Pós-pandemia e Reforma Tributária geram "corrida" para doar patrimônios em MS
Em vez de deixar herança, famílias estão preferindo doar bens e valores em vida aos sucessores
A consciência da morte que a pandemia de covid-19 despertou em muita gente fez Lorena Leonardo Youssif e as duas irmãs virarem herdeiras de pai vivo.
Cada uma recebeu um terço de uma propriedade rural em Mato Grosso do Sul que estava em nome dele. Além disso, novos imóveis comprados passaram a ser registrados diretamente em nome das filhas.
O pai tem 81 anos e está cheio de saúde. A família preferiu antecipar a sucessão patrimonial por influência da "insegurança por possível falecimento", segundo Lorena, e porque advogados recomendaram a doação em vida como transação mais vantajosa. Há menos encargos e burocracia envolvida quando essa opção é feita.
"Foi uma forma de nos dar mais segurança financeira e tranquilidade. Evita também pagarmos mais impostos em comparação à tributação feita mediante inventário, aquele que só é feito após a morte", justifica Lorena.
Nos escritórios - Presidente da Comissão de Direito das Sucessões na OAB-MS (Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Mato Grosso do Sul) e advogado na área, Tulio Ribeiro afirma que é percebida uma "corrida" por planejamento patrimonial nos escritórios jurídicos no Estado. No caso do que ele advoga, esse aumento vem desde os meses finais de 2021.
A preferência pela doação em vida, assim como foi com a família de Lorena, cresce junto no Estado. Dados da Anoreg (Associação dos Notários e Registradores) de Mato Grosso Sul, analisados pelo Campo Grande News, mostram que um supera o outro desde 2021.
Este ano, já foram feitas 1.547 doações e 1.393 pedidos de inventário para herança. Em 2022, já havia mais pedidos de inventário do que doações (2.551 de inventário e 2.319 de doação), e a mesma tendência era observada em 2021, quando foram 2.663 pedidos de inventário e 1.922 de doação.
Tulio observa que a preocupação em antecipar a sucessão é reflexo da pandemia e, diante disso, o mais indicado é a doação em vida por ela ser mais vantajosa quanto ao tempo e gastos envolvidos.
No Estado, o imposto recolhido sobre patrimônio é de 6% após a morte, e de 3% em vida. A clientela do advogado procura aproveitar o incentivo.
Considerando a alíquota estadual menor e todos os outros gastos envolvidos, a doação segue mais atrativa. "O inventário chega a custar de 30% a 40% do patrimônio, considerando todos os gastos envolvidos. Ele cai de 10% a 15% quando é doação", explica o advogado.
Inserir uma cláusula quanto ao usufruto do imóvel pelo doador pode ajudar famílias a terem mais segurança. "Assim, conseguimos fazer sucessão evitando conflitos, desgaste emocional e financeiro", conclui Tulio.
Reforma Tributária - Advogada da área de sucessões em Dourados, município cercado por propriedades rurais, Leide Martins notou aumento da procura das famílias por planejamento familiar desde que o presidente Luís Inácio Lula da Silva foi empossado, em janeiro deste ano.
Ela associa isso ao medo do que possa acontecer no cenário econômico, com as novas políticas adotadas, e à busca em garantir menor tributação possível sobre o patrimônio.
Outro fator motivador, segundo ela, parece ser a Reforma Tributária. É que o texto posto atualmente, ainda não aprovado, poderá impor aumento no ITCD (Imposto sobre Transmissão “causa mortis” e Doação de bens). É o nome do tributo recolhido durante inventário ou doação em vida.
A criação de holdings, empresas familiares para a administração do patrimônio, é uma aposta que tem crescido entre as famílias douradenses, segundo Leide. "Ela dá a possibilidade de prever a sucessão da herança, deixando tudo organizado em vida e livrando de impostos do inventário. Além disso, evita conflitos familiares", pontua.
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