Com potencial de crescer após reforma, doação em vida já supera heranças em MS
Doações são maiores que inventários no Estado desde 2021, durante pandemia
Antecipar a transferência de patrimônio por meio das doações em vida é mais vantajoso hoje em Mato Grosso do Sul do que repassá-los por meio de herança. Isso porque é cobrado imposto de 3% sobre a primeira operação, e o dobro se isso for feito após a morte.
Como reflexo da pandemia de covid-19, as famílias passaram a se planejar e avaliar mais esse aspecto, provocando aumento no número de doações ante heranças no Estado. Essa tendência poderá se acentuar caso o texto atual da reforma tributária seja aprovado no Senado e a cobrança progressiva até o teto de 8%, conforme fixa a Constituição Federal, vire regra em todo o Brasil.
"Se houver aumento de alíquota em Mato Grosso do Sul devido a isso, acredito que ocorrerá uma procura maior no intervalo compreendido entre a sanção da reforma e o início da vigência da reforma", prevê o presidente da Anoreg (Associação dos Notários e Registradores) de Mato Grosso Sul, Leandro Corrêa.
A herança é o conjunto de bens, direitos e obrigações que uma pessoa falecida deixa aos seus sucessores após ser feito um inventário e partilha, que levantam e oficializam a distribuição do que ela deixou, respectivamente.
Já a doação de bens é um contrato em que uma pessoa transfere o seu patrimônio para outra antes de morrer, sem receber nenhum pagamento em troca.
Doações já são maioria - Representante dos cartórios, que fazem essas operações e recolhem os impostos estaduais, a Anoreg reuniu dados de 2021, 2022 e de janeiro a agosto de 2023 quanto às heranças e doações. Analisados pelo Campo Grande News, os números mostram que a doação é maior que os de inventário em todos os períodos de referência.
Este ano, já foram feitas 1.547 doações e 1.393 pedidos de inventário para herança. Em 2022, havia mais pedidos de inventário do que doações (2.551 de inventário e 2.319 de doação), e a mesma tendência era observada em 2021, quando foram 2.663 pedidos de inventário e 1.922 de doação.
Comparando a proporção de atos em relação ao total verificado em cada mês, os pedidos de doação tiveram maior percentual em abril deste ano – de 54,26% do total. No mesmo mês, foram 40,83% pedidos de inventários e 4,91% pedidos de partilha. Daí em diante, a proporção das doações segue maior que a de inventário.
A tendência pode ser observada há mais tempo. Entre 2021 e 2022, houve redução de 4,21% no número de heranças e aumento de 20,66% no número de doações.
O presidente da Anoreg acredita que, ainda que a reforma tributária tenha entrado em pauta nos últimos meses, o aumento das doações em comparação aos procedimentos relacionados às heranças se explica pela maior preocupação com a morte e os efeitos econômicos sobre o patrimônio que ela tem.
"Eu tendo a concluir também como tabelião que isso vem muito mais da pandemia do que da reforma. A pandemia gerou na população a sensação de risco de morte iminente, fazendo com que as famílias tomem decisões antes que ela ocorra e busquem a manobra mais vantajosa dentro disso", afirma Corrêa.
Aumento de atos de partilha - Em abril deste ano, houve o maior número de atos de partilha desde janeiro de 2021 – foram 19. Nesse quesito, 2023 já registra maior número que os dois anos anteriores: foram 86 atos de partilha de janeiro a agosto, enquanto 2021 teve 29 e 2022 teve 24.
Vale ressaltar que decisão do STJ (Supremo Tribunal de Justiça) não condiciona a homologação da partilha amigável e a expedição dos documentos resultados ao pagamento prévio do ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação), tributo estadual em que os Estados estabelecem as alíquotas fixas ou progressivas para as operações conforme os limites constitucionais.
Reforma - Atualmente, alíquotas progressivas são aplicadas em 15 estados e no Distrito Federal, mas a ideia é unificar, conforme a reforma tributária. Em 11 desses locais, a taxação chega ao teto de 8%.
Outros dez estados têm alíquotas fixas, em alguns casos, uma para herança e outra para doação. Além de Mato Grosso do Sul, estão inclusos São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Paraná, Amazonas, Amapá, Roraima, Alagoas e Rio Grande do Norte.
A PEC 45 (Proposta de Emenda à Constituição), aprovada na Câmara em julho e analisada pelo Senado desde 3 de agosto, altera vários impostos. Entre eles, o ITCMD, de competência estadual e que representa 0,4% da carga tributária nacional, segundo dados de 2022 divulgados pelo jornal Folha de S. Paulo.
O texto diz que o imposto será progressivo – ou seja, quanto maior o valor do patrimônio, maior a taxa, assim como ocorre no IRPF (Imposto de Renda de Pessoa Física), em relação aos salários. Contudo, esse ponto ainda depende de aprovação de leis estaduais, que podem ampliar alíquotas.
A proposta autoriza, entre outras coisas, cobrança sobre heranças e doações de residentes fora do país, sem necessidade de lei complementar federal anteriormente prevista no texto constitucional e que nunca foi votada pelo Congresso.
O texto inclui ainda isenção para transmissões e doações para instituições sem fins lucrativos, inclusive as ligadas a entidades religiosas e institutos científicos e tecnológicos. A bancada ruralista quer isentar também a sucessão familiar de algumas propriedades rurais.
Não há alteração na alíquota máxima que os estados podem cobrar, que atualmente é de 8%. Uma mudança nesse valor depende apenas de resolução do Senado.
Mesmo cobrando até o teto, caberá aos Estados alguma autonomia, detalha Leandro Corrêa. Mato Grosso do Sul, por exemplo, pode aprovar nova legislação estadual após a reforma, com valores progressivos menores para determinadas faixas de doações ou de heranças, estabelecendo vantagem ou desvantagem em relação a outras unidades da federação. "Se o Estado ainda continuar com alíquotas diversas após a reforma, incentivando a doação, acredito que se manterá a tendência verificada na pandemia", conclui o presidente da Anoreg.
Outra mudança é que o imposto por bens móveis, como participações societárias, investimentos ou aplicações financeiras e créditos, passa a ser de competência do estado de residência do doador ou da pessoa que morreu. Desta forma, isso vai mudar o critério atual, do local do inventário, que permite que herdeiros possam buscar tributação menor em outras unidades federativas.
Se forem feitas modificações do texto no Senado, ele retornará para a Câmara Federal. A previsão é que a versão final seja aprovada até o fim de 2023.
Receba as principais notícias do Estado pelo Whats. Clique aqui para entrar na lista VIP do Campo Grande News.