Repasses estão em dia, mas Santa Casa suspende transplantes de rim
Santa Casa enfrenta sua maior crise desde que sofreu intervenção do Poder Público, entre 2005 e 2013
Com as cirurgias eletivas paradas desde 10 de fevereiro, a Santa Casa enfrenta, talvez, sua maior crise desde que voltou às mãos da ABCG (Associação Beneficente de Campo Grande), em 2013, após intervenção estatal em 2005. O repasse de recursos públicos estão em dia, mas o hospital enfrenta desabastecimento de materiais e remédios, além da perda de profissionais, que estão sem receber salário. Consultas em urologia estão paradas, o que suspendeu os transplantes de rim.
RESUMO
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A Santa Casa de Campo Grande enfrenta uma grave crise, com cirurgias eletivas suspensas desde fevereiro devido à falta de materiais e medicamentos, além de atrasos salariais. Apesar dos repasses públicos estarem em dia, o hospital sofre com desabastecimento e perda de profissionais. A situação levou médicos a procurarem o Ministério Público, que investiga o caso. A direção do hospital alega desequilíbrio financeiro e busca soluções emergenciais, enquanto negocia novos contratos com a prefeitura. A crise afeta diretamente pacientes que aguardam cirurgias e transplantes, aumentando o risco à saúde.
Médicos do hospital procuraram o MPMS (Ministério Público de Mato Grosso do Sul) e se reuniram em 10 de fevereiro com a 32ª a 76ª Promotorias que lidam com assuntos de saúde. Na data, relataram falta de materiais para realização de cirurgias, como capotes, escovas para higienização de mãos, máscaras, marcapassos, hastes de fêmur, entre outros.
Disseram ainda sobre a saída de profissionais, sendo que a “falta de condições de trabalho ocasionou a suspensão de ambulatórios e cirurgias eletivas de diversos serviços, citando-se a ortopedia, cirurgia plástica, cirurgia cardiovascular e urologia (inclusive transplantes). A cirurgia geral ficou paralisada entre agosto de 2024 a 27/01/2025.”
Sem o atendimento ambulatorial, pacientes que precisam de cirurgia, ou mesmo transplantes, não podem ser avaliados para passarem pelos procedimentos. O Campo Grande News mostrou a ausência de cardiologista pediátrico no final de janeiro e conforme o inquérito do MPMS em andamento, a situação continua. No último dia 17, foi noticiada a suspensão das cirurgias eletivas.
Segundo dados do inquérito, as consultas ambulatoriais com urologista devem ter sido retomadas em 10 de fevereiro, o que não foi confirmado pela reportagem neste fim de semana.
Outro problema apontado pelos profissionais da Santa Casa que procuraram as promotorias foi o prolongamento de internações devido a demora nas cirurgias, ocasionada pela ausência de materiais e insumos para realizá-las. Eles são, em maioria, chefes de setor.
“Outrossim, a segurança dos pacientes poderá estar prejudicada pela falta de materiais, tal realidade não apenas afeta diretamente a saúde dos pacientes, como também aumenta o tempo de internação e prejudica o giro de leito hospitalar. (...) Mais alarmante ainda, o risco iminente à vida dos pacientes que aguardam cirurgias urgentes não pode ser ignorado. A não realização dos procedimentos necessários em tempo hábil pode resultar em agravamento dos quadros clínicos dos pacientes, incluindo o risco de morte devido à demora nos tratamentos indispensáveis”, alertaram.
Por fim, eles sustentaram a necessidade de transparência por parte da atual diretoria do hospital, “com planejamento atual e futuro, melhores condições de trabalho com pagamento dos salários em atraso, além do reabastecimento dos medicamentos, insumos e conserto de equipamentos danificados, de forma a possibilitar uma melhor assistência ao paciente.”
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Depois disso, em 19 de fevereiro, o MP se reuniu com a direção do hospital e com a Sesau (Secretaria Municipal de Saúde). A presidente da unidade hospitalar, Alir Terra confirmou os problemas, enfatizando que há um desequilíbrio econômico-financeiro na contratualização entre o hospital e o município, cujo valor não é reajustado há três anos. Disse também que não há acordo em relação aos valores dessa contratação, que está em análise desde julho do ano passado.
O desequilíbrio seria de R$ 13,2 milhões mensais, isso em 2024, sendo que naquele ano, a Santa Casa fechou com déficit de R$ 158,8 milhões. Disse ainda que entre os anos de 2022 a 2024 houve o aumento de R$ 93 milhões nas despesas com pessoal, decorrente de ações trabalhistas e que foi feito empréstimo para arcar com a situação, sendo este insuficiente. A dívida com médicos em regime de pessoa jurídica chega a R$ 15 milhões.
“Que para adquirir materiais essenciais, estão buscando outros fornecedores e por vezes os insumos adquiridos não são submetidos à Comissão de Padronização do Hospital, mas tão somente à Direção Técnica e ao Comitê de Crise instalado para enfrentamento da atual situação. O Comitê é formado pela Diretoria Técnica, Gerente Médico, almoxarifado, setor de compras e farmácia, e tem por objetivo otimizar a alocação de recursos, remanejar pacientes e priorizar áreas críticas”, revela a ata da reunião.
Terra confirmou ainda o uso do centro cirúrgico como leito de UTI (Unidade de Terapia Intensiva), porque 12 leitos do CTI do Hospital do Trauma estão desativados pela falta de ar condicionado. A peça necessária para conserto, no valor de R$ 100 mil já teria sido solicitada e em até 90 dias o conserto será realizado.
Presente no dia, a secretária municipal de saúde, Rosana Leite disse apenas que “a análise de metas para o novo contrato já está finalizada, mas ainda estão em discussões para ajuste dos valores a serem repassados ao hospital” e que a “previsão de assinatura de novo documento de contratualização é até o fim do mês de março/2025.”
A promotora Daniela Cristina Guiotti, do NAES (Núcleo de Apoio Especial à Saúde) citou a preocupação real com a situação, alegando que acompanha há anos a “contratualização entre a Santa Casa e o poder público há vários”, mas avalia que “diferentemente de crises anteriores, em que os repasses dos poderes públicos estavam em atraso, na atual crise os repasses estadual e municipal estão em dia, o que indica que outros fatores estão contribuindo para a situação.
Ela indicou ainda ausência de transparência nos repasses, especialmente em relação às emendas parlamentares e destacou duas situações que exigem atenção: a necessidade de garantir a assistência dos pacientes e o regular funcionamento do hospital, com a prestação dos serviços para os quais é habilitado e a necessidade de garantir a transparência na gestão dos recursos do novo contrato.
Com isso, nova reunião deve ser realizada ainda este mês, contanto ainda com a presença do secretário estadual de saúde, Maurício Simões e detalhamentos dos gastos do hospital. Em 2024, a Santa Casa fechou o ano com R$ 31,9 milhões em receita por mês e gastos de R$ 45,2 milhões, também mensalmente.
A reportagem acionou a assessoria do hospital por e-mail neste domingo, e aguarda retorno.
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