Tempo seco e falta de fiscalização são combustíveis para queimadas na Capital
Incêndios geram preocupação por conta de risco à saúde; pela cidade, há terrenos sem manutenção adequada
Fiscalização da manutenção correta não chega a todos os terrenos baldios de Campo Grande e algumas áreas da cidade têm registrado queimadas, nos últimos dias, intensificadas por conta de questões climáticas.
O fogo atinge vegetação seca, como o capim-gordura, que possuem alta chance de proliferação das chamas, e geram preocupação aos moradores nas proximidades, seja pelo incômodo e até problemas de saúde.
Na noite de ontem, terreno de grande extensão na Avenida Cônsul Assaf Trad, entre as ruas Alcindo Gasparini e Emandina Silveira Reiche, pegou fogo. Paramentados com balaclava, abafadores e bombas costais, militares contiveram as chamas que já se alastraram por um perímetro de aparentemente 100 metros quadrados.
Há menos de uma semana, incêndio que começou na quinta-feira (21) destruiu cinco barracos e cerca de 20 hectares de vegetação de uma fazenda ao lado do acampamento Zumbi dos Palmares, às margens da BR-262, próximo a região do porto seco, em Campo Grande. Bombeiros foram acionados e, ao menos, quatro mil litros de água foram utilizados.
Perigos - De acordo com o médico pneumologista Ronaldo Queiroz, a fumaça e fuligem originadas das queimadas podem “agravar uma situação já muito difícil, que é a baixa umidade. “O ar seco já provoca irritação das vias aéreas, por conta da ausência de chuvas e a atmosfera ainda recebe fumaça de queimadas, geralmente na própria cidade ou do entorno.”
Conforme o Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia), a umidade relativa do ar deve atingir níveis críticos em Campo Grande nesta semana, beirando os 20%, abaixo da recomendação da OMS (Organização Mundial da Saúde).
Segundo Queiroz, a fumaça provoca irritação nas vias aéreas superiores e inferiores - que incluem boca e nariz, além dos brônquios, por exemplo. “Isso possibilita o surgimento de problemas respiratórios. Os mais comuns são os infecciosos, seja pelo ressecamento da mucosa nas vias superiores, garganta e brônquios, e facilita doenças virais como gripe e resfriado comuns.”
Isso ocorre com muita frequência e é a causa de estarmos com prontos socorros e unidades de pronto atendimento, públicas e privadas, com contingente muito grande, além de pacientes com problemas respiratórios, especialmente idosos e crianças”, diz o pneumologista Ronaldo Queiroz.
Sobretudo a pacientes que têm ou tiveram doenças alérgicas como asma ou bronquite, o médico explica que o ar seco e fumaça agridem com ainda mais força as vias aéreas, com risco de “crise de rinite e asma brônquica”.
De acordo com dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), o município de Campo Grande registrou 604 focos de incêndio neste ano. No mesmo período, do ano passado, foram 763 focos e em 2020, o órgão federal mapeou 697.
Cuidados - A aposentada Evilazia Malaquias de Souza, de 67 anos, relata que presenciou queimada na manhã de ontem, em terreno aos fundos da própria casa, enquanto lavava roupa. "Eu estava lavando uma roupa e precisei tirar correndo do varal. O fogo foi alto e fiquei com medo de chegar na casa que fica no fundo.”
Como forma de prevenção, a proprietária faz a limpeza em volta do terreno para evitar a entrada do fogo, os chamados "aceiros". "Desta forma o fogo chega só até onde tem mato e apaga, antes de atingir o muro", explica Evilazia.
“O pessoal tem jogado muito lixo, meu neto já teve dengue e ficou bem mal com a fumaça. Eu já tenho problema respiratório e nesse período fica pior. Antes de pegar fogo, tinha uns aparelhos de TV jogados aí e também muito vidro, mas a prefeitura não dá uma pressão nos donos do lotes”, opina a moradora.
“Com relação ao cuidado ao tempo seco, é muito difícil controlar”, diz o pneumologista Ronaldo Queiroz. Ele ressalta que quem não tiver umidificador de ar, em casa, pode colocar vasilha de água sob a cama ou toalha úmida na janela, sobretudo no quarto, onde as pessoas passam parte do dia, durante o sono.
“Além disso, tomar muito líquido e garantir uma boa hidratação, com dois a três litros de água por dia e aplicar soro fisiológico comum nas narinas, várias vezes, com spray ou seringa. Tudo isso ajuda a umidificar as vias aéreas e diminuir reações agressivas da fumaça.”
A auxiliar administrativa Liliane de Cássia Ferreira, de 25 anos, mora na Rua Rebouças, no Bairro Nova Bahia, e é mãe de dois garotos - Arthur e Kauã, de 4 e 7 anos. Residindo entre dois terrenos baldios, ela reclama que os incêndios “incomodam mesmo”, por diversos fatores.
"Não é questão só das roupas no varal, a fumaça entra dentro de casa. As pessoas colocam fogo e, com esse tempo seco e vento, fica mais propício. Por ser uma região bastante arborizada, cai bastante folhas.”
Ela ressalta que um dos lotes está em obras, atualmente, e espera que a situação possa melhorar. “Agora que estão construindo em um deles, melhorou. Prejudica como um todo, principalmente a saúde das crianças.”
Fiscalização - Procurada, a Semadur (Secretaria Municipal do Meio Ambiente e Gestão Urbana) informa que, rotineiramente, vistoria imóveis e lotes em todos os bairros da Capital, como forma de cobrar os proprietários pela manutenção correta. “Uma vez identificado um lote urbano sujo ou uma calçada em mau estado de conservação, o proprietário é notificado para realizar a correta manutenção.”
Segundo a pasta, essa notificação é enviada por meio de AR (Aviso de Recebimento), pelo Correios, e o proprietário tem o prazo de 15 dias úteis para o cumprimento, conforme Código de Polícia Administrativa do Município, instituído pela lei de número 2909. “Após o prazo, o auditor fiscal da Semadur retorna ao local para vistoria, caso não tenha sido cumprida a notificação, o proprietário então é multado.”
Na Capital, a multa nestes casos varia entre R$ 2.727,50 e 10.910,00 para terrenos baldios e R$ 27,28 por metro de testada em relação a má conservação da calçada.
A prefeitura informou que, entre janeiro e junho de 2022 foram emitidas 1.539 notificações e 258 multas por não limpeza de terrenos. Denúncias podem ser feitas por meio do telefone 156 ou aplicativo Fala Campo Grande.
Em situações de emergência a orientação é para que os moradores acionem o Corpo de Bombeiros pelo 193. Para denúncias sem flagrante, o telefone é o 156 e com flagrante no 153 (24h). Para incêndios na zona rural o contato é o 190.