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Capital

Entregues à ação do tempo, espaços históricos continuam em 2º plano na Capital

Locais dependem de parceria privada ou ação da Justiça para não sucumbir ao abandono

Por Caroline Maldonado | 08/05/2024 13:11
Rotunda após desabamento no dia 7 de abril deste ano (Foto: Marcos Maluf)
Rotunda após desabamento no dia 7 de abril deste ano (Foto: Marcos Maluf)

Prédios que deveriam preservar a memória histórica e cultural de Campo Grande estão sofrendo com a ação do tempo e fora das prioridades da administração pública, quando não dependem de trâmites burocráticos para serem revitalizados. Entre os mais notados, nove são apontados como “abandonados” pelo Conselho Municipal de Proteção ao Patrimônio Histórico.

A prefeitura busca parcerias privadas para resolver a situação, mas os processos são demorados. Um dos exemplos é o caso do antigo Colégio Oswaldo Cruz, prédio tombado no Centro, que foi reformado pela Santa Casa para abrir uma Escola de Saúde.

Rotunda - No antigo complexo ferroviário, a Rotunda tem que ser recuperada por ordem de decisão judicial, expedida em maio, mas até agora não começaram as obras, segundo a integrante da diretoria da Associação de Moradores do Bairro Cabreúva, a jornalista Socorro Ozaki. Ela também faz parte dos conselhos da Região Urbana do Centro e de Segurança do Centro. O prazo é de seis meses. A decisão veio depois que o telhado desabou, mas há inquérito sobre o caso desde 2016.

“A preocupação dos moradores primeiramente é com relação à segurança e também a preservação do patrimônio. Somos impactados, porque ali na Rotunda já foi boca de fumo, já virou favela, já tiraram as pessoas de lá. Moro há 26 anos no Cabreúva. A Rotunda foi desafetada há 20 anos, em que absolutamente nada foi feito pelo poder público para preservar esse patrimônio e temos presenciado o descaso”, reclama Socorro, que participou da audiência pública.

Com relação à Rotunda, o chefe da Divisão de Patrimônio Cultural da Sectur (Secretaria Municipal de Cultura e Turismo), Fernando Batistão, explica que a prefeitura segue trabalhando no projeto de revitalização, mas explica que tudo depende da disposição de recursos financeiros.

“Acontece é que ela [Rotunda] foi dado o começo, mas isso aconteceu também por conta de troca de gestão e também, vamos falar uma coisa, as prioridades elas acabaram mudando, por exemplo, recentemente, a gente teve o problema lá do desabamento e antes daquele sinistro acontecer, a gente já tinha entrado com um projeto para aprovação de um projeto junto ao Iphan e nós estamos agora completando esse projeto, já fomos contemplados, preenchemos já a plataforma, estamos agora dando continuidade”, disse o chefe da divisão.

Homens usam drogas na Orla Ferroviária. (Foto: Arquivo/Marcos Maluf)
Homens usam drogas na Orla Ferroviária. (Foto: Arquivo/Marcos Maluf)

Orla Ferroviária - A região que dá saudade em quem presenciou os tempos áureos da ferrovia passou por obra de R$ 4,8 milhões que previa espaço de lazer, gastronomia e resgate histórico, mas acabou se tornando abrigo para pessoas em situação de rua e usuários de drogas.

Empresários já deram até sugestão de transformar parte da área em estacionamento para consumidores do comércio, mas não houve projeto nos últimos anos para o local. A prefeitura em ações e permanência da GCM (Guarda Civil Metropolitana) para combater a criminalidade que foi atraída para a área.

Horto Florestal - Por enquanto não há projetos para o horto na Sectur. O chefe da Divisão de Patrimônio explica que pode haver projetos em outras secretarias, mas não sabe dar detalhes.

Estrutura do orquidário do Horto Florestal sem manutenção (Foto: Arquivo/Gennifer Valeriano)
Estrutura do orquidário do Horto Florestal sem manutenção (Foto: Arquivo/Gennifer Valeriano)

Na avaliação do membro do Conselho de Patrimônio Histórico e Cultural da Capital, Roberto Figueiredo, o horto não depende de um grande projeto, mas sim de manutenção, pois tem piso se soltando, grades quebradas, entre outros estragos.

Ele alerta que há uma tendência de tentar recuperar o patrimônio ao invés de garantir a preservação, o que pode levar à extinção de alguns desses espaços.

“Depois que arrancar a árvore não tem como plantar outra, vai plantar outra e vai demorar 200 anos pra crescer. Acho que existem uns dez processos de patrimônios abertos há mais de 10 anos e nenhum deles foi para frente. Estão parados por questões judiciais e políticas. O Horto Florestal é um exemplo disso”, alertou Roberto.

A resposta da prefeitura quando questionada sobre a manutenção do horto foi a informação de que há um projeto orçado em R$ 9 milhões para recuperar o local, segundo o vereador Ronilço Cruz, o “Guerreiro” (Podemos). “Não precisamos de um grande projeto, e sim de uma manutenção”, comentou o parlamentar, que provocou o debate.

Antigo Colégio Oswaldo Cruz, prédio tombado no Centro, sendo reformado pela Santa Casa para abrir uma Escola de Saúde, em 2023. (Foto: Arquivo/Paulo Francis)
Antigo Colégio Oswaldo Cruz, prédio tombado no Centro, sendo reformado pela Santa Casa para abrir uma Escola de Saúde, em 2023. (Foto: Arquivo/Paulo Francis)

Outros espaços - Também preocupa moradores e integrantes do conselho o estado do calçadão da Avenida Barão do Rio Branco; a estação do Trem do Pantanal, no Bairro Indubrasil; o Teatro do Paço Municipal; a obra que se arrasta há 30 anos para o Centro de Belas Artes, no Bairro Cabreúva; a Praça Ary Coelho; e o Museu José Antônio Pereira. Com relação a todos esses, há queixas de quem acompanha de perto as discussões de melhorias que não saem do papel.

A presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Mato Grosso do Sul, Maria Madalena Dio Greco, relata a indignação com a falta de interesse e descaso com o dinheiro já “investido” nesses locais. “Eu fico indignada como se destrata o dinheiro público, porque são jogados fora, sabe. De maneira que nada é efetivo”, disse.

Na avaliação do superintendente do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) em Mato Grosso do Sul, João Henrique dos Santos, o "cenário não é positivo", mas os prédios já estiveram em situação pior com relação ao envolvimento do poder público e da população com o patrimônio público. A preservação depende de investimento de recursos financeiros dos poderes, na opinião dele.

"Em 2011 e 2012, o Iphan investiu mais de R$ 4 milhões na restauração da explanada ferroviária, restrito à estação e ao armazém. De 2011 para cá, nenhum outro investimento foi dado nessa área, em nível municipal ou estadual", destacou durante audiência pública sobre o tema na Câmara Municipal, nesta quarta-feira (8), quando elencou ainda outros investimentos do órgão.

Venda do direito de construir - Segundo o coordenador de Planejamento Urbano da Planurb (Agência Municipal de Meio Ambiente e Planejamento Urbano), Davi da Costa, há parcerias e estratégias para preservação do patrimônio, mas se "esbarra em dificultados operacionais do próprio município", no entanto, a agência se empenha para superar essas dificuldades.

Ele informou que para os locais que foram apresentados pelo vereador e moradores, existem instrumentos que podem ser aplicados e parcerias que podem ser feitas como solução.

"Temos a transferência do direito de construir que poderia ser utilizada de uma maneira mais eficaz, em que se vende o poder construtivo daquele imóvel na troca do potencial de outro imóvel e esse valor pode ser usado para melhorias. Temos hoje dois casos: os Colégios Bom Bosco e Oswaldo Cruz, que está sendo finalizado basicamente com uma transferência do direito de construir e temos 320 imóveis com muito potencia e muita gente querendo comprar com o quociente de aproveitamento. Por que isso não está acontecendo?", questionou.

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