Após o filho morrer, até almoçar na calçada com novo marido tem valor
Rosângela e Ramão se encontraram depois de casamentos ruírem, mas agora são inspiração sobre envelhecer juntos
Almoçar fora no domingo é tradição para Rosângela e Ramão, mas na calçada de casa, no Bairro Coronel Antonino. Quem passa pela Rua Catanduvas recebe o convite para sentar, como se todo mundo fosse da família. Em um domingo, foi só estacionar o carro para o dono da casa “intimar”: “Vem comer com a gente”.
Mas o interesse maior não era pelo macarrão com linguiça que, realmente, pareciam deliciosos. A cena foi o que chamou atenção. Os dois, sorrindo muito, conversando, comendo, dividindo um copão de suco de laranja, na fachada da casa simples, sob uma grande árvore que refresca toda a esquina.
O amor fica claro em poucos minutos. É só um olhar para o outro que a risada começa. Mas o caminho juntos começou dolorido. Rosângela Faria dos Santos, hoje com 55 anos, tinha 34 quando perdeu o filho adolescente e recomeçou do zero por não suportar a tristeza. “Eu vivia pra ele, porque ele tinha deficiência. Quando ele morreu, eu perdi o chão”, diz.
Logo, o casamento se deteriorou, ela largou tudo e foi trabalhar como cuidadora de idosos. Foram mais 10 anos até encontrar Ramão, em um domingo, depois do dia pesado de trabalho para ambos.
Mas agora, todo domingo é assim: as cadeiras de corda vão para a fachada e os dois curtem o movimento. “É o único jeito de almoçar fora”, diz Rosângela, atualmente desempregada por conta de três fraturas no pé esquerdo.
Ramão Leandro da Silva sustenta a casa trabalhando na Ceasa, na mesma região onde moram hoje. Mas eles se conheceram a quilômetros dali, em dia de baile na Vila Margarida.
“Quem sabe a história em detalhes é ele”, diz a esposa, apesar dos dois preferirem dizer que são "amasiados". “Era um domingo, sei até a roupa que ela usava, um vestidão vermelho...”, completa ele.
Sem dinheiro, ele quase desistiu de ir a “Lanchonete da Nair”, na Vila Margarida, onde rolava o baile. Mas de pronto, Rosângela falou: “bem, dinheiro eu tenho”.
Os dois seguiram com amigos e música vai, música vem, foi ela ir até o banheiro para ele esperar na porta e quando Rosângela saiu... "eu lasquei um beijo nela”, lembra Ramão. No outro dia, ela ligou, marcou novo encontro em plena segunda-feira, os dois nunca mais se largaram e lá se vão mais 10 anos de convivência e almoços de calçada.
Ele acabava de sair de um casamento de 21 anos, em Rio Brilhante, e ela havia de separado do marido depois de 32 anos. Rosângela com 8 filhos, ele com 4, todos criados, agora, os dois dizem que querem é aproveitar a vida.
Antes da pandemia, era “baile direto, todo fim de semana”, conta ela. Agora, já começam a contagem regressiva para voltar à rotina animada. “Vou mesmo com pé quebrado, me arrastando. Eu adoro dançar”, garante Rosângela.