GPS e câmeras esfacelam versão de atentado e mostram "tragicomédia" de Trutis
Já a perícia cravou que o deputado, sentado no banco traseiro do Corolla, não sairia ileso do ataque
Rastreador do carro, câmeras espalhadas pela BR-060, perícia e exaustiva investigação levaram a PF (Polícia Federal) a descobrir que a tentativa de homicídio, denunciada pelo deputado federal Loester Carlos Gomes de Souza (PSL) em 16 de fevereiro, era uma farsa ou, como classificou os investigadores, uma tragicomédia com dois atores: o deputado e o seu então motorista Ciro Nogueira Fidelis, atual candidato a vereador.
A apuração chega a o refinamento de indicar hora, minutos e segundos da simulação do crime. Já a perícia cravou que Trutis não sairia ileso do ataque.
Os dois foram alvos ontem (dia 12) da operação Tracker, que não por acaso significa rastreador em inglês. A investigação revelou que o Toyota Corolla, que exibe as marcas de tiros, é alugado pelo gabinete do parlamentar e só chegou a Campo Grande um dia antes do atentado. O carro veio de Brasília.
Até então, nos dias 14 e 15, o deputado usou veículo de sua propriedade para os deslocamentos em MS. Diante da comunicação de atentado, a PF refez os passos de Loester, afinal ele deveria estar sendo monitorado pelos autores dos tiros.
Os policiais verificaram imagens de quando o parlamentar chegou a Campo Grande, com desembarque no aeroporto, e no domingo do suposto atentado.
A empresa dona do carro enviou os dados do GPS e foi verificado que o veículo não circulou somente pela BR-060, na saída para Sidrolândia. Mas entrou em estradas vicinais. “Pois os atores da tragicomédia estavam procurando o lugar para encenarem a sua peça”, detalha a PF.
As câmeras de uma empresa flagraram um automóvel de cor escura saindo da vicinal e entrando na rodovia.
“É possível concluir que o veículo esteve parado no mesmo local por exatos 40 segundos, entre o horário das 05:29:02 às 05:29:42. E mais, por aproximadamente 24 segundos o automóvel esteve com a ignição desligada. Tempo suficiente para descer do veículo, efetuar vários disparos de arma de fogo e retornar para dentro do veículo”, informa o inquérito.
Nesse mesmo ponto da estrada vicinal, foram encontrados seis estojos de munição 9 milímetros onde o Corolla ficou parado. Mesmo participando de simulação, o deputado e o motorista nunca relataram a parada nas estradas vicinais. A PF também procurou marcas de frenagem, mas nada foi localizado no trajeto.
Câmeras, caminhonete e troca-troca – A PF recorreu a câmeras para refazer todo o trajeto de Loester no domingo do atentado. O objetivo era verificar se os passos do deputado eram monitorados. As filmagens mostraram troca-troca de lugares. Numa parada em farmácia, ele passou do banco do carona para o banco de trás do Corolla.
Contudo, as câmeras não levaram a identificar nenhum veículo envolvido no atentado. A primeira suspeita foi sobre um Marea, próximo a posto de combustível, ponto de passagem do deputado, ainda na área urbana. O condutor do carro foi identificado, ouvido pela PF e disse que trabalha como motorista de aplicativo, informação confirmada pela empresa.
Na saída para Sidrolândia, as atenções dos policiais se voltaram para uma Fiat Strada com farol queimado. O condutor foi ouvido e disse que seguia para sua propriedade rural. Também foi ouvido o motorista de um Kangoo que seguia pela rodovia. Ele, que é bombeiro, contou que prestou atenção no Corolla devido à baixa velocidade desenvolvida na pista. ´
A PF também verificou câmeras da Sefaz (Secretaria Estadual de Fazenda), que mostram o fluxo de veículos que entram e saem da cidade, de empresa e da PRF (Polícia Rodoviária Federal). O posto da PRF é o mais distante e as imagens mostram a passagem dos carros que saíram de Campo Grande próximo do horário da passagem do Corolla. Só o carro do deputado não seguiu viagem.
Na versão dele, o atentado a tiros, vindo de uma caminhonete L-200, de cor escura e placa final 18, interrompeu a viagem. Exigindo retorno a Campo Grande. Já Ciro, que estava ao volante, não soube dar características do veículo usado no atentado.
Segundo a investigação, a riqueza de detalhes passados pelo parlamentar foi apenas para inviabilizar a apuração. A Polícia Federal solicitou à PRF levantamento em dados de veículos do Estado de outras unidades da federação.
Sendo encontrada em Mato Grosso do Sul apenas uma caminhonete com as características citadas pelo deputado. Mas o estado do veículo inviabilizou suspeita de participação de atentado em alta velocidade na BR: antiga, deteriorada e sem condições mecânicas de competir com a potência de um Corolla.
Tiros e perplexidade – O trabalho técnico identificou disparos de pistola Glock 9mm de fora para dentro do Corolla e disparos de pistola Taurus de dentro para fora do carro. À época do atentado, o deputado disse que revidou o atentado, o que justificaria os projéteis nos dois sentidos.
Ciro forneceu senhas de celular e e-mails, mas depois fez alterações. “Essa ação tem a nítida finalidade de impedir o acesso da equipe de investigação aos dados que seriam importantes para a elucidação dos fatos. Esse comportamento causou extrema perplexidade, porquanto, na qualidade de vítima teria ele, por óbvio interesse em auxiliar”.
Após a detalhada investigação, a Polícia Federal investigou que não se tratava de possível tentativa de homicídio, mas sim de comunicação falsa de crime, dano, porte ilegal de arma de fogo e disparo de arma de fogo.