Ao extremo, calor e chuva produziram imagens que assustaram Mato Grosso do Sul
Ainda mais sob a influência do El Niño, que impactou também o Pantanal
Nunca a gente sentiu tanto na pele os efeitos do tal aquecimento global. Dentro da redação, o ar-condicionado ajuda, mas na hora de correr as ruas atrás de reportagens, jornalista sofre. Se bem que, neste ano, ninguém se salvou do calorão. O corpo ferveu e as cidades também, de Campo Grande ao Pantanal, o fogo foi generalizado, no sentido literal.
Calor excessivo foi a sétima palavra mais buscada no Google em 2023. E quantas vezes você reclamou dele este ano? Provavelmente, foi bem mais do que nos anos anteriores.
Em Água Clara, cidade de Mato Grosso do Sul que saiu na dianteira da lista das mais altas temperaturas de todo o Brasil, os 40ºC já eram superados em setembro. Naquele mês, o Campo Grande News ouviu de recepcionista de hospital a vendedora de água que calor assim nunca se sentiu.
Nos períodos em que as máximas chegaram a ficar até 5°C acima do normal, chamados de ondas de calor, outros municípios do Estado seguiram dominando o ranking dos mais quentes do país produzidos pelo Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia).
A maior temperatura do ano em Mato Grosso do Sul até então foi registrada nos termômetros de uma das cidades pantaneiras do Estado, em novembro:
Se for falar em sensação térmica, vale destaque para a também pantaneira Coxim, que pode ter atingido os 45ºC:
Nesse cenário, a desigualdade social gritou alto. Enquanto uns reclamavam de receberem fatura de energia mais cara por conta do ar-condicionado, outros sentiram o drama que é viver debaixo de barracos de zinco e lona extremamente quentes. Alívio vem só do céu quando chove, mas não muito forte, que é para a estrutura improvisada não ir abaixo.
Temporais - Eles causaram inúmeros transtornos este ano e uma tragédia em Corumbá. Rajadas de vento que acompanharam a chuva forte derrubaram a cobertura metálica da quadra de esportes de uma escola, que atingiu um estudante de sete anos e provocou sua morte.
Em Campo Grande, o caos se formou com inúmeras árvores caídas, ruas interditadas e alagadas, semáforos inoperantes e bairros sem energia elétrica.
Produtora de suínos para abate do município São Gabriel do Oeste teve um imprevisto financeiro milionário causado pela fúria de uma tempestade:
O tamanho do granizo que caiu em 2023, inclusive, foi recorde:
Taquarussu teve até tornado antes de fortes chuvas caírem. Felizmente, não houve estragos. Veja no vídeo:
Bioma em alerta - O Pantanal teve outubro e novembro de incêndios difíceis de controlar. A área queimada em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso até agora é superior a 1,1 milhão de hectares, segundo o Lasa-UFRJ (Laboratório de Aplicações de Satélites Ambientais da Universidade Federal do Rio de Janeiro). Os satélites viram:
Em relação às cheias e secas, que são o marca-passo da vida no Pantanal e têm como guia o nível do Rio Paraguai, a porção do bioma em Mato Grosso do Sul registrou bastante água em 2023. Houve um recorde em relação aos últimos cinco anos.
Porém, a régua foi descendo mais rapidamente do que o esperado:
Segundo o pesquisador da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) em Corumbá, Carlos Roberto Padovani, isso se explica pelos efeitos do El Niño, fenômeno que provoca superaquecimento no Oceano Pacífico, e das mudanças climáticas, que têm ficado notáveis nas ondas de calor.
Aconteceu mesmo em um ano que pode terminar com chuvas na média ou acima dela na parte sul do bioma. "É que o El Niño acentua menos chuvas no Pantanal norte, em Mato Grosso, de onde vem os maiores volumes de água pelo Rio Paraguai", acrescenta. Como resultado, ele prevê cheias abaixo do esperado no ano que vem.
Mudanças climáticas - A ONU antecipou que 2023 pode ser o ano mais quente da história e alertou que medidas urgentes tomadas por chefes de Estado precisam controlar as mudanças climáticas.
Embora não tenha aparecido no topo da lista de pesquisas mais frequentes, o aquecimento global tem sido apontado por cientistas mundo afora para explicar o calor insuportável, as tempestades extremas e efeitos sentidos em biomas como o Pantanal. O El Niño se soma a elas.
Professor da Universidade Católica Dom Bosco, em Campo Grande, e presidente da Fundação Neotrópica do Brasil, o biólogo Kwok Chiu Cheung reforça.
Alguns insistem que não está havendo nenhum tipo de aquecimento, e que a elevação da temperatura da Terra causa só o aumento ou a sensação de mais calor. Na realidade, ela desregula vários eventos climáticos", começa.
Ele dá como exemplo o que aconteceu em Mato Grosso do Sul. "Você pode ter chuvas mais concentradas e muito fortes em um período especifico com ventanias e rajadas de ventos" ou, então, muito tempo de estiagem, cita.
"Quanto mais a gente desestruturar o ecossistema, mais tendemos a aumentar a regularidade com que esses eventos vão acontecer. Todos nós estamos constatando isso e, infelizmente, as pessoas que são mais necessitadas sentem mais", finaliza.
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