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Comportamento

Deportação é medo diário de quem saiu de MS para reconstruir a vida nos EUA

Volta de Trump à presidência deixou família campo-grandense em alerta para nova política de imigração

Por Jéssica Fernandes | 23/01/2025 10:25
Deportação é medo diário de quem saiu de MS para reconstruir a vida nos EUA
Leila* vive nos EUA com o marido e os filhos desde 2019. (Foto: Arquivo pessoal)

A volta de Donald Trump (Partido Republicano) à presidência dos Estados Unidos deixou em alerta os brasileiros que vivem ilegalmente no país. Sem saber como será a vida a partir de agora, campo-grandense relata as medidas que têm tomado com a família para evitar a temida deportação para o Brasil.

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O retorno de Donald Trump à presidência dos EUA gerou preocupação em brasileiros vivendo ilegalmente no país, como Leila*, uma campo-grandense que reside lá desde 2019 com sua família. Apesar de um filho ter cidadania americana, ela e o marido estão em situação irregular e temem a deportação. Desde a posse de Trump, redobraram os cuidados para evitar problemas com a imigração, pagando impostos corretamente e evitando benefícios governamentais. Sua única esperança de regularização é quando seu filho atingir a maioridade, podendo então solicitar o green card. Leila e sua família se mantêm atentas às políticas de Trump, buscando minimizar os riscos enquanto esperam por uma solução.

Leila* não terá o verdadeiro nome revelado nesta reportagem para preservar sua identidade. A cidade e estado onde vive também não serão mencionados aqui, mas ela reside desde 2019 nos EUA, junto com o marido e um casal de filhos. Um deles, inclusive, tem cidadania norte-americana, pois já nasceu nos EUA. Porém, ambos os pais não estão com os documentos em dia, ou seja, estão ilegais.

À reportagem, a campo-grandense explica sua condição como imigrante ilegal e também como redobrou a atenção desde a posse de Trump na segunda-feira (20). “Nós tínhamos o visto de turista, viemos pela primeira vez em 2014 e eu tive meu filho aqui, então ele tem cidadania aqui, mas eu já estava fora do status”, conta.

Leila obteve o visto de turista e foi assim que conseguiu entrar no país pela primeira vez naquele ano. Ela voltou para Mato Grosso do Sul com a família, morou um tempo aqui e retornou definitivamente para os EUA em 2019. Nessa altura, a campo-grandense já tinha tido o segundo filho, mas esse nasceu em solo brasileiro.

“Quando eu voltei, eu consegui entrar com visto de turista. O mesmo que tinha na época e agora já expirou, porque são 10 anos e, no ano passado, expirou o meu visto. [...] Mas eu já sabia que se eu voltasse para o Brasil, eu não conseguiria voltar”, fala.

Deportação é medo diário de quem saiu de MS para reconstruir a vida nos EUA
*Leandro ingressou nos EUA ilegalmente há 1 ano através da fronteira com o México. (Foto: Arquivo pessoal)

Durante a conversa, ela admite que o certo era ter tirado outro visto ou ido embora. O visto de turista, que foi o que ela conseguiu em 2014, tem validade de 10 anos. Com ele, é possível entrar várias vezes no país durante uma década, porém a permanência é de apenas seis meses, ou seja, se você for estender a viagem é preciso solicitar uma extensão do visto. Leila explica que não tirou outro visto, como o de estudante, devido ao valor cobrado. “A gente conhece muita gente que está nessa situação de vir com visto de turista e não voltar”, completa.

Muitos brasileiros de outros estados compartilham do mesmo status da Leila. Ela cita que conhece pessoas naturais do Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina e outros lugares que não estão com o visto em dia. Algumas mais preocupadas com isso e outras nem tanto.

Antes mesmo de Trump voltar à presidência, a família campo-grandense já tomava alguns cuidados, que agora foram redobrados devido à política anti-imigração do republicano. Para não cair nas mãos de um agente imigratório, Leila comenta que no dia a dia procura fazer tudo corretamente, inclusive ao dirigir.

“O que tentamos fazer é pagar os impostos certinhos sem sonegar, não pegar benefício do governo. A gente tenta não se aproveitar de nada disso porque já estamos ilegais”, afirma.

Hoje, a única alternativa viável para Leila e o marido se regularizarem é através do filho que tem cidadania nos EUA. O problema é que ele ainda é menor e, pela lei atual, o filho norte-americano só poderia ser um caminho para a solicitação do green card, a residência permanente, se for maior de 21 anos.

Essa, nas palavras da Leila, é a “única chance de se legalizar um dia”. Isso se a lei continuar assim. “É a única 100% certeira por enquanto, se ele (Trump) não mexer com isso no futuro”, pontua.

Até lá, a campo-grandense se mantém atenta e mais antenada nas notícias sobre o atual presidente. Ao mesmo tempo que fica em alerta e impossibilitada de fazer planos concretos para o futuro, como comprar uma casa, Leila também reserva um pouco de esperança.

“Ficamos tranquilos porque, nas falas o Trump, fala [de deportar] os criminosos, então a gente fica esperançoso por isso. Sabemos que ele não quer ter ilegais aqui.  Temos noção que invadimos um país e ficou sem ter a permissão, ficamos tentando não fazer mais coisas erradas”, destaca.

*Leandro é mais um sul-mato-grossense que escolheu morar nos Estados Unidos. A oportunidade veio com uma proposta de trabalho, que foi aceita de imediato por ele. “As coisas aí no Brasil não estavam fáceis, foi tudo muito rápido. Tenho alguns amigos de Campo Grande que moram aqui e me ajudaram para tudo isso acontecer”, relata.

Pela fronteira do México, ele conseguiu ingressar no país onde pensa na possibilidade de se regularizar, contudo, fazer isso não é tão simples. “O processo é demorado, você  tem que contratar um advogado para  ajudar a conseguir algum documento que te deixa aqui por mais tempo ou casar com uma americana”, diz.

Questionado se toma algum tipo de cuidado para evitar a deportação, ele responde que sim, que são várias as precauções. “Dirigir correto para polícia não te parar, andar sempre com algum documento de identificação, tirar a licença para dirigir, ou seja, aqui você tem que evitar errar”, declara.

Assim como Leila, ele expõe que sente medo de ser enviado de volta para o Brasil, mas tem expectativa que as políticas do novo presidente se voltem aos imigrantes que cometeram outros tipos de crime.

“A gente fica meio com medo, mas creio que ele vai deportar o pessoal que tem a ficha suja aqui, que dirige alcoolizado, que bate em mulher, abusa de crianças, pessoas que vieram para cá foragidas”, afirma.

Cerca de 230 a 250 mil brasileiros estão atualmente ilegais nos EUA, conforme pesquisa da Research Center publicada em julho de 2024. Também do ano passado, dados do MRE (Ministério das Relações Exteriores) apontam que 1,9 milhão de brasileiros vivem nos Estados Unidos, que inclusive é o que mais recebe nascidos no Brasil.

Detenção por imigração irregular - De acordo com o Ministério das Relações Exteriores, quando preso na fronteira ou interior do país, se não tiver registro de outras atividades ilícitas nos Estados Unidos, o brasileiro tem duas possibilidades: admitir a entrada irregular ou contestar a alegação de entrada irregular com apoio de advogado.

De acordo com o DHS (Departamento de Segurança Interna), o procedimento apenas aumenta o tempo em prisão dos imigrantes ilegais e resulta em gasto desnecessário de recursos adicionais. Nessa segunda hipótese, após julgamento por juiz de imigração, o cidadão clandestino deve aguardar em prisão sua deportação.

Quando detido, o brasileiro tem direito de contatar o Consulado do Brasil responsável pela jurisdição onde se encontra.  Essa disposição, segundo o Ministério de Relações Exteriores:

"Obedece à alínea b do artigo 36 da Convenção de Viena sobre Relações Consulares. Portanto, torna-se imprescindível, caso seja da vontade do brasileiro detido, que manifeste formalmente às autoridades (policiais ou judiciais) seu interesse de que o Consulado seja informado sobre sua situação. Somente assim o Consulado poderá lhe oferecer assistência".

Era Trump - Eleito pela primeira vez para o mandato de 2017-2021, Donald Trump concorreu às releições contra Joe Biden, mas perdeu nas urnas. Em 2024, o republicano conseguiu se sobressair nas eleições contra a vice-presidente Kamala Harris, que concorreu à presidência pelo Partido Democratas.

A segunda-feira (20) marcou o primeiro dia de mandato de Trump, que anunciou uma série de medidas e assinou ordens executivas. No que atinge aos imigrantes, o presidente assinou uma declaração de emergência na fronteira com o México em uma tentativa de frear a entrada de estrangeiros do país vizinho.

No discurso de posse, segundo informações da BBC News, ele decretou o fim da política "catch and release", algo como "capturar e libertar" em português. Pela prática, famílias com crianças menores de idades que são encontradas por agentes de imigração recebem notificação judicial para comparecer à Corte. Depois, elas são liberadas em território norte-americano.

Segundo Trump, a prática de liberar menores no país não deverá continuar ocorrendo, mas ele não mencionou como serão as medidas para isso sem violar a legislação americana, que veda a prisão de menores por longos períodos.

O presidente também pretende acabar com a cidadania automática para filhos de imigrantes. Atualmente, se uma criança nasce nos EUA, ela já ganha a cidadania mesmo que os pais tenham visto temporário ou estejam de forma ilegal no país.

*Leila e Leandro são nomes fictícios para preservar a identidade dos personagens e de terceiros.

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