Como fica a vida de quem precisou voltar pra casa na pandemia?
Muita gente precisou abandonar a independência e foi obrigada a voltar pra sua terra natal por conta da pandemia de covid-19
A pandemia atrapalhou os planos de todo mundo. Aquela viagem de férias previamente marcada, o casamento, uma mudança na carreira ou de casa, um início de novo curso, um intercâmbio. O mundo foi obrigado a puxar o freio de mão, parou repentinamente com a chegada da covid-19. Quem se encontrava já bastante independente, morando em outra cidade e com a vida feita, teve por necessidade fazer o movimento contrário: voltar para sua terra natal.
Aqui na Capital, o Lado B conversou com dois campo-grandenses que ainda vivem essa experiência, isto é, largaram a vida onde residiam e retornaram pra cá de mala e cuia. Hoje, voltaram a morar com os pais.
Márcio Garcete, 39 anos, foi para São Paulo aos 20 com uma mochila nas costas, R$ 300 no bolso e muita coragem. Até então nunca mais tinha retornado à MS. Botou a cara no sol, trabalhou anos no varejo de moda, que foi onde descobriu seu potencial de maquiador. Acabou se formando em maquiagem artística e até produzia as makes de celebridades nacionais lá na Terra da Garoa.
"Culminou de eu voltar pra cá justamente por causa da pandemia e também outros fatores, como término de relacionamento e grana, principalmente. Não foi uma decisão fácil, é doloroso e confuso simplesmente largar tudo que você construiu e voltar pra onde um dia teve raízes", reflete.
Há mais de 6 meses de volta à MS, Márcio conta que está se "redescobrindo" campo-grandense. Segundo ele, pela sua fé viu que era capaz dessa adaptação.
"Revi minha família, meus amigos antigos e conheci novas pessoas, mesmo estando nessa pandemia. Campo Grande não é cosmopolita que nem São Paulo, mas é aqui que estou tendo uma qualidade de vida bem maior. SP tem hora pra se acordar, mas não para dormir. Voltei a fazer exercícios físicos e até mesmo estudar", diz.
Quando saiu de Campo Grande aos 20 anos, Márcio não levou diploma. Agora, com a "inércia" da pandemia, está para concluir o curso de Marketing Digital em uma faculdade à distância e até já conseguiu um novo emprego na área.
Por sua vez, a publicitária Glória Gonçalves Barbosa, 34 anos, sempre teve o sonho de morar em alguma cidade praiana. "O estopim foi mais de caráter pessoal, quando um grande amigo meu faleceu e eu terminei um relacionamento de longa data. Foi ali que percebi que estava na hora de uma mudança, buscar novos ares", relembra.
Foi parar em Itacaré, na Bahia, por uma recomendação de uma amiga. "Ela me disse que tinha tudo a ver comigo. Resolvi apostar". Tinha casa, emprego e estava em vias de gerenciar um hostel por si só – o que não aconteceu.
"Por ser uma cidade completamente voltada ao turismo, houve um lockdown muito intenso. Conversando com o pessoal daqui de MS, as coisas estavam um pouco melhores. Se não fosse a pandemia de covid-19, eu realmente não teria voltado".
Glória confessa que não avisou de seu retorno para muita gente até mesmo porque, segundo ela, "não estava muito entusiasmada, mas já estava na hora de tirar o medo do julgamento, de ficar pensando no que as pessoas vão achar".
Com a "carona" na Kombi de um tio, ela fez a viagem de quase 1800 km que separam o município baiano da capital de MS, isso sem antes preencher e assinar um documento alegando a motivação de sua saída – decorrente da barreira sanitária instaurada em Itacaré.
"Eu entendo hoje que tudo tem um motivo. Eu já estava precisando voltar pra cá e mexer com algumas questões burocráticas. Aproveitei esse momento pra isso, além de estar perto da família, que agora faz bastante diferença", afirma.
Hoje, ela já voltou a trabalhar em sua área de atuação, no esquema home office, em uma empresa com outras duas amigas. Porém, mesmo com toda essa mudança de vida, Glória é categórica: não pretende ficar aqui por muito tempo.
"Sei que a pandemia não tem prazo de validade mas, com ou sem vacina, eu ainda retornarei à Bahia. Não tenho planos de continuar a morar em Campo Grande. Minha vida é em Itacaré ou qualquer outro lugar. Não me identifico mais aqui", admite.
Já para o maquiador Márcio, só o tempo dirá se "vai ou racha", se fica na Capital de MS ou se volta para São Paulo.
"Tudo depende de eu terminar minha faculdade, aumentar meu networking e ir sondando as possibilidades. Por enquanto, aqui está sendo muito bom. Estou focado na minha carreira. Mas se acontecer de eu voltar à SP, ainda tem muito chão pra isso acontecer. E serão em outros quinhentos", considera.
Um conhecido me disse um dia que "nós realmente só moramos aonde a gente trabalha a vida". Se isso for verdade, se ocupando da família, de carinho e segurança, se aplicando aos estudo, tendo um emprego fixo e voltando a cultivar as raízes regionais, Márcio e Glória tem muito chão pela frente – com ou sem covid por aí.
Inclusive eu também, o tal do "bom filho que a casa torna" após carregar meus 4 anos de Rio de Janeiro pra Campo Grande também por conta da pandemia. O aeroporto corria risco de fechar e, por isso, do dia pra noite retornei à minha terra natal. Mal trouxe mala – não deu tempo. Mas se eu pudesse resumir tudo isso em uma frase só, diria: "na sobrevivência, vai uma boa dose de adaptação".
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