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Capital

"Maníaco do Segredo" tinha 2 faces: uma para as vítimas, outra nos depoimentos

João Leonel da Silva atuou por mais de uma década, com prisões e solturas, na região do Bairro Nova Lima, em Campo Grande

Marta Ferreira | 10/05/2020 16:27


Trecho de depoimento de mulher vítima do "Maníaco do Segredo", que consta de ação criminal contra ele. (Foto: Reprodução de processo))
Trecho de depoimento de mulher vítima do "Maníaco do Segredo", que consta de ação criminal contra ele. (Foto: Reprodução de processo))

Para as vítimas, algoz agressivo, capaz de ameaçar, constranger, falar impropérios, cometer violência sexual, e atirar para matar quando suas ordens, sob ameaça contínua, não eram cumpridas ou algo dava “errado”. Nos interrogatórios policiais e da justiça, homem calado, pouco afeito a sustentar o olhar com o interlocutor, e que se afirma o tempo todo inocente das acusações de assalto, estupro, tentativa de roubo seguido de morte e um latrocínio consumado.

São dois “lados” da personalidade de João Leonel da Silva, 40 anos, preso há quase 4 anos, e identificado  apenas recentemente como o acusado de matar com três tiros um dos alvos de seus ataques a casais, em fevereiro de 2016.

Por causa dos crimes com aspectos de violência sexual sempre presente, ficou conhecido no meio policial como “Maníaco do Segredo”. A suspeita é de ter agido impunemente por mais de década, apesar das prisões ocorridas nesse período.

Sete boletins de ocorrência e uma prisão temporária, em 2009, fazem parte da ficha do “serial rapist”, termo em inglês para estuprador em série.  O perfil traçado é típico de malfeitores em série: organizado, capaz de planejar ataques de forma minuciosa, sem deixar rastros. Pelo que foi apurado, o “Maníaco do Segredo” saia de casa com luvas, usava preservativo, e fazia as vítimas caminharem a esmo ou entrarem na água para eliminar vestígios de esperma. Também mudava a voz e agia sempre “mascarado”, com roupas escuras e largas.

Fim da caça - Só quando ocorreu essa prisão de agosto de 2016, João Leonel foi reconhecido por uma das vítimas, diante de quatro suspeitos na delegacia. As roupas, o gestual, os olhos claros, deram “cem por cento de certeza” à vítima, como consta em processo. A jaqueta escura apreendida na casa de João Leonel faz parte das provas.

A mulher, de 25 anos à época, foi roubada e abusada sexualmente pelo bandido, junto com o namorado, por sua vez baleado gravemente. Ele quase morreu. Ficou em coma cinco dias e internado quatro meses. Decidiu ir embora do Estado.

Por esse ataque, o “Maníaco do Segredo” cumpre pena de 28 anos, por roubo majorado e estupro. A pena é alta porque foram julgados dois episódios criminosos no mesmo processo, esse já citado e outro de março de 2016, igualmente contra namorados que pararam para fazer sexo dentro do carro em rua erma do Bairro Nova Lima.

Depois da captura de João Leonel pela última vez, nenhum episódio semelhante foi registrado na polícia, o que evidencia, para as autoridades, a identidade do “Maníaco do Segredo”. A alcunha está relacionada à região onde ele cometia os ilícitos, no entorno da

Mata do Segredo, na região Norte da cidade.

Palavras pesadasO Campo Grande News esmiuçou esse processo. Responsável pelo reconhecimento que colocou João Leonel na cadeia, a última vítima, hoje com pouco mais de 28 anos, relatou o ataque por três vezes à Polícia Civil, além de outra oportunidade  policiais militares, no dia dos fatos,  e ainda no depoimento em juízo na 1ª Vara Criminal, onde o processo correu.

O relato dela é horas de pavor, iniciadas com um prosaico lanche de domingo e encerradas na madrugada, de camiseta, pedindo socorro no posto policial da região, após o acompanhante ser atingido a tiros e ela mesma ver a morte de perto. O acompanhante, com quem se relacionava havia dois meses, foi baleado no abdome e no abraço. Tudo aconteceu no trecho final da Rua Zulmira Borba, aos fundos de frigorífico abandonado. Por ali, além de casais à procura de privacidade, havia a fama de ser local de desova de corpos.

Mãos algemadas de João Leonel da Silva, preso em agosto de 2016, e que agora cumpre pena por roubo majorado e estupro. (Foto: Arquivo/Campo Grande News)
Mãos algemadas de João Leonel da Silva, preso em agosto de 2016, e que agora cumpre pena por roubo majorado e estupro. (Foto: Arquivo/Campo Grande News)

Em seus relatos, a mulher conta que, estava no carro com o namorado, quando o “Maníaco”, com o rosto coberto, bateu na janela do carro, e anunciou primeiro o assalto. Pegou o dinheiro em poder deles e os celulares. Ainda perguntou quanto valiam os aparelhos.

Depois os obrigou a descer do veículo, sempre de arma em punho, a ficar deitados no chão, a manter relações sexuais, enquanto o criminoso parecia se masturbar e filmar a cena. Quando percebeu a tentativa dos dois de fugir, João Leonel atirou no rapaz, diz a vítima. Em dado momento, chegou a colocar o revolver 38 na cabeça da jovem e simular disparo.

A moça, depois de escapar, ainda ouviu pedido de socorro do namorado, mas por instinto de salvação, correu até onde pode, até achar socorro. Ao contrário do silêncio nos depoimentos oficiais, no dia o criminoso não poupou palavras, contou a vítima. “Quem é que está mandando nessa p” é uma das frases atribuídas a ele.

Depois dos tiros, enquanto a vítima fugia, afirma ter ouvido de João Leonel a frase ameaçadora: “Eu já matei ele, sua vagabunda, vou matar você agora”.

A reportagem localizou a moça, por meio de conhecida. Ela não quis conversar. O trauma persiste até hoje e a decisão foi de respeito à vítima. A outra mulher não foi localizada.

João Leonel tem condenações, ao todo, até 2032. Ele cumpre pena na ala dedicada aos criminosos sexuais, os “jacks”, no IPCG (Instituto Penal de Campo Grande), na saída para Três Lagoas. Representado por defensor público, sempre alegou inocência. Alegou ter saído de casa no domingo do ataque o levou à prisão só para comprar cerveja e “andar até dar sono”.

Tnterrogatório de João Leonel na Polícia Civil. (Arte: Thiago Mendes)
Tnterrogatório de João Leonel na Polícia Civil. (Arte: Thiago Mendes)


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