“Minha parceira de vida”, relembra mãe sobre filha de 11 anos estuprada e morta
Emocionada, mãe admitiu trabalhar como prostituta para sustentar filhos e pediu "perdão" por falhar como mãe
“Era muito inteligente e me ajudava muito. Minha parceira de vida”. A audiência já caminhava para o fim, quando o juiz Aluízio Pereira dos Santos, da 2ª Vara do Tribunal do Júri, decidiu perguntar para a mulher, de 39 anos, presa preventivamente desde o assassinato da filha, de 11 anos, se ela não achava perigoso deixar a menina sozinha em casa, cuidando dos dois irmãos – de 10 meses e 3 anos. Pela resposta, a mãe já não tratava mais a filha como uma criança, mas pediu perdão por ter falhado com a pequena, conhecida no Bairro Nossa Senhora das Graças, em Campo Grande, como “Estrelinha”.
Em depoimento emocionado, a mãe admitiu trabalhar como prostituta para sustentar os filhos e disse que embora recebesse auxílios do governo – um total de R$ 950 –, o dinheiro não era suficiente para pagar o aluguel, água, luz e colocar comida na mesa. Disse que o assassino confesso da filha, Maykon Araújo Pereira, 31 anos, era seu cliente e conhecia “Estrelinha”.
A mãe negou, porém, que fizesse programas “na frente das crianças”, como, segundo ela, comentaram pelo bairro. Afirmou que recebeu Maykon em casa durante a madrugada, mas diz ter certeza que os filhos dormiam. A maioria dos encontros acontecia quando a menina e o irmão do meio estavam na escola.
O dia do crime - Quando questionada sobre o dia do assassinato de “Estrelinha”, a mulher relatou o mesmo que já tinha dito à polícia. Saiu de casa entre 15h e 16h, em busca de “dinheiro” para comprar comida. Ela tinha dois aluguéis atrasados, a água cortada e a despensa vazia.
Admitiu que estava em um bar, ingerindo bebidas alcoólicas. “A culpa foi da bebida. Perdi a noção da hora. Não sei se o senhor sabe, mas toda mulher de programa tem de beber para atrair os clientes”, afirmou ao magistrado.
Nesse meio tempo, Maykon procurou a garota de programa e se deparou com as crianças sozinhas. Segundo o delegado-adjunto da DEPCA (Delegacia Especializada de Proteção à Criança e ao Adolescente), Roberto Carlos Morgado, que também prestou depoimento na tarde desta terça-feira (16), avisado pela menina que a mãe só voltaria mais tarde, o réu chegou a deixar a casa, mas voltou minutos depois, para invadir a residência e estuprar a criança.
Em solo policial, Maykon negou o estupro, afirmando que “apenas passou a mão” na criança. Culpou a bebida por ter decidido entrar na casa, alegando que a porta estava aberta e afirma que se assustou quando a “Estrelinha” começou a gritar. Narrou ainda que com um soco a menina teria caído no chão e morrido.
Morgado diz não acreditar na versão do réu. “Se aproveitou das circunstâncias. Tenho certeza que o assassinato foi para encobrir o estupro”.
O delegado afirmou ainda que laudos comprovam que antes de morrer, “Estrelinha” sofreu “violência sexual grave”.
Esperança - A mãe da garota acrescentou mais um detalhe ao depoimento. Disse que quando entrou na cozinha e viu a filha caída em meio a uma poça de sangue, teve esperança de que a menina estivesse viva, por isso, chamou o Corpo de Bombeiros. O Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) e a PM (Polícia Militar) chegaram, e a mulher saiu presa do local. Por isso, quase 24 horas depois, alimentava a ideia de que a filha havia sido socorrida. Depois de muito insistir, um policial civil contou que “Estrelinha” estava morta.
Respondendo pelo crime de abandono de incapaz desde então, a garota de programa não pôde ir ao velório da filha. “Não consegui nem me despedir da minha filha”.
Nesta tarde, a mãe da vítima não chegou a ficar frente a frente com o réu, que preferiu não falar em juízo, mas deixou mensagem para ele. “Queria entender por que fez aquilo. Sempre tratei muito bem e ele destruiu a minha vida. Só a minha não. Da minha filha também. Mesmo que eu tenha de pagar na Justiça, ele também vai”.
“Estrelinha” foi assassinada em casa, na noite do dia 11 de dezembro de 2022, no Nossa Senhora das Graças, bairro do noroeste de Campo Grande. Ela foi encontrada caída no chão da cozinha, com sinais de agressão física e estupro. A perícia informou que a garota sofreu traumatismo craniano.
(*) A identidade da mãe foi preservada porque a filha tem direito ao anonimato, conforme previsão do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).