital São Julião, de Jurandir Santana Nogueira , de 1972; a agência central da Caixa Econômica Federal , de Hélio Baís Martins, de 1973 , a residência de Arnaldino da Silva, por ele projetada em 1976 e o Edifício General Etchengoyen, de Jurandir Santana Nogueira, profissionais residentes na cidade.

A arquitetura moderna já estava presente na cidade e em seus edifícios, projetados por arquitetos da cidade ou residentes em outros lugares. Com a difusão da arquitetura moderna, de origem paulista ou carioca, vai se formando a nova identidade da cidade que estava prestes a se transformar em capital do mais novo Estado brasileiro, Mato Grosso do Sul, criado em 1977 e instalado o governo em 1979.

A divisão do Estado de Mato Grosso alterou as relações econômicas, sociais e culturais da nova capital, Campo Grande. A atração pelo novo Estado, a riqueza oriunda da soja e do gado bovino, o centro do poder político estadual e a localização estratégica em relação a São Paulo trouxeram mudanças nas relações empresariais locais atraindo migrantes de todas as partes do país.

No Parque dos Poderes, centro político e administrativo do Estado, situado no setor leste da cidade, dentro de uma reserva ecológica com área de mais de 200 hectares, encontra-se um conjunto de edifícios públicos do ano de 1982, todos projetados por arquitetos locais: os blocos de Secretarias de Estado, de Alex Maymone da Silva e Jesus Edmir Escalante Ribeiro; a Assembleia Legislativa e o Tribunal de Justiça, de Jurandir Nogueira, Ângelo Marcos Arruda e Aldo Matsuda; o Centro de Convenções, de Rubens Gil de Camillo , Ricardo de Mello Spengler e equipe; o Clube dos Servidores Estaduais, de Sérgio Ferreira dos Santos, Deise Pavani e Osvaldo Siqueira Jr.; a Academia de Polícia , de Fayez José Rizk, Lauro Veloso Malaquias e Valter Cortez, além de uma obra não iniciada - a sede da Governadoria, de Lauro Malaquias, Fayez Rizk e Válter Cortez e o Tribunal de Contas, de Alex Maymone da Silva e Jesus Edmir Escalante Ribeiro.

Parque das Nações Indígenas.
Parque das Nações Indígenas.

A cidade, como capital do novo Estado, desenvolveu-se numa grande velocidade. A população dobrou de uma década para a outra atingindo mais de 280 mil habitantes em 1980, e apresentando fluxo migratório interno e externo intenso, aumentando a pressão no setor habitacional e nos serviços públicos.

Com o crescimento econômico e populacional e a expansão do sistema bancário nacional, a cidade atraiu capitais financeiros e, nessa década, diversas instituições construíram suas agências, todas projetadas por escritórios de outros Estados, principalmente das cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. São obras de arquitetura moderna, quase todas de expressão brutalista, com uso intenso de concreto aparente e vidro.

Em 1987, iniciam-se as obras do Shopping Center Campo Grande - do Grupo Ecisa, projeto do escritório Coutinho, Diégues & Cordeiro e a Avenida Afonso Pena, na sua parte mais leste, ganha um grande impulso comercial e urbanístico.

O crescimento descontrolado, provocado pelo crescimento, força a administração, em 1987, a criar a Unidade de Planejamento Urbano de Campo Grande - Planurb e o Conselho Municipal de Desenvolvimento Urbano - CMDU, órgãos que passaram a elaborar novas normas e discutir as propostas urbanísticas e arquitetônicas para a cidade.

A partir da segunda metade da década de 80, surgem as estruturas e os revestimentos metálicos na arquitetura da cidade, sinal da chegada da nova modernidade, com uso de materiais de alta tecnologia. Mas essa também foi a década da produção da habitação popular horizontal e vertical devido às facilidades de financiamentos para o setor público e privado, o que beneficiou as famílias de renda média e baixa. Mais de 5.000 unidades residenciais foram construídas entre 1984 e 1990, através de sistemas de crédito, entretanto com poucas soluções arquitetônicas criativas.

Nos anos 90, a cidade já com 518 mil habitantes, ocorre diminuição das taxas de crescimento econômico e populacional de Campo Grande para 2% ao ano provocada pela desaceleração do desenvolvimento econômico ocorrido em meados da década anterior. O setor público, principalmente o estadual e municipal, grande empreendedor da arquitetura campo-grandense, passa a adotar uma política de desenvolvimento de arquitetura dos parques, praças, jardins e urbanização de avenidas, bem como alguns projetos arquitetônicos isolados.

Quanto aos parques e praças cabe destacar o maior de todos, o Parque das Nações Indígenas, localizado entre as Avenidas Mato Grosso e Afonso Pena , com mais de 119 hectares de área , dentro do perímetro urbano. Seu Plano Diretor de Ocupação foi elaborado pelo Escritório Arquitetura A3, que também fez a revitalização da Praça Ary Coelho e o conjunto arquitetônico interior abriga os projetos do Museu de Arte Moderna, de Emmanuel de Oliveira; a Concha Acústica, de Ronaldo Gondim e Mário Sérgio Sobral Costa ; o Restaurante do Parque, da Arquitetura A3; o Museu do Índio e de História Natural , de Eduardo Fachini e Élvio Garabini, além da sede da Polícia Florestal, de Rubens Fernando de Camillo e a sede Administrativa, de Jesus Edmir Escalante Ribeiro.

Horto Florestal.
Horto Florestal.

O Parque Florestal Antonio Albuquerque, conhecido como Horto Florestal de Campo Grande - obra de urbanização e de paisagismo do espaço urbano onde José Antônio Pereira, em 1872, construiu seu rancho ao chegar em terras de Campo Grande - de autoria de Élvio Araújo Garabini, é um dos mais importantes da cidade tanto pela localização quanto pelo sítio histórico.

Os elementos simbólicos em forma de “Y“ usados nas peças de tijolo aparente em pórticos , representam a junção dos córregos Prosa com o Segredo, surgindo um terceiro, o Anhanduizinho.

Palácio Popular da Cultura.
Palácio Popular da Cultura.

Ao tempo em que praças e parques ganhavam espaço na paisagem, o Governo do Estado edificava duas importantes obras de arquitetura na década de 90: o Palácio Popular da Cultura (Foto 28), antigo Centro de Convenções e a sede da Rádio e Televisão Educativa do Estado, a TVE/MS, ambas localizadas no Parque dos Poderes.

A primeira, de autoria de Rubens Gil de Camillo e equipe, é projeto dos anos 80. A obra foi paralisada em 1982 e retomada em 1992. É um projeto que usa amplos espaços fluídos, cercado pela vegetação da reserva florestal que entorna o Parque dos Poderes e emprega o concreto aparente em todas as fachadas. O programa inicial foi alterado para atender a nova demanda de um Centro de Convenções. Com isso, o projeto foi modificado sem perder as características arquitetônicas originais.

A segunda obra é um projeto de adaptação de uma estrutura originalmente destinada a um ginásio de esportes para os servidores públicos estaduais, dos arquitetos pernambucanos Roberto Montezuma, Kátia Avelar e Glícia Fernandes. Sua torre de alvenaria armada autoportante, com quase 100 metros de altura, explorando um desenho de cheios e vazios necessários ao projeto estrutural , foi calculada pelo engenheiro Ariel Valmaggia e edificada utilizando-se a técnica construtiva empregada pelo engenheiro uruguaio Eládio Dieste, e é hoje um marco da arquitetura local.

Avenida Afonso Pena.
Avenida Afonso Pena.

Diversos edifícios de arquitetura moderna e contemporânea foram erguidos no século XX em Campo Grande, em função de diversos fatores, especialmente após a sua condição de capital do novo Estado de Mato Grosso do Sul, a fronteira econômica pujante, a chegada de novos arquitetos e a diplomação de outros pelos cursos de arquitetura e urbanismo que se formaram por aqui.

A coleção de obras é imensa e retrata a nossa inserção nacional em todos os momentos, não apenas na arquitetura histórica, como retrata este texto mas, especialmente, a arquitetura voltada para novos programas como os comerciais e os de lazer.

A Avenida Afonso Pena, nosso cartão postal maior, detentora de um traçado que liga o leste ao oeste da cidade, do Parque dos Poderes ao Aeroporto, se mantém como nosso mais importante espaço urbano, nesses mais de 100 anos de sua existência e junto com ela, a força de novos empreendimentos residenciais e comerciais e outros institucionais, como o Aquário do Pantanal, obra do arquiteto Ruy Ohtake, que até o presente momento não foi concluída, mas que marca e registra um novo capítulo dessa arquitetura de Campo Grande, tão completa em estilos e carregada de importantes signos de memória que aqui registradas, comemorando mais um aniversário de sua emancipação.

Parabéns Campo Grande!

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