Bonecos surgem em aula para o respeito tomar lugar do preconceito
A professora encontrou nas páginas de clássicos da literatura infantil um meio de ensinar respeito e autonomia
A professora Elaine Eleuterio, 49, encontrou nas páginas de clássicos da literatura infantil um meio de unir educação e inclusão, e ensinar sobre diversidade, respeito e autonomia para os seus alunos da educação infantil.
Conforme explica a educadora, a dinâmica teve início em 2022, e a cada ano ela e os alunos estudam sobre um autor e um tema. Um detalhe interessante, é que a educação infantil é dividida por níveis, então a maioria dos alunos da turma de 2022, na época nível três, continuaram na escola até este ano, portanto, amadureceram junto com o projeto.
No decorrer do trabalho, Elaine conta que foi entrando mais crianças na turma, com outras particularidades, por conta disso este ano decidiu trabalhar o tema inclusão e diversidade, e o autor escolhido foi o Maurício de Souza, por conta da variedade de personagens e histórias.
Elaine explica que para tornar o projeto de leitura mais palpável, além das histórias ela decidiu fazer também bonecos dos personagens. Toda semana, às terças-feiras, uma criança é sorteada para levar os livros, os brinquedos e um caderno de relato para casa.
Os personagens protagonistas, destacados pela professora, foram o Papa Capim, de origem indígena, Milena (negra), André (autista), Hamyr (deficiente motor), Dorinha (deficiente visual), Humberto (deficiente auditivo) e Luca (cadeirante).
O intuito é que por meio dos gibis que contam histórias de cada um dos personagens, os alunos que apresentam alguma das deficiências se sintam acolhidos e representados, e os demais coleguinhas entendam a importância de respeitar e incluir as crianças que, de alguma forma, são “diferentes” delas.
A criança passa a semana inteira com o material, e a ideia é que os pais leiam as histórias para os filhos, e escrevam relatos para a professora, contando qual foi a história favorita, e como a criança absorveu a dinâmica. Ao final dos sete dias, o caderno de relatos volta repleto de observações e fotografias da dinâmica, que alguns pais fazem questão de imprimir e colar.
“Vejo que essas crianças serão diferentes na sociedade, irão incluir e saber lidar com o diferente. A Literatura tem sido um grande aliado nesse processo. Dentro das histórias contadas, eles conhecem a linguagem dos personagens, e tudo ao entorno desses personagens, trazendo curiosidade, envolvimento e interação num clima lúdico e cheio de significados. E nesse universo vão conhecendo novas palavras e aprendendo a escrever”, explica Elaine.
Educação através da literatura
Elaine conta que trabalha com os alunos português e libras, principalmente porque na turma tem uma aluna surda. Quando ela chegou na escola, a educadora relata que ela não sabia se comunicar através da linguagem de sinais, e por isso ficava acuada.
Introduzir este conhecimento aos alunos ajudou a criança a se integrar no ambiente escolar e a participar mais ativamente das atividades e interação com os colegas. “Ela não sabia nada de Libras, e hoje sabe seu nome em língua portuguesa e Libras, identifica todas as letras do alfabeto e números também. Essa questão da Libras tem sido muito forte lá na sala, porque eles se comunicam com ela com Libras”.
No decorrer destes três anos que trabalha com a turma, Elaine avalia que as dinâmicas ajudaram as crianças a ter mais autonomia e organização, além de se sentirem incentivados a consumir uma alimentação saudável.
A educadora conta que o primeiro personagem trabalhado com as crianças foi o Maneco Caneco chapéu de funil, do autor Luis Camargo. Na época, ela relata que as crianças não queriam se alimentar direito, então começou a introduzir a importância de uma alimentação saudável através das histórias do personagem, que literalmente saiu da cozinha.
Elaine conta que começou a trazer para a sala de aula diversos exemplos de uma alimentação saudável, e a incentivar os alunos a experimentar comidas novas. Para trabalhar a autonomia, sugeriu que, em vez das merendeiras servirem os pratos, os próprios alunos deveriam servir. “E foi um sucesso, porque eles tinham que comer tudo o que tinha ali, então eles começaram a experimentar [os alimentos] e comer melhor”.
Segundo a educadora, o tema de leitura deste ano tem gerado bastante aprendizado e interação entre os alunos, principalmente porque tem uma criança com autismo, e uma com vitiligo na turma. “Nós temos medo daquilo que não conhecemos, e a partir do momento que sabemos do que acontece ao nosso redor, vamos tendo uma melhor relação”, explica.
Relatos e feedbacks
Outros temas abordados pela professora no decorrer das aulas, foi sobre o motivo de algumas crianças serem carecas. Ela conta que levou as crianças na AACC (Associação dos Amigos das Crianças com Câncer), e explicou sobre a doença e o tratamento da quimioterapia para os alunos.
Uma semana depois da visita, ela relembra que uma das alunas, que tinha o cabelo enorme, chegou com o cabelo cortado no ombro. “A mãe dela falou, ‘prô, ela chegou em casa e ela falou que queria doar para as crianças que não têm cabelo’”, conta.
Elaine também conta sobre um aluno cujo os pais suspeitavam de um diagnóstico de autismo, pois a criança era muito tímida e tinha dificuldade de se comunicar. A grande questão, segundo a educadora, era que o garoto só convivia com adultos, por isso tinha dificuldade. Já no ambiente escolar, com auxílio dela, aprendeu a conviver com outras crianças e a se expressar.
“Agora ele fala de tudo, ele conversa, ele opina, ele questiona, ele participa de tudo, ele ensina a família Libras. E a família falou que depois que ele entrou para a escola, ele é outra criança. Que não é mais aquela criancinha que era mais fechadinha, que não tinha tanta autonomia”, finaliza.
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