Defendido por Reinaldo, fechamento de fronteiras tem apoio de ministro do STJ
Corregedor nacional da Justiça Federal apoia iniciativa e pede modernização de leis; já ministro aposentado da Corte aponta impunidade como real inimiga
Como não poderia ser diferente, o enfrentamento ao crime organizado e suas consequências para a sociedade brasileira é unanimidade entre os participantes do Seminário sobre Crimes de Fronteira e o Combate à Lavagem de Dinheiro, realizado no auditório do Fórum da Justiça Federal em Campo Grande. Contudo, é nos meios pelos quais tal ação deve ser realizada que surgem divergências entre operadores do Direito, as quais, espera-se eventos do gênero ajudem a afastar. Entre elas está a proposta do governador Reinaldo Azambuja (PSDB) visando ao fechamento das fronteiras brasileiras, que ecoa entre juristas brasileiros.
Durante a abertura do evento, no início da noite desta quinta-feira (19), Reinaldo não abordou diretamente o tema –diferente do que ocorreu em encontro de governadores do Brasil Central e do Codesul (Conselho de Desenvolvimento e Integração Sul), no qual destacou que a blindagem dos acessos internacionais brasileiros é medida essencial para dar fim ao avanço do crime organizado que, por sua vez, assiste à “degradação da segurança pública”, como salientou o governador.
Corregedor nacional da Justiça Federal, o ministro Raul Araújo, o STJ (Superior Tribunal de Justiça) foi ao encontro da proposta de Reinaldo, incluindo aí a instituição de leis próprias para a região de fronteira. “Sem dúvida deve haver uma legislação específica para essa delicada questão. Não podemos ter fronteiras abertas, nenhum país as têm. Há de ter controle tanto da área de segurança como da fazendária, aduaneira, para evitar contrabando e outras ocorrências ainda piores, como o tráfico”, afirmou a jornalistas.
Araújo, nessa linha, mostrou-se favorável ao aprimoramento do sistema legal brasileiro, como forma de acompanhar ações que a criminalidade já realizada. “O crime organizado já faz isso, se aprimora, inova a cada dia, buscando oportunidades e vislumbrando outras chances de ação. O poder público, Estados, Brasil e países vizinhos têm de fazer o mesmo: aprimorar legislações para que estejamos sempre coibindo de forma eficiente as ações do crime de fronteira”.
Impunidade – Em um polo oposto, o ministro aposentado do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e ex-corregedor-geral de Justiça, Gilson Dipp, afirma ser contrário ao fechamento da fronteira. “Não há como fechar fronteiras para controlar só os criminosos. O Brasil estaria ilhado de seus vizinhos”, afirmou, apontando que diferentes organizações, incluindo empresas públicas, são hoje usadas para o tráfico –citando, por exemplo, apreensões de armas e drogas em encomendas transportadas pelos Correios.
Dipp também considera que o sistema legal brasileiro tem condições de sufocar o crime organizado, desde que seja efetivamente aplicado. Para ele, é em outro aspecto que está o problema. “O excesso de leis e o aumento de penas não resolvem a situação. O pessoal tem medo pé da impunidade, que não se combate com essas medidas. Temos um arcabouço legal satisfatório para o tratamento de todos os crimes”, destacou o ministro aposentado.
Para ele, gradativamente, agentes da Justiça têm dado conta da questão. “O alto escalão do Judiciário, o Ministério Público, a Polícia Federal, todos estão avançando. Operações como a Lava Jato (que apura esquemas de corrupção no governo federal) eram impensadas há alguns anos. É preciso investigação, controle do Banco Central, da Receita Federal e do Judiciário para que tenhamos a coragem de enfrentar”, pontuou Dipp, advertindo: “o Judiciário não combate o crime, ele julga quem eventualmente o praticou”.
Debate – As opiniões do corregedor e de Dipp convergem quanto a importância do debate sobre tema. O corregedor federal destaca, por exemplo, que a segurança pública “é o maior problema do Brasil na atualidade”. “Temos um crime cada vez mais organizado e que ignora as fronteiras, enquanto órgãos e entidades públicas tem a formalidade de combaterem suas ações nos seus respectivos territórios”, pontuou, reforçando “a necessidade de se debater a possibilidade de integração entre forças de segurança de cada país e o Judiciário, para que haja integração de forma a combater aquilo que o crime faz com a sociedade, que possamos fazer em favor dela”.
“Todo e qualquer debate é bem-vindo. Debatemos isso há muito tempo sem termos soluções satisfatórias, mas essa discussão é muito importante e dá segurança aos outros atores, Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Civil e outras. Os crimes de fronteira são todos graves, refletem no subsequente, que é a lavagem de dinheiro, e temos de os enfrentar com coragem e determinação, mas sem retórica”, finalizou o ministro aposentado.
Evento – O seminário foi aberto no auditório da Justiça Federal o com pronunciamento da ministra Laurita Vaz, presidente do STJ, e do governador Reinaldo Azambuja (PSDB). Depois, Raul Araújo, coordenador do evento, fez a abertura e passou a palavra a Dipp, primeiro palestrante. A presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, Therezinha Cazerta, também participou da solenidade, entre outras autoridades.
O evento terá continuidade nesta sexta-feira (20), com palestras abordando temas como tráfico de drogas, colaboração premiada, Lei de Migração, crime organizado e criação de normas penais. O evento, voltado para juízes, advogados, estudantes e demais interessados, será encerrado às 17h.