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Comportamento

Aluno morreu e virou ipê na porta da faculdade para lembrar a vida

Coordenador e alunos fizeram homenagem em memória ao amigo que perdeu a vida para depressão

Thailla Torres | 11/03/2022 09:01
Árvore é um ipê amarelo que sempre que florescer vai lembrar Matheus e a vida. (Foto: Tiago Botelho)
Árvore é um ipê amarelo que sempre que florescer vai lembrar Matheus e a vida. (Foto: Tiago Botelho)

Cada árvore plantada na FADIR (Faculdade de Direito e Relações Internacionais) da Universidade Federal da Grande Dourados, sem dúvidas, é preciosa. No entanto, na semana passada, um ipê amarelo ganhou novo significado para quem o plantou e frequenta a instituição de ensino. A muda ganhou morada na terra em homenagem ao aluno Matheus Venâncio, de 21 anos, vítima da depressão.

Matheus morreu na noite do dia 27 de fevereiro, dois dias antes da consulta agendada com psicólogo e sete dias depois de um claro pedido de ajuda à família para vencer a doença. Os mais próximos se uniram e estavam confiantes de que veriam o menino, que sempre amou o sol, reencontrar a calmaria dentro do coração. Não deu tempo.

Por isso, mais que uma nota de pesar, o professor e coordenador do curso de Direito da universidade, Tiago Botelho, se comprometeu a plantar um ipê amarelo na faculdade e nele, gravar o nome do aluno e, mais importante, intensificar campanhas contra a depressão junto aos que ficaram, para que outros alunos e familiares encontrem caminho contrário à tragédia que é perder um ser humano para o suicídio.

Sem dúvidas, a homenagem foi um alento ao coração da família, que em meio à imensa dor, ainda busca respostas e conforto. A escolha do ipê amarelo foi inspirada no apreço de Matheus pela cor e também por simbolizar a cor que faz parte de campanhas de prevenção ao suicídio.

O ipê foi plantado pelo professor, alunos e outros colaboradores da faculdade. O momento trouxe ainda o retrato do menino com coração cheio de sensibilidade, homenagem em forma de música e a declamação do poema Árvore, de Manoel de Barros.

Muda quando chegou à universidade para ser plantada e lembrar Matheus. (Foto: Tiago Botelho)
Muda quando chegou à universidade para ser plantada e lembrar Matheus. (Foto: Tiago Botelho)

Apesar da dor e saudades inexplicáveis no peito, a irmã Simone Venâncio se lembra do irmão que tinha sede de fazer a diferença no mundo. “Matheus era um gênio. Todos que conversavam com ele ficavam admirados. Sempre foi um menino cheio de vida, que amava o sol, aliás, ele nunca deixava de tomar sol, amava água de coco, gostava de reforçar à família a importância de cuidar da saúde. Era impossível imaginar que um dia ele pudesse ter depressão.”

Matheus nasceu quando Simone tinha 14 anos. Era ela quem ajudava a mãe a cuidar do irmão pequenininho, com todo amor do mundo. Dessa forma, eles tiveram uma conexão única. “Era mais que um irmão, um grande e melhor amigo.”

Simone trabalha há algum tempo na área da saúde, entende e presencia histórias onde a depressão se instala sem pedir avisos, mesmo assim, foi surpreendida. “Quando se trata de algo dentro da sua casa, o sentimento é inexplicável”, desabafa.

Por isso, para Simone, a ideia do professor colocada em prática gerou uma emoção gigantesca. “Foi muito bonita essa homenagem”, diz. “Ainda que Matheus não volte, é muito significativo saber que ele sempre foi querido e admirado. Mais importante ainda saber que a universidade está disposta a falar sobre um assunto tão importante.”

Sobre o que fica do irmão, Simone é enfática: “Fica tudo e um amor por ele inexplicável”.

Matheus faleceu no dia 27 fevereiro, aos 21 anos. (Foto: Arquivo Pessoal)
Matheus faleceu no dia 27 fevereiro, aos 21 anos. (Foto: Arquivo Pessoal)

A luta continua - Já para o professor, a despedida também é dolorosa. “O desejo de todo professor é que seus alunos alcem voos e conquistem o mundo”, diz Tiago, que logo no primeiro dia de aula, viu na timidez de Matheus o desejo e a sagacidade de voar para bem longe. “Sua inteligência crítica e seu olhar atento me chamaram a atenção, portanto, lhe convidei para fazer iniciação científica. Ele tinha algo a mais”, acrescenta.

A homenagem, segundo Tiago, nasceu da vontade de vencer uma simples nota de pesar e mostrar aos familiares o quanto Matheus era querido e importante para a faculdade. Além disso, fortalecer o diálogo sobre a depressão na universidade.

“Para o professor, é muito difícil. Nessa relação, eu me coloco no local de docente, de transmitir um conteúdo de responsabilidade. Acompanhando esse percurso, ficamos com a impressão que poderíamos ter feito diferente ou ter feito mais. Eu vi um pedido de ajuda, só que foram poucos dias e eu não consegui ajudar.”

O plantio do ipê se tornou então um ato de respeito e simbólico. “A cada momento que ele florescer, vai lembrar que precisamos fazer novas ações, para uma doença que tem cura e tratamento, mas ainda é tratada com muito desdenho pela sociedade brasileira.”

O professor diz que vai lutar para firmar convênios e assim, garantir descontos para alunos que precisam de profissionais da saúde, além de realizar palestras que remetem ao tema. “Não podemos agir só depois que alunos vão a óbito”, diz. “É necessário medidas agora, ainda mais na sociedade do cansaço, lembrando que é preciso ter mais cuidado com as pessoas, falar de uma doença tão menosprezada e voltar o olhar para a vida”, finaliza.

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