Morte a tiros em conveniência vira homicídio simples e revolta familiares
Dois homens vão a julgamento, porém, retirada de qualificadora pode reduzir possível pena, em caso de condenação
Arlei dos Santos Sorrilha foi morto a tiros, em 2017, após discussão em uma conveniência de Campo Grande. Dois anos depois do crime, a Justiça definiu que o caso vai a júri popular, porém, como homicídio simples, retirando a qualificadora que aumentaria a pena dos réus, em caso de condenação. A família recorreu ao TJ-MS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul) para reverter decisão.
A sentença de pronúncia de homicídio simples (artigo 121 do Código Penal), por enquanto, recai sobre o mecânico Giovane Oliveira Carvalho, 25 anos. O amigo, o manobrista Anderson Henrique de Almeida, 27 anos, responderá por favorecimento pessoal (artigo 348 do Código Penal).
Pela denúncia apresentada pelo MPE (Ministério Público Estadual), Arlei foi morto com cinco tiros (dois no peito e três nas costas) após briga ocorrida durante a madrugada de 2 de dezembro de 2017, em conveniência na Rua Euclides da Cunha.
Consta que Anderson e Giovane pararam no local para comprar bebida e, quando Anderson dava ré para ir embora, quase atingiu Arlei, que voltava do banheiro e passava por trás do veículo.
Segundo testemunhas, Arlei começou a discutir com Anderson que pediu desculpas. O segurança do local pediu para que Arlei saísse de perto, já que o motorista já tinha falado que foi sem querer. Pela denúncia, consta que os amigos tiraram a vítima de perto, mas que Giovane teria gritado “Ué, você não é o brabão? Tá fugindo por quê?”.
Nesse momento, Arlei se desvencilhou dos amigos e retornou na direção do carro, momento que Giovane pegou a arma que estava no porta-malas e atirou. Em seguida, ele e Anderson fugiram e, somente no dia seguinte, os dois se apresentaram à polícia.
Em depoimento, Giovane disse que toda a ação foi muito rápida, mas que agiu em legítima defesa, já que Arlei veio em direção ao carro, fazendo gesto que poderia indicar que estava armado. A arma que Giovane usava, revólver calibre 22, havia sido comprada no Paraguai semanas antes, depois que ele sofreu tentativa de assalto.
Na fase inicial, o MPE havia oferecido denúncia somente como homicídio simples, mas, no decorrer do processo, pediu aditamento da denúncia, para inclusão da qualificadora do recurso que dificulta chance de defesa da vítima, além de correção do calibre da arma usada por Giovane.
O juiz Carlos Alberto Garcete, da 1ª Vara do Tribunal do Júri recebeu o aditamento, mas, na sentença final de pronúncia. A defesa de Giovane contestou, alegando que não houve elemento surpresa que caracteriza a qualificadora, já que houve discussão prévia e, em seguida, a ação de legítima defesa do réu.
No caso da defesa de Anderson, foi pedida que ele fosse absolvido do homicídio, já que ele não teve participação no episódio, sendo “decisão monocrática de Giovane”.
Na sentença final de pronúncia, de 9 de abril, o juiz determinou que Giovane responda por homicídio simples e Anderson, por favorecimento pessoal, por ter ajudado na fuga. Sobre homicídio, o magistrado avaliou que ele não teve relação com a decisão do outro réu em atirar na vítima. O MPE entrou com recurso no TJ-MS no dia 27 de maio, ainda sob análise.
O advogado Márcio Sandim, da assistência de acusação, explicou que a decisão pode reduzir a pena de Giovane, em caso de condenação, passando de 6 a 20 anos, podendo ter acréscimo por conta do porte de arma. Se fosse mantida a qualificadora, seria de 12 a 30 anos.
A diarista Iracema dos Santos, 62 anos, mãe de Arlei, acompanha com expectativa o julgamento do recurso. “Eu só quero justiça, meu Deus”. Depois da morte do filho único, voltou a trabalhar de diarista para ajudar a pagar as contas de casa. O marido, Heitor Sorrilha, 65 anos, é pedreiro e está desempregado. “Sinto falta do meu filho, todo dia, enquanto os assassinos estão bem tranquilos, nem passaram na porta da cadeia até hoje”.
A reportagem tentou entrar em contato com a defesa dos réus, mas não obteve retorno.