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Capital

Cadê o Córrego do Sóter que estava aqui? Moradores reclamam de parque abandonado

Última revitalização ocorreu em 2019 e obra de desassoreamento da bacia de retenção segue paralisada

Por Gabriela Couto e Kamila Alcântara | 14/11/2024 13:13
Filete de água é o que sobrou do Córrego Soter, após constante processo de erosão e assoreamento da mata ciliar (Foto: Juliano Almeida)
Filete de água é o que sobrou do Córrego Soter, após constante processo de erosão e assoreamento da mata ciliar (Foto: Juliano Almeida)

O Parque Ecológico do Sóter foi, por muitos anos, um refúgio para a fauna e flora locais. Entretanto, nos últimos dois anos, o parque tem sido palco de um processo preocupante de degradação ambiental.

RESUMO

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O Parque Ecológico do Sóter, antes um refúgio para a fauna e flora local, sofre com a degradação ambiental desde o desmatamento do Córrego Sóter em 2022. A obra, que previa a construção de uma lagoa para recuperar o ambiente, foi abandonada, deixando o parque em estado de erosão e instabilidade. O desmatamento e a falta de manutenção resultaram na perda da mata ciliar, erosão das margens do córrego e na deterioração do espaço, que antes era uma área de lazer e observação ambiental. A obra de desassoreamento do córrego, que também está paralisada, era crucial para a regularização da vazão e para evitar o transbordamento do córrego, na altura do Parque das Nações Indígenas.

O médico veterinário Rafael Jan Hoogesteijn Reul, morador da região desde 2008, foi um dos primeiros a observar as mudanças significativas no local e, após diversas denúncias, resolveu compartilhar sua visão sobre a situação crítica da área com o Campo Grande News.

A principal área de impacto tem sido o Córrego Sóter, na seção que atravessa o parque, onde, segundo relatos de Rafael e outros frequentadores, havia uma rica mata ciliar com árvores grandes e pequenas, que protegiam as margens do córrego e abrigavam diversas espécies de animais.

Médico veterinário Rafael Jan Hoogesteijn Reul, aponta para barranco formado com a erosão; parte do paredão formou banco de areia no córrego (Foto: Juliano Almeida) 
Médico veterinário Rafael Jan Hoogesteijn Reul, aponta para barranco formado com a erosão; parte do paredão formou banco de areia no córrego (Foto: Juliano Almeida)

Entre 2004 e 2022, a região era uma das mais visitadas, com a presença constante de fauna local, como cutias, capivaras, lobinhos, mutuns e corujas. A vegetação, formada por árvores nativas, foi essencial para o equilíbrio ecológico do ambiente.

No entanto, em novembro de 2022, uma ação surpresa chamou a atenção dos visitantes do parque: uma pá carregadeira e uma retroescavadeira foram usadas para realizar o desmatamento total do leito do córrego.

A operação, que ocorreu ao longo de cerca de 500 metros do leito do Córrego Sóter, resultou na remoção completa de árvores e vegetação, deixando o local nu e sem a vegetação, que antes desempenhava um papel fundamental na proteção das margens e na preservação da biodiversidade.

Há dois anos, máquinas derrubaram mata ciliar e córrego passa por degradação diária (Foto: Juliano Almeida) 
Há dois anos, máquinas derrubaram mata ciliar e córrego passa por degradação diária (Foto: Juliano Almeida)

As máquinas, contratadas pela prefeitura, realizaram o desmatamento sem apresentar um plano claro para a recuperação da área. Após o trabalho inicial, as máquinas foram retiradas e a obra foi abandonada, deixando o parque em um estado de degradação. O espaço, que antes era uma verdadeira área de lazer e observação ambiental, foi transformado em um terreno erodido e instável.

Após o desmatamento, as autoridades locais instalaram três placas informativas na área afetada, explicando a possível construção de uma nova lagoa no local, como forma de recuperação do ambiente. No entanto, as obras foram abandonadas em 2022 e não houve mais movimentação no local desde então.

Adriana Souza Freitas, servidora pública sinaliza dano ao meio ambiente; ela já questionou a prefeitura e não viu retorno efetivo (Foto: Juliano Almeida) 
Adriana Souza Freitas, servidora pública sinaliza dano ao meio ambiente; ela já questionou a prefeitura e não viu retorno efetivo (Foto: Juliano Almeida)

Advogada Adriana Souza Freitas, servidora pública, mora na região desde o começo dos anos 2000 e procurou a Semadur (Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano) para entender porque a situação não foi resolvida.

“Eu fui lá, me mostraram o projeto. Era para a construtora que fez um condomínio residencial perto da Joaquim Murtinho fazer essa obra como compensação, mas até agora nada. Vi ainda no projeto que podiam derrubar até 40 árvores, mas o que fizeram aqui em 2022 foi a derrubada de muitas espécies. Essas árvores eram abrigo de diferentes animais, piorou o assoreamento e ninguém faz nada. Isso é um dano para o meio ambiente e quem fiscaliza? Ninguém vai fazer alguma coisa?”, lamenta.

Placa colocada pelas autoridades, depois do desmatamento, explicando a construção da lagoa (Foto: Rafael Jan Hoogesteijn Reul)
Placa colocada pelas autoridades, depois do desmatamento, explicando a construção da lagoa (Foto: Rafael Jan Hoogesteijn Reul)

“Parece que o objetivo era apenas realizar o desmatamento e depois não fazer mais nada. Não há mais nenhum sinal de continuidade nas obras, e a situação só tem piorado”, acrescentou Rafael Jan Hoogesteijn Reul.

Um dos exemplos claros desse abandono é a pilha de bueiros (manilhas) e pedras de construção deixadas em um canto da obra, amontoadas e já em processo de deterioração. O local, que deveria ser uma área de recuperação e revitalização, tornou-se um verdadeiro depósito de material sem utilidade.

Cleber Ferreira da Costa, 47 anos, vende açaí e água de coco na frente da entrada principal. Ele compartilha do mesmo pensamento dos vizinhos do parque. “Trabalho aqui há dois anos, sempre morei na região e acho um completo descaso com o meio ambiente. Dá para ver de longe os barrancos de areias. Só deixaram os tapumes, pedras e manilhas ali, mas não terminaram nada”.

Gerente comercial Marli Solto, reclamou das tábuas com buracos na ponte que fica sobre o que sobrou do córrego (Foto: Juliano Almeida) 
Gerente comercial Marli Solto, reclamou das tábuas com buracos na ponte que fica sobre o que sobrou do córrego (Foto: Juliano Almeida)

Outro problema relatado pelos usuários do parque é a falta de manutenção da ponte que está totalmente sem manutenção, tábuas soltas e buracos.

A gerente comercial Marli Solto, de 46 anos, tem medo da estrutura da ponte ruir. Chegou a fazer um vídeo no mês passado mostrando a situação das tábuas. Com o “sumiço” do córrego, a base da ponte é completamente amostra.

“Já é preocupante ver os barrancos de areia, o 'rio' quase sumir, mas também é preocupante a situação dessa ponte. Ela faz parte da pista de caminhada e está cheia de buracos, aparência de solta. Tenho medo de um dia as minhas cachorras ou até uma pessoa cair”, alerta.

Erosão - O resultado imediato do desmatamento e do abandono da obra foi a erosão das margens do córrego. Com a chegada do período chuvoso de 2023 e 2024, o processo de degradação se intensificou. A erosão contínua tem arrastado parte do solo das margens do córrego, fazendo com que árvores inteiras sejam derrubadas e, consequentemente, prejudicando os mananciais de água da região.

Paredão de terra passou por processo de erosão e deixou cerca pendurada (Foto: Juliano Almeida) 
Paredão de terra passou por processo de erosão e deixou cerca pendurada (Foto: Juliano Almeida)

As imagens registradas por Rafael e outros frequentadores do parque mostram a destruição progressiva da área. A erosão da margem direita, especialmente, tem sido uma das mais visíveis, com o solo sendo constantemente arrastado pela força da água. As autoridades, no entanto, parecem não ter tomado medidas eficazes para conter o processo.

“Desde o desmatamento, não houve nenhuma ação concreta para evitar que a erosão continue. A situação está cada vez mais grave e, ao que parece, ninguém está tomando responsabilidade pela preservação do parque”, afirma Rafael.

Outro ponto levantado por Rafael é a precária manutenção do Parque Ecológico do Sóter, em comparação com outros espaços públicos de Campo Grande, como o Parque das Nações Indígenas.

Material que seria usado em obra está abandonado há dois anos no mesmo local (Foto: Juliano Almeida) 
Material que seria usado em obra está abandonado há dois anos no mesmo local (Foto: Juliano Almeida)

A entrada do parque, que dá acesso pela Rua Hermínia Grize, permaneceu em estado precário por anos, com a situação sendo apenas recentemente resolvida. “A falta de manutenção é visível em todo o parque. O cuidado com a infraestrutura é muito aquém do que a população merece”, observa.

Era para ser um 'piscinão' - A obra tinha previsão de retirar cerca de 700 caminhões de areia do Parque do Sóter. Dentro, há a nascente do Córrego Sóter, que acabou assoreado devido ao crescimento urbano desenfreado.

O piscinão teria capacidade para reter até 10 milhões de litros de água e ocuparia uma área de 4.800 metros quadrados e tem como função regular a vazão do córrego que passa pelo bairro Mata do Jacinto, evitando o transbordamento do parque, especialmente na área do Parque das Nações Indígenas.

A bacia de amortecimento serve para regular a vazão do córrego a jusante, contribuindo para evitar o transbordamento do córrego, na altura do Parque das Nações Indígenas. A obra, no entanto, está paralisada desde janeiro de 2023, conforme já foi noticiado pelo Campo Grande News, por conta do grande volume de chuva que caiu na Capital no início do ano.

Resposta - A Prefeitura de Campo Grande respondeu que a "obra de desassoreamento do Parque do Sóter faz parte de uma compensação que está sendo executada e custeada por uma empresa particular, conforme determinado pela administração municipal".

De acordo com o município, a Fundação Municipal de Esporte (Funesp) está acompanhando diretamente todo o processo com a empresa responsável e informa que está programada uma manutenção com limpeza nos espaços para a próxima segunda-feira.

"Além disso, a empresa responsável pela reforma conseguiu a doação de mil mudas de árvores nativas para serem plantadas nas áreas de assoreamento. No entanto, devido às chuvas frequentes, há no momento dificuldades para iniciar o plantio", acrescentou.

Também ficou confirmado que uma reunião está marcada com os órgãos responsáveis na próxima semana, para discutir e acertar os procedimentos necessários para concluir a obra.

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