De queijo à acarajé, festa leva mais de cinco mil pessoas para Rochedinho
Com variedades de queijos produzidos com leite de vaca e cabra, além pastel, carreteiro, doces, espetinhos, maça do amor e até acarajé, a quarta edição da Festa do Queijo ocorreu ontem (11) e levou mais de cinco mil pessoas para o distrito de Rochedinho, a 31 quilômetros do centro de Campo Grande. A rua Guia Lopes, a principal da região, foi parcialmente interditada para o evento que, além d emuita comida, teve show do grupo Tradição, Tostão e Guarany e divulgação da a programação do Arrial de Santo Antônio da Capital. Ao todo, foram 32 barracas servindo desde às 16h.
Do sítio Harmonia, Carlos Caitan levou queijo de leite de cabra, produzido há sete anos. "O sítio é dois quilômetros de Rochedinho. Faz nove anos que moro no local e faço queijo. Tenho do tipo boursin que é mais mole e o frescal que é o de Minas. Tem ainda o curado e requeijão. É a quarta vez que participo da festa", conta.
Ele lembra como o evento se tornou tradição no local. "Começou com o padre Alfreu. A gente precisava trazer alimento do sítio para a comunidade. Mas, toda vez que vinha alguém de fora, ele oferecia queijo e rapadura. Daí teve a ideia de fazer a festa para trazer renda a localidade. As duas primeiras ocorreram com a realização dele. Depois entrou a Sectur (Secretaria de Cultura e Turismo) de Campo Grande. Contudo, o padre já não está mais aqui", disse.
O produtor comenta que se mudou para o sítio em busca de qualidade de vida. "Trabalho em Campo Grande, mas moro aqui. Pensei em mudar de rotina e virou um negócio. Tenho queijos condimentados com ervas e pimenta rosa, que fica um pouco mais ácido por conta da conserva". Carlos fala ainda sobre os benefícios do queijo produzido com o leite de cabra. "É mais saudável e a digestibilidade é mais rápida. Possuir maior teor de cálcio e menor teor de colesterol, tem vitima A e B".
Na exposição, 11 barracas eram de produtores de queijos que comercializaram a mercadoria a partir de R$ 20. Em outras 16 barracas, os visitantes encontravam maça do amor, algodão-doce, doces em geral, espetinhos, pastéis, carreteiros, bebidas e outros. O que não faltou foi opções para os visitantes, que poderia encontrar produtos em conserva preparados por alunos do curso agrícola do distrito.
A professora de práticas agrícolas e zootécnicas de Rochedinho, Rosana Aparecida ficou responsável pela exposição dos produtos feitos pelos estudantes. São 170 alunos que produziram doces, queijos, conservas e manteiga nas aulas práticas e contaram com sua ajuda.
"Produzimos as verduras, faço o derivados do leite com eles. Aqueles que estão no terceiro ano mexem com a produção de conserva de ovo de codorna. Temos uma cozinha experimental onde produzem e realizam várias aulas por semana. Fazemos o queijo temperado com orégano, pimenta calebresa e ervas finas, além de manteiga temperada com ervas desidratadas", conta.
Na conserva, os alunos colocam brócolis, cenoura, jiló, batatinha, gengibre, couve-flor, etc. "Também fazem doce de abóbora, mamão e geleia de pimenta. As frutas são trazidas da região porque os estudantes moram em fazendas onde têm muitos frutos. Para a conserva usamos apenas o sal e o açúcar. O queijo é tradicional aqui porque os produtores rurais fazem muito, inclusive sou produtora e vendo queijos na minha chácara a 20 anos", revela.
A produtora de queijo Irenete Ferreira saiu de Campo Grande para participar pela primeira vez do evento. Ela faz parte da Associação de Vendedores e Produtores e Queijo que existe há 15 anos na Capital. "Antes vendia leite no tambor, mas uma normativa me fez parar com o leite e todas as familias que trabalhavam com isso se uniu e montou a associação", relata.
"É uma fábrica de laticínio que fica no bairro São Conrado de Campo Grande. Temos o queijo frescal, o nozinho. O leite para a produção dos queijos vem de Sidrolândia, de um pessoal da agricultura familiar. Pra fabricar a mussarela demora cinco dias porque tem que colocar na qualhada, depois decantar, passar na máquina e vai pra salga. Trouxe 30 queijos, 20 manteigas e 20 doces", conta.
Apesar da festa ser voltada ao queijo, a Zezé do Acarajé resolveu participar um prato diferente. Vestida de baiana e sorridente, ela que mora em Campo Grande e esteve no evento onde preparou o seu famoso acarajé. "Esse é o terceiro ano que venho na festa. Trouxe esse prato e sempre vendo tudo. Tem o Vatapá com castanha de caju, amendoim, leite de coco", disse.
Para quem não conhece o prato, ela explica. "É um bolinho de feijão frito no azeite de dendê, recheado com vatapá e camarão. Trabalho a oito anos com essa receita na Orla Morena de Campo Grande. Me visto a caráter porque a baiana do acarajé foi a primeira mulher negra empreendedora do Brasil, que vendia o prato há 400 anos para comprar a alforria. Sou neta de ex-escravos e tenho a história da baiana".
Curso - Para conseguirem uma barraca, os expositores precisaram realizar um curso de manipulação de alimento para pequenos produtores, em Campo Grande. A secretária adjunta da Sedesc (Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico e da Ciência Tecnologia), Mara Bethânea fala sobre o assunto. "Cadastramos todos os pequenos produtores locais e trouxemos vários laticínios da Capital. Foram mais de 25 expositores, essa é edição foi estruturada de forma diferente e queremos fomentar a produção de queijo da região", afirma.
A nutricionista, Priscila Souza está se especializando em engenharia de alimentos e participa da equipe Forc (Centro de Pesquisa de Alimentos), que é um grupo de estudo da USP (Universidade de São Paulo), e faz pesquisa sobre queijos artesanais. Ela também esteve no evento e conversou com vários produtores locais sobre a produção de laticínio.
"Meu pai é produtor de queijo e vi essa necessidade de continuar pesquisando sobre o tema. Atuamos na área mais de 25 anos. Ele começou a produzir em São Gabriel do Oeste e levava para Campo Grande e até hoje temos muitos parceiros. O queijo caipira já é reconhecido como queijo artesanal e isso é um passo que valoriza o produto. Tem produtores que me procuram para regulamentar o queijo deles e participam do projeto que é mapear a flora microbiana da mercadoria no Estado, para formular um padrão de até onde esse microorganismo prejudica quem consome", conta.
"Hoje não temos padrão específico para a fabricação de queijo, usamos o da indústria, porém é um produto artesanal. O queijo é minha fonte de renda, me formei com a produção dele. No Estado temos costume de consumir esse produto na forma natural ou nos pratos típicos como sopa paraguaia, pão de queijo e o pastel de queijo", disse.
Evento - A Festa do Queijo movimentou o distrito e levou ciclistas que pedalaram de Campo Grande até o local. "Em 2018 realizamos uma pedalada e descobrimos que tinha a festa e nesse ano organizamos o Pedal do Queijo para prestigiar a programação. São mais de 200 ciclistas entre crianças e adultos. A Polícia de Trânsito, Guarda Civil Metropolitana, Polícia Rodoviária e o Corpo de Bombeiros nos acompanhou nessa rota", disse o organizador da pedala, o bombeiro Joilson de Paula.
Da terra - Antônio Francisco Santana, 64, conhecido como "Nuquente" mora em Rochedinho desde 1969 e é um baú vivo de história da cidade. "Aqui começou pequeno e foi expandindo. Quando cheguei era estrada de chão, e trabalhei por mais de 20 anos em uma fazenda da região. Gosto do distrito porque é tranquilo e não penso em sair. Ao redor temos mais de 30 produtores de queijo. Temos que valorizar a nossa terra", afirma.
Ele explica o motivo do nome de Rochedinho. "É porque era só rocha e mato, não tinha muita coisa. Quando vim morar pra cá havia cerca de 30 casas, mas depois evoluiu. Essa festa movimenta a nossa região e ajuda no comércio", fala.
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