Dia internacional da proteção de dados: a importância para o Direito do Trabalho
A próxima sexta-feira (28) será marcada pelo Dia Internacional da Proteção de Dados, assunto cada vez mais frequente nas discussões jurídicas no país.
A data foi instituída em 26 de abril de 2006 pelo Comitê de Ministros do Conselho da Europa (CE), em homenagem à Convenção Europeia 108 de 28 de janeiro de 1981, o primeiro (e único) tratado internacional que tratou da proteção de dados pessoais.
Em uma primeira análise, o leitor pode crer que a intenção dos Estados, ao editar legislação de proteção de dados pessoais, guarda relação unicamente com a preservação da intimidade de seus cidadãos. Essa era, de fato, uma das preocupações: proteger a intimidade do indivíduo. Mas não era a única. E talvez sequer fosse a principal.
A questão da proteção de dados pessoais ganhou relevância nos últimos anos em razão, principalmente, da larga utilização da internet, mormente através de celulares, o que possibilitou, por parte de empresas, a colheita e o manuseio desses dados.
Ocorre que a utilização oculta dessas informações acarretou concorrência desleal, manipulação dos padrões de comportamento e até mesmo prejuízos à democracia, como constatado no caso “Cambridge Analytica”.
Tornou-se importante, portanto, um marco regulatório similar entre os países, mormente por conta dos desarranjos que a utilização massiva e indevida de dados pode gerar no comércio internacional. O país que não adotar uma legislação de proteção de dados causará prejuízos à competitividade de suas empresas no mercado externo.
Nesse contexto, após anos de discussão no Congresso Nacional, foi sancionada, em 14 de agosto de 2018, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei 13.709/2018).
A lei traz regramentos gerais que se aplicam a todas as áreas, inclusive nas relações de emprego, tema que suscita uma série de questões relevantes.
A primeira delas é a de que o empregador não deve se preocupar se o manuseio dos dados decorrer de obrigação legal A LGPD é clara quanto à legalidade da conduta do empregador neste caso (artigos 7º, II, e 11, II, b, da LGPD).
A título de exemplo, não há violação à LGPD quando o empregador que possui mais de 20 empregados colhe e armazena os dados referentes ao horário de trabalho do trabalhador, sendo desnecessário o consentimento formal deste último, já que isso decorre de obrigação legal (artigo 74, § 2º, da CLT).
Da mesma forma, é possível ao empregador armazenar dados como o CPF e os informações relativas aos dependentes do trabalhador a fim de efetivar sua filiação e manter seu cadastro atualizado no INSS (artigo 11, a e b, da LGPD).
Outros dados podem ser recolhidos pelo empregador independentemente de autorização do empregado se forem necessários para o exercício regular de direitos em processo judicial (artigos 7º, VI, e 11, II, d, da LGPD).
Exemplificando: o empregador pode armazenar os registros de produtividade do empregado já que tais documentos podem ser utilizados em eventual ação trabalhista na qual o trabalhador postule equiparação salarial.
Também é possível à empresa exigir do trabalhador dados que se destinam à proteção da vida ou da incolumidade física do titular ou de terceiros como, por exemplo, a companhia aérea que solicita aos seus pilotos a realização de exame toxicológico como forma de garantir a segurança dos passageiros e da tripulação (situação, aliás, já prevista nas normas da Agência Nacional de Aviação Civil).
Em todas essas hipóteses, entretanto, o empregador deve observar uma série de cautelas ao realizar o tratamento de dados do empregado.
A primeira é de que nenhum dado pode ser coletado do empregado sem que ele tenha conhecimento. O empregador não pode, por exemplo, instalar câmeras para colheita de imagens sem prévio aviso ao empregado (artigo 6º, I, da LGPD).
A segunda é a de que, ao coletar o dado do empregado, o empregador deve informar qual é a finalidade do tratamento do dado (artigo 6º, I, da LGPD), sendo certo que o dado deve ser utilizado exclusivamente para a finalidade informada.
Por exemplo: a empresa requisitou o número do celular do candidato à vaga, afirmando que tal dado seria colhido para fornecer informações sobre o processo seletivo, mas, em vez disso, envia a ele propagandas dos produtos que comercializa.
Outra observação importante é o de que a empresa deve coletar do empregado apenas os dados estritamente necessários (artigo 6º, III, LGPD). Não há qualquer necessidade, a título de exemplo, de submeter um auxiliar de escritório a exames toxicológicos. Situação distinta ocorre com o motorista profissional, cuja realização do exame se mostra necessária, tendo, inclusive, previsão legal (artigo 168, § 6º, da CLT).
Da mesma forma, em eventual processo seletivo, dados relativos à orientação sexual do candidato, por exemplo, em nada serão importantes na seleção e, portanto, não devem ser solicitados, por serem desnecessários.
Enfim, são inúmeras as situações nas quais a LGPD incidirá na relação empregatícia, não sendo possível enumerar todas elas neste texto.
Como se trata de uma lei geral, os conceitos utilizados são genéricos de modo a abranger o maior número de situações possível. Desta forma, as situações acima narradas são meramente exemplificativas.
(*) André Luis Nacer de Souza é juíz.
Os artigos publicados com assinatura não traduzem necessariamente a opinião do portal. A publicação tem como propósito estimular o debate e provocar a reflexão sobre os problemas brasileiros.