Em cidade que amanhece com quase 30°C, quem vive em barraco quente não dorme
Temperatura sobe ainda mais em barracos de madeira e lona, construídos ao longo da BR-262
Enquanto boa parte da cidade despertava com o termômetro marcando quase 30°C em Campo Grande já por volta das 6h da manhã, Jefferson Souza, 40, nem sequer dormiu. O sono deixou de ser algo rotineiro para ele e para os moradores de barracos de madeira e lona, construídos no quilômetro 346 da BR-262. Se em bairros privilegiados o calorão já é insuportável, nesses locais a temperatura castiga muito mais.
Para sobreviver, Jefferson aproveita a pouca sombra das árvores de porte pequeno do Cerrado, no quintal da casa improvisada, e usa a água do poço semiartesiano para se refrescar. O pior cenário, conforme ele relata, é na hora de ir dormir.
Eu fico aqui fora, tem hora que eu durmo sentado. Aí quando dá umas 4h, malemá dá uma refrescada, aí dou uma cochilada. Mas daí logo já tem que levantar pro serviço. Você acorda com o corpo cansado já, estressado, esgotado”.
O barraco de Jefferson é feito de palets de madeira e lona. Ele improvisou uma rede feita de sacas para poder "descansar" ao ar livre, pois dentro do barraco é muito quente e, nas palavras de Jefferson, "impossível de ficar".
Já não bastassem as dificuldades para dormir no calorão, Jefferson também precisa lidar com as queimadas frequentes na vegetação. "O ruim é que tocam fogo em tudo. Queimam as árvores, e a gente precisa delas pra viver. Esses dias tocaram fogo ali, só não pegou aqui porque eu carpo tudo o mato".
Nós não dorme não, não dá. A gente passa o dia inteiro aqui, debaixo desse pé de manga (sic)”.
O relato é de Vera Lúcia Barbosa da Silva, 58. Um pé de manga de estatura média faz uma sombra boa no barraco que ela divide com o marido, o senhor Sebastião, e é o "refúgio" do casal, pois conforme relata Vera, se ficar dentro do barraco os dois "morrem de calor ali dentro".
“Ontem não esfriou nenhum pouquinho à noite. Aí eu falei ‘meu deus, que que eu vou fazer agora? Eu não vou poder ir lá pra dentro’, tive que amanhecer aqui [debaixo do pé de manga]. Nós estamos aqui porque a gente não pode pagar aluguel. Essa beira de estrada é pura misericórdia”, diz Vera Lúcia.
Aniversino Correia da Silva, 71, mora há 13 anos na beira da BR-163 e relata que os dias de calor intenso são os mais difíceis. Assim como em todas as casas visitadas pela reportagem, o idoso tem acesso à água por meio de um poço, e acesso à energia por placa solar.
A gente vai se tratando com água, eu não tenho o que fazer, não tenho outra alternativa. Na hora de dormir é difícil. A gente deita um pouquinho, levanta, sai para o terreno, pra poder estar tomando um pouquinho de ar. E assim nós estamos levando a vida”.
Aparecida Tatiana, 37, divide um barraco com o esposo e os filhos de 17, 18 e 13 anos. A família adotou estratégias para lidar com o calor intenso, que incluem só fazer as tarefas após o sol "baixar um pouco" e ficar o máximo que puderem na sombra do barraco.
“Tem que tomar bastante água, tomar banho, bastante banho, e deixar pra fazer as coisas só de tardinha. A gente deixa tudo aberto pra entrar um ar para ver se dorme, porque a gente geralmente não dorme, é bem difícil.”
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