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Capital

A dor que eles sentem: silêncio dos amigos após morte de menino no lixão

Paula Maciulevicius | 04/01/2012 16:49

“Tenho certeza né, eu queria ajudar os caras, queria pegar com a mão, queria achar ele” fala menino sobre o sonho de ser bombeiro

Desmoronamento que levou menino de 9 anos a morte no lixão faz hoje uma semana. Amigos, crianças e adolescentes sentem a dor da saudade. (Foto: Pedro Peralta)
Desmoronamento que levou menino de 9 anos a morte no lixão faz hoje uma semana. Amigos, crianças e adolescentes sentem a dor da saudade. (Foto: Pedro Peralta)

Os dias passaram e a história ficou no ano passado. Pelo menos no calendário. Mas no coração e no dia-a-dia dos amigos de Maikon Correia Andrade, menino de 9 anos que morreu soterrado no lixão no último dia 28, a dor e a saudade batem forte.

“Ele era o segundo melhor na pipa, só atrás do meu irmão”, recorda um menino de 10 anos.

“A gente sempre soltava pipa, jogava bola, ficava no balanço que ele fez”, completa o irmão melhor na pipa, de 11 anos.

Os dias passaram e a tristeza ficou. Em frente à casa, a grande árvore seca não só faz a sombra como abriga o balanço que Maikon fez com as próprias mãos, que agora está vazio. A criançada que se juntava na rua do bairro Dom Antônio Barbosa quase não tem força para brincar depois de ter chorado a morte de um amigo.

Eles que na faixa dos 10 aos 14 anos, tão novos, viram um amigo-irmão ser levado dessa forma. Aceitar a morte é difícil em qualquer idade, mas de criança para criança o sentimento é ainda mais triste de detalhar.

“Claro que dói né. Ele era meu melhor amigo, ficava todo dia junto, jogava bola”.

A frase é do adolescente de 14 anos, aquele flagrado pelo jornal O Estado, pedalando com Maikon na garupa na manhã do soterramento, em direção ao lixão.

O menino relatou que no dia da tragédia tinha ido só vender recicláveis porque fora do lixão não tinha comprador.

Aos 14 anos, ele trabalhava no aterro com o tio, para ajudar em casa. O verbo está no passado e não é só pela conjugação, está diretamente ligado a dor de ter perdido o melhor amigo. “Não quero mais saber de lá, joguei fora o gancho, a bota, calça, luva. Não volto mais”.

O sonho de ser bombeiro, relatado na matéria em que aparece, persiste e ainda com mais força. “Tenho certeza né, eu queria ajudar os caras, queria pegar com a mão, queria achar ele”.

Na foto, menino de 14 anos leva Maikon para o lixão, os dois iam vender bags. (Foto: Moisés Palácios/Jornal O Estado)
Na foto, menino de 14 anos leva Maikon para o lixão, os dois iam vender bags. (Foto: Moisés Palácios/Jornal O Estado)

Desde a última segunda-feira, a Guarda Municipal faz a vigilância do lixão, palco de tamanha tragédia às vésperas do fim do ano que passou. A presença dos guardas só foi determinada depois dos fatos. Verdade que dói no coração do adolescente com senso de adulto.

“Em vez dos camburão da Cigcoe, do Tático ficar rodeando, devia estar lá. Se ficasse dois que fosse, de menor ia dar para trás, ninguém de menor nunca tinha entrado. Um moleque desse tamanho me diz, desse tamanho pode estar no lixão? Lá entra todo mundo. Se tivesse Polícia dizendo antes que de menor não pode não...

O menino se quer termina a frase. Nos olhos indignação misturada à saudade, que vai custar a passar.

Polícia - A Polícia deve ouvir nesta quinta-feira as testemunhas sobre a morte do menino no lixão. Com o resultado da perícia do local em mãos, a Polícia deve iniciar os interrogatórios. Entre quatro e cinco pessoas já foram intimadas, pais de Maikon, catadores e também o menino que estava com ele no momento da queda.

História - O desmoronamento de parte do lixão na saída para Sidrolândia, em Campo Grande, soterrou uma criança, na tarde de quarta-feira, dia 28. O menino de 9 anos estava junto com outras crianças num lugar chamado de barranco, dentro da montanha de lixo.

A busca começou por volta das 16h30, após trabalhadores verem a criança ser soterrada. No local estiveram três ambulâncias do Corpo de Bombeiros e uma do Samu (Serviço Móvel de Atendimento de Urgência). Catadores de lixo que atuam no local viram quando as crianças estavam no barranco e um caminhão chegou para despejar entulho.

O lixo foi empurrado para o barranco por uma máquina, como é praxe e, nesse momento, conforme contaram os trabalhadores, houve o desmoronamento em direção às crianças.

O corpo de Maikon só foi localizado no final da manhã de quinta-feira, depois de 20h de buscas. Quando o catador José Vilmar de Lima, de 49 anos, lançou do alto do lixão, uma pedrinha, indicando para os operários das escavadeiras, onde o corpo deveria estar.

A operação de busca – em meio a toneladas e toneladas de lixo, chorume e degradação – contou com 15 bombeiros, três escavadeiras e oito operadores de máquinas.

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