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Sabor

Doce de Carlos Drummond, pé de moleque faz família se emocionar nas lembranças

Paula Maciulevicius | 09/03/2017 07:27
Helena, na terceira geração de uma família mineira que mata as saudades do doce de Piranguinho.
Helena, na terceira geração de uma família mineira que mata as saudades do doce de Piranguinho.

Nas mãos da pequena Helena, de 5 anos, está o doce que faz a família dela todinha voltar no tempo. O pé de moleque da "Barraca Vermelha" levava os avós, mãe e tios até a cidade de Piranguinho, na Serra da Mantiqueira, no Sul de Minas Gerais, em todas as férias. E é para lá que hoje, décadas depois, o sentimento retorna. Da prateleira de um café em Campo Grande, o pé de moleque traz consigo uma memória afetiva para quem é mineiro, que chega a ser difícil descrever em palavras.

"É realmente uma coisa muito tradicional da região. Nós íamos sempre no final de ano, nas férias, passávamos este tempo com a família reunida e tinha um tio, o Zé Roberto, era o tiozão que colocava a criançada no carro para comprar pé de moleque", conta a professora Suely Antunes Ribeiro, de 61 anos, avó da menina Helena.

A família é de Itajubá, cidade que fica a 11 quilômetros de Piranguinho, coisa de 15 minutos de carro, mas deixou de residir lá ainda na década de 70. As viagens de férias daquela época têm até hoje o sabor do pé de moleque. "As crianças amavam esse passeio. Era muito divertido. Quando vimos o doce aqui, surpreendeu. Porque você vê uma coisa que faz parte da infância, tão distante...", narra Suely.

Helena come o doce que a mãe, os tios e os avós viajavam para matar as saudades.
Helena come o doce que a mãe, os tios e os avós viajavam para matar as saudades.

A cada ida, era preciso trazer um estoque para a família e amigos mais próximos, que conheciam a fama do melhor pé de moleque do mundo. Com o tempo, as crianças cresceram, as viagens ficaram menos frequentes e a saudade chega a encher olhos e a boca d'água.

"O gosto continua exatamente o mesmo e é de emocionar. É saudade, é família, é tudo o que é valioso para a gente. Traz muita recordação, essas memórias que a gente tem e não consegue mais, que é reunir a família e partilhar tudo isso de novo", descreve a avó.

De Piranguinho, quem não mexe com pé de moleque, tem alguém na família que produz. A economia da cidade gira em torno do doce que começou com a "Barraca Vermelha" em 1936, com dona Matilde Cunha Torino. A história tem de belo o que o doce tem de bom. Mulher do então chefe da estação de trem de Piranguinho, para ajudar nas finanças da família que ela passou a fabricar o doce de forma caseira e a vendê-lo dentro dos trens de passageiros. E a fama correu os trilhos e vagões.

"Ela vendia num tabuleiro, depois aquele tanto não dava mais e então, dona Matilde fez uma barraquinha vermelha do lado de fora e ficou conhecido assim", conta Karina Beltrão, proprietária da Casa Beltrão, que comercializa aqui o doce.

Carta de Carlos Drummond de Andrade elogiando o pé de moleque como a verdadeira joia mineira.
Carta de Carlos Drummond de Andrade elogiando o pé de moleque como a verdadeira joia mineira.

Karina não é mineira por acidente. Filha de mineiros, os irmãos antes dela ainda nasceram por aquelas bandas, só ela que não. Desde que abriu a casa como um cantinho mineiro em Campo Grande, ela traz na coletânea doces de lá para matar as saudades de quem vive aqui.

"E hoje este pé de moleque já é a neta dela quem toca e na cidade, já tem barraca amarela, azul, de outras cores...", brinca Karina. Na loja, ela faz questão de colocar que o doce era o preferido de Carlos Drummond de Andrade, fazendo jus à propaganda original. No site da "Barraca Vermelha", há uma carta digitalizada atribuída ao poeta. "Ele chegou a escrever que aquela era a verdadeira joia mineira", enfatiza Karina.

A dona do café está acostumada a ver reação como a da família de dona Suely. "Muitos mineiros vêm aqui e falam: 'meu Deus do céu, olha o doce de Piranguinho' e toda vez que chega o pé de moleque, a gente tem que ligar para eles", relata.

Como não tem conservantes, o doce vem em pouca quantidade e costuma acabar logo. "Uma senhora veio aqui uma vez e disse que era o doce que o namorado levava para ela. Eles já têm mais de 50 anos de casados e ela chorou de felicidade, dizendo que compraria para levar para ele".

A Casa Beltrão fica na Rua Cassilândia, 34, no bairro Autonomista. Mas também dá para pedir do pé de moleque que faz mineiro se emocionar pela internet.

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Na loja em Campo Grande, outros produtos da linha da "Barraca Vermelha" também estão à venda. (Foto: Alcides Neto)
Na loja em Campo Grande, outros produtos da linha da "Barraca Vermelha" também estão à venda. (Foto: Alcides Neto)
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