Ligação à PM confirma que 'Coreia' não foi claro ao se identificar para vítimas
Áudio mostra que Ricardo Moon exigiu que vítimas ficassem dentro do veículo em tentativa de abordagem, que aconteceu sem ele se identificar formalmente como policial rodoviário federal
Pelo menos uma das três ligações feitas pelo policial rodoviário federal Ricardo Hyun Su Moon, 47 anos, confirmou versão dada inicialmente pelos dois amigos sobreviventes do empresário Adriano Correia do Nascimento, 33, no caso do último dia 31 de dezembro.
A informação foi revelada na manhã desta terça-feira (17) pela delegada Daniela Kades, responsável pela investigação do caso, durante a confirmação de que Moon, chamado de ‘Coreia’ pelos amigos policiais, foi acusado pelo assassinato intencional do empresário e a tentativa de homicídio das duas testemunhas após a conclusão do inquérito.
Segundo Kades, na segunda ligação de ‘Coreia’ ao Ciops (Centro Integrado de Operações de Segurança), realizada por volta das 5h54 daquele dia, é possível ouvir as vítimas ao fundo da ligação pedindo para que “ele mostre.”
“Não fica claro se é o distintivo ou a funcional, mas ele interrompe a conversa com o policial (militar) no telefone e responde às vítimas que iria mostrar”, disse a delegada. Os áudios não foram reproduzidos para a imprensa.
A versão é a mesma dada pelos sobreviventes, um supervisor comercial, de 48 anos, e seu filho, de 17. Em seus depoimentos formais e relatos sobre o ocorrido, enfatizaram que em nenhum momento ‘Coreia’ confirmou sua identificação como policial.
Conflito – Ainda segundo a delegada, Moon faz a primeira ligação à Polícia Militar por volta das 5h50. Nervoso, diz que precisa de reforço porque “são três contra um”, da presença do Batalhão de Trânsito e que levem um bafômetro “por ter um cara alcoolizado que lhe fechou.” Durante essa chamada, Moon teria dito várias vezes para as vítimas “não saírem do carro.”
A última ligação de ‘Coreia’ aconteceu às 6h01, quando Nascimento já está morto e seu veículo colidido em um poste.
Segundo as testemunhas ouvidas pela polícia, não houve briga ou discussão de trânsito ou colisão em buracos na avenida Ernesto Geisel. “Todos falam a mesma coisa, que na altura da rua 26 de Agosto, o acusado vinha em alta velocidade e a vítima não teria como vê-lo por ser um trecho de curva”, disse Kades.
A delegada diz que as oitivas das 20 testemunhas serviram para traçar a idéia do que aconteceu entre a penúltima e última ligação de ‘Coreia’. “Foi uma tentativa de abordagem que levou aos disparos, mas não sabemos dizer o que aconteceu de fato. Fica apenas o confronto de testemunhos. Não houve perseguição”, alegou Kades. Segundo ela, Moon continua alegando que agiu em legítima defesa após tentarem lhe atropelar.
Finalização – O inquérito do caso, com 531 páginas, já foi encaminhado ao Ministério Público Estadual, mas segundo a delegada, alguns laudos, entre eles o da reconstituição feita no último dia 11, não foram finalizados. Kades diz que a Polícia Civil irá encaminhá-los aos promotores responsáveis pela denúncia à Justiça serão anexados posteriormentes.
“Tivemos que cumprir o prazo de dez dias para encaminhar os autos ao MPE. O restante das provas serão anexadas conforme elas ficarem disponíveis”, disse a delegada.
O advogado de ‘Coreia’, Renê Siuf, disse ao Campo Grande News que ainda não teria tido acesso à acusação formal da Polícia Civil, que está em São Paulo (SP) e se integraria sobre o caso apenas na próxima quinta-feira (19).
O caso - Moon permanecerá na carceragem na sede do Garras (Delegacia Especializada e Repressão a Roubos a Bancos, Assaltos e Sequestros), onde está preso desde o último dia 5, quando a Justiça voltou atrás de sua própria decisão inicial de conceder liberdade provisória ao acusado no dia ocorrido e acatou o pedido de prisão preventiva feito pelo MPE.
O ato virou motivo de discórdia entre a Ordem dos Advogados do Brasil de Mato Grosso do Sul e a Justiça, com troca de desabafos por meio de notas oficiais das associações correspondentes.
Conforme foi recapitulado pela perícia em reconstituição realizada no último dia 11, Ricardo Hyun Su Moon conduzia sua Mitsubishi Pajero prata naquela manhã em sentido à rodoviária, onde embarcaria para Corumbá (a 419 km de Campo Grande), seu posto de trabalho na PRF. Após uma suposta briga de trânsito, ele atirou sete vezes contra a Hilux branca do empresário.
Nascimento, dono de dois restaurantes japoneses na cidade, morreu na hora, perdeu o controle do veículo e bateu em um poste. Um jovem de 17 anos que o acompanha foi baleado nas pernas. Outro acompanhante no veículo, um supervisor comercial, de 48, quebrou o braço esquerdo e sofreu escoriações com a batida. Ambos foram socorridos conscientes.
O policial ficou no local do crime e chegou até a discutir com uma das vítimas, mas não foi preso na ocasião, mesmo com a presença da PM. Posteriormente, ele acabou sendo indiciado em flagrante ao comparecer na delegacia com um advogado e representante da PRF.
Em seu depoimento, Moon disse que agiu em legítima defesa. Afirmou que as vítimas não o obedeceram mesmo após ele se identificar como policial, que tentaram lhe atropelar ao fugir dele e que viu um objeto escuro que poderia ser uma arma na mão de uma das vítimas. Repetiu a alegação durante a reconstituição e foi confrontado pelas duas testemunhas sobreviventes.
Atendendo pedido também feito pelo MPE, a Corregedoria da Polícia Militar e a Sejusp (Secretaria Estadual de Justiça e Segurança Pública) abriram inquérito para investigar se houve favorecimento a ‘Coreia’ por parte dos PMs que atenderam a ocorrência. A Corporação não se manifesta sobre o assunto.