Após denúncia de pagamento ilegal, TJ vai propor compra de férias de servidor
Justiça estadual tem 4 mil servidores, que poderão vender período de descanso, que hoje não tem previsão legal
O TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) vai atender pedido do Sindijus (Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário) nesta terça-feira (14) e apresentará proposta para regulamentar a venda de férias pelos 4 mil servidores. O pedido da entidade sindical foi feito depois de reportagem do Campo Grande News sobre denúncia de funcionários indicando que o Tribunal pagou o benefício sem previsão legal a servidor com alto cargo.
Em resposta ao novo pedido de posicionamento encaminhado pela reportagem, o Tribunal reafirmou a legalidade do pagamento feito, porém não citou em que trecho da legislação isso está previsto. “A venda das férias decorreu da extrema necessidade do serviço, impedindo o servidor de usufruir o direito. Reafirmamos que não há vedação legal que impeça o pagamento excepcional”, afirma a resposta dada à reportagem.
A Corte diz, ainda, que o assunto já foi tratado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que fez inspeção no nos dias 24 e 25 de outubro de 2019, e que a providência foi recomendar “a edição de norma indicando critérios objetivos para a caracterização excepcional da necessidade do serviço”.
De acordo com o TJ, “não existe dúvida sobre indenização de férias prevista na Lei n. 2531/92”. A legislação citada, que é do ano de 2002 na verdade, em nenhum momento cita essa possibilidade, mas sim prevê a indenização de servidores que sejam exonerados e não tenham usufruído as férias, além de permitir o parcelamento do período aquisitivo.
A reportagem pediu a pelo menos cinco operadores do Direito para avaliar a legislação citada. Todos tiveram a mesma interpretação: a rigor, o texto legal não permite comprar férias dos servidores do TJMS. Sobre o argumento de que não há "vedação legal" para isso, um dos profissionais observou que o Poder Público tem a obrigação de agir conforme previsão expressa, sob pena de ferir o princípio da legalidade.
A situação, segundo explicado, é diferente para um cidadão, protegido pelo artigo 5º da Constituição, segundo o qual “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”.
Nova lei– Apesar de defender que já tem autorização legal para comprar férias de servidores, o Tribunal de Justiça informou que nos próximos dias vai encaminhar proposta normativa ao Órgão Especial, citando o pedido formulado pelo Sindijus. A argumentação é de que vai ser aproveitada “a oportunidade para a edição de ato normativo que regulamente essa questão”.
Para regulamentar, é preciso mandar projeto de lei para a Assembleia Legislativa, a exemplo do que ocorreu no fim do ano passado, com a criação de adicional para os juízes por acúmulo de trabalho, também sob análise do CNJ.
Diz o Tribunal que normatização “atenderá diretamente a necessidade atual do órgão, que tem buscado alternativas para melhorar a prestação jurisdicional sem a possibilidade de novas contratações”. Conforme escrito, “é preciso fazer cada vez mais com menos recursos financeiros e de forma mais eficiente”.
Em defesa do pagamento de indenização por férias a servidores do topo administrativo, o órgão defende que “alguns cargos não têm como serem substituídos em determinados momentos, por conta de demandas que não podem ser adiadas”. A resposta prossegue dizendo que “a preocupação da administração é dar vazão ao trabalho e observar sempre a disponibilidade financeira e orçamentária”.
O TJMS afirma ainda que “tem se pautado pela transparência e busca manter um canal de comunicação aberto”. Por fim, diz que “os mesmos dados expostos em documento pessoal (holerite) do servidor em questão, amplamente divulgado por um servidor em redes sociais e transcrito pelo Campo Grande News, de forma ostensiva, estão nas páginas oficiais de transparência do TJMS mês a mês, para consulta de todos os cidadãos”.
O contracheque viralizou depois que servidores passaram a compartilhar a imagem, para denunciar a escolha, “a dedo”, de quem pode vender as férias. Grupo de servidores que procurou o Campo Grande News defende que a medida precisa ser apurada. O CNJ, em manifestação do corregedor-geral Humberto Martins, informou que as denúncias feitas por servidores durante a inspeção estão ainda em fase de investigação. Já foi concluído um relatório, em dezembro, mas foram abertos procedimentos em separado, ainda em andamento.