Comunidades e produtores que cuidam do Pantanal podem preservar U$ 60 bi
Número foi apresentado em evento que contou com a participação do doutor em ecologia da Unesco
Comunidades que contribuem com "serviços ecossistêmicos" no Pantanal podem garantir a preservação de U$ 60 bilhões em terras por cuidar do ambiente. Manejo das águas em tempo de cheia ou medidas contra incêndios florestais são alguns exemplos. É o que apontou a pesquisa desenvolvida pela Wetlands International Brasil, apresentada nesta semana durante evento em Campo Grande. O evento "Conexão das Águas" faz parte do Programa Corredor Azul e propõe uma alternativa para a preservação das áreas úmidas no bioma pantaneiro.
A ideia é que os produtores rurais, prestadores de serviços, comunidades tradicionais e povos indígenas recebam subsídio ambiental pelos serviços prestados na terra, que impactam toda a sociedade. O programa é uma proposta feita pelos pesquisadores Fábio Bolzan (Wetlands International Brasil), Romullo Louzada (Imasul) e Fábio Roque (UFMS).
Tudo o que a propriedade oferece de benéfico ao meio ambiente, como por exemplo: água de qualidade, “ar limpo”, biodiversidade presente e espécies que contribuem diretamente com ecossistema, ajudam a conservar o "valor" desse ecossistema.
O evento contou com a participação do doutor em ecologia Karl Mathias Wantzen, que participa da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) e atua como professor na Universidade de Tours, França. Ele ministrou a palestra “Cultura Fluvial – Vida como uma dança ao ritmo das águas", em que pontuou a importância da preservação de rios, a variação das águas no mundo e citou o Pantanal.
Sobre PSA (Pagamentos por Serviços Ambientais), Bolzan explicou ao Campo Grande News que o objetivo é conectar pessoas. De forma prática, aqueles que possuem atividades econômicas no Pantanal podem receber por utilizar os recursos em prol da população.
“Por um lado temos o provedor, que é quem vai receber os recursos financeiros, e do outro lado tem os pagadores. Quem fornece recebe e quem consome paga. Isso seria, por exemplo, o caso da pessoa que antes produzia gado, mas agora, com a inundação das áreas, presta o serviço de filtragem dessa água que está na propriedade dele, então receberia por esse serviço prestado”, disse.
Valor - Os pesquisadores estimaram o valor dos SE (Serviços Ecossistêmicos) utilizando como base no Uso e Ocupação do Solo (gramíneas, florestas, áreas úmidas, agropecuária) e atribuindo valores dos SE para cada tipo de Uso e Ocupação do Solo. Na tabela esquematizada pelos estudiosos, cuidar das áreas úmidas poderiam garantir valor de até U$ 15.393.772, enquanto das pastagens asseguraria U$ 50.562.588 em recursos.
Bolzan revelou que a pesquisa indica que o valor dos SE das terras do Pantanal é muito maior do que o atualmente reconhecido pelo mercado, sociedade, formuladores de políticas e tomadores de decisão.
No Pantanal "o valor dos SE superaram significativamente a região do Planalto (em média 62% contra 38% respectivamente). Sob a ótica das atividades antropogênicas (interferência do homem), 89% do valor líquido total é do planalto". Mas por outro lado, se considerarmos a contribuição dos ecossistemas naturais, o planalto representa 32% e o pantanal 68%, detalha o documento.
“Apesar disso, não há valor real de mercado para a terra, pois não há políticas públicas nem mercado para os múltiplos valores dos SE. Estes achados abrem uma importante janela de oportunidade para se discutir o uso e ocupação da terra e as políticas públicas".
O documento ressalta que a região possui potencial considerável para conciliar conservação e produção de alimentos, incluindo programas de restauração, pagamentos por serviços ambientais, certificações e mecanismos de compensação ambiental.
Entretanto, apesar de inovador, o projeto assume que o fruto desse subsídio ainda precisa ser estudado pelo poder público. André Borges Barros Araújo, diretor-presidente do Imasul (Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul), acredita que a diretriz apontada pela pesquisa é viável e funcionaria, como a PSA feita na Serra da Bodoquena.
Ele é um indicativo de que é possível fazer o PSA no Pantanal em áreas úmidas. Aqui está dando as diretrizes, se o governo entender que cabe, a gente traz. O mais importante é discutir a fonte do financiamento. Essa metodologia é muito bem definida e pode ser aplicada, basta agora discutir os outros aspectos”, disse André Borges.
Entre os fatores que precisam ser discutidos estão a seleção dos beneficiários e os agentes fiscalizadores. “O principal é fazer uma metodologia de quanto vale aquilo. Quanto vale uma árvore em pé, quanto vale uma área alagada, é muito abstrato, mas eles fizeram isso na pesquisa”, acrescentou.
Unesco - Karl Mathias Wantzen, doutor em ecologia, que dirige a cátedra Unesco “Rios e Patrimônio" e atua como professor na Universidade de Tours, França, disse que a PSA apresentada seria uma possibilidade para a preservação ambiental.
“Temos que compensar as atividades desenvolvidas no Pantanal em larga escala e os danos causados. É o que o PSA fala. Isso poderia compensar essa diferença com um selo de qualidade”.
Para o pesquisador que trabalha há 30 anos com o tema Pantanal, é necessário encontrar formas de uso sustentável que não correspondam a uma exploração dos recursos naturais. Entre as soluções apontadas estão a agricultura sustentável e o turismo. “Temos que estabelecer níveis de qualidade para o turismo e produção. Realmente ser sustentável, muitas pessoas falam que são, que o serviço é, mas não são”.
"A implementação em larga escala de Pagamentos por Serviços Ambientais (PSA) é improvável no Pantanal no curto prazo, devido ao baixo nível de consciência ambiental entre os tomadores de decisão e baixos níveis de suporte financeiro", admite a pesquisa.
Mas os especialistas defendem que "o financiamento misto, envolvendo dinheiro público e privado de várias fontes é visto como uma forma de aumentar as chances de sustentar um projeto"
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